• OUTUBRO • 2

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Os raios do Sol brandos com um leve toque de ardência e aroma matinal traziam harmonia ao ar, anunciando um novo dia. O vilarejo mantinha seu agito usual, o horário do comércio sempre foi o mesmo, com pessoas conversando e negociando entre si sobre o preço de alguma mercadoria e as crianças demarcando o solo uma espécie de limite em suas brincadeiras. Este é o momento perfeito para vagar pela colônia em paz, mesmo com a guarda seguindo cada passo meu.

Ao me aproximar da entrada do comércio amarrei Níger em um palanque, apanhei do alforje os dracmas de meu irmão e todos os pertences trazidos. Pude avistar a butique que vendia os pincéis que Yoongi solicitou que comprasse, notei que a placa mencionava ficar aberta no período do meio-dia até 18h.

— Perfeito. - Pensei comigo.

Teria tempo suficiente para resolver meus assuntos e quando o sol estivesse quase se pondo passaria por lá. Por isso, segui caminho ao destino que pretendia ir desde o princípio.

— O dragão das névoas está seguindo à capela a noroeste. - Avisou o guarda mais robusto, que mesmo cochichando, pude ouvir o alarde aos demais guardas a alguns metros atrás.

Dragão das névoas.

O codinome que tanto ouvi em minha vida, sempre que um evento acontecia, algum passeio ou visita a uma colônia, eles estavam em meus calcanhares sempre atrás de mim sussurrando esse maldito apelido para qualquer movimentação próxima à minha pessoa.

— Senhor, alguém está se aproximando! - A guarda feminina alertou seu superior em tom preocupado e imediatamente procurei por alguém a minha volta tão assustado quanto a mesma.

— Em suas posições, é apenas uma criança do campo. Não se distraiam. - O comandante de capuz azul tranquilizou os outros.

Inevitavelmente meus olhos reviraram quando avistei a menina com uma boneca de palha me atravessar junto da amiga. Não era nada demais, como sempre. Retomei a caminhada até a capela e a partir daí eles me deixaram em paz, apenas rondando a área.

"Espero algum dia conseguir me perder de vocês"

Empurrei a madeira maciça e adentrei a capela recôndita. Fui engolido pelo profundo breu assim que ouvi o estrondo da porta se fechar atrás de mim. Em silêncio tateei o que estava mais próximo, a procura de qualquer coisa que pudesse acender, mas não foi preciso pois em instantes o som do fósforo sendo riscado ecoou pela capela e rapidamente avistei a faísca surgir em meio a escuridão. A lareira se acendeu em uma brasa anil, fazendo com que a iluminação não deixasse o lugar tão nítido. Os bancos largos alinhados em duas fileiras, os vitrais cobertos por barricadas mal postas e candelabros espalhados, mas apagados.

Então uma silhueta se formou na penumbra do púlpito, me deixando em estado de alerta. Retirei uma flecha da aljava e posicionei em meu arco, prestes a atirar em o quer que seja aquilo em minha frente. Observei atentamente a forma misteriosa se mexer até mim.

— Bem-vindo! - Uma voz bem gasta berrou animadamente.

E então a chama voltou a sua cor usual e assim pude enxergar tudo a minha volta.

— Senhora Nix. - Abaixei o arco e respirei aliviado.

— Quem você está chamando de senhora? - Ela caminhou em minha direção com uma expressão nada boa, agarrou minha bochecha e puxou para baixo. - Corto sua língua e nunca mais poderá me chamar de senhora.

— Não só de senhora, como de qualquer coisa. - Rebati em meio aos grunhidos, causados pela força posta em minha pele flácida.

— Você não pode ter desaprendido do dia para noite, ainda sabe dizer apenas meu nome não é mesmo? - A velha soltou meu rosto, estapeou levemente minha bochecha e sorriu debochada para mim.

INCÓGNITA • pjm✕jjkOnde as histórias ganham vida. Descobre agora