58 (inédito)

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Claro que a ideia brilhante da Sarah para salvar o meu dia horrível é sair depois da aula para farrear. E claro que eu queria sair para farrear, beber e dançar até esquecer as merdas que o Pedro disse, e que eu fui demitida de um emprego pela segunda vez em tipo, um mês, e que a minha vida inteira parece estar predestinada a dar errado; mas sei que exagerei na bebida quando, ao invés de curtir, estou no banheiro de uma festa universitária, todo rímel já escorreu do meu rosto e tudo que eu consigo fazer é soluçar "por que o Pedro não pode ser uma cara legal?".

— Eu vou ligar pra ele! — Anuncio num dos meus acessos.

Sarah puxa o celular da minha mão.

— Não, você não vai fazer nada até pensar direito nas coisas.

— Mas ele não pode fazer isso! — Protesto, minhas palavras saindo embargadas. — Ele não pode aparecer assim, e me fazer apaixonar por ele assim, e daí... daí... — Não termino a frase, porque o choro simplesmente extravasa.

Eu me sinto patética. Meus sentimentos estão tão confusos e batidos com tequila que eu nem sei quanto disso é raiva, quanto é magoa e quanto eu ainda consigo ser apaixonada por ele. Não é como se eu fosse beijá-lo se ele entrasse por aquela porta. Eu provavelmente atacaria o copo de bebida na cara dele. Essa é uma coisa que eu adoraria fazer.

— Eu só preciso dizer umas verdades! — Insisto, tentando pegar o celular outra vez. — Preciso machucar ele do jeito que ele me machucou!

Okay... você quer dizer umas verdades? Vamos lá. — Sarah põe as mãos a postos. Ela não bebeu tanto assim menos do que eu, mas ao meu lado parece bastante sóbria, o que é preocupante. — Fala que eu digito.

— Então digita! — Eu viro um gole longo da bebida antes de começar. — EU TE ODEIO! Odeio sua música. Odeio você. Odeio o que você representa. E odeio seu maldito rosto bonito! E odeio quando você sorri e o meu corpo todo derrete. E quando você beija o meu pescoço, e eu fico toda arrepiada. E eu odeio...

Interrompo o discurso ao perceber que os dedos da Sarah não estão mais mexendo na velocidade das minhas palavras.

— Sem chance. É melhor eu cuidar disso pra você. — Ela sacode a cabeça e volta a digitar. — Pode deixar que eu sei bem como machucar um homem.

— O que você tá enviando? — Tento enxergar, mas Sarah é bem mais alta, então fico tentando escalar no seu ombro, só que estou tonta e com a vista embaçada, e acabo caindo sentada pateticamente no vaso sanitário.

Sarah ri, mas me estende a mão.

— O que você disse? — Insisto, sendo levantada por ela.

— Eu disse: Acho você esqueceu sua cueca vermelha aqui em casa.

— Mas ele não... —Me interrompo no meio da frase, entendendo o que ela acabou de fazer. De repente o choro se mistura à uma gargalhada histérica. Como é possível rir e chorar ao mesmo tempo? — Isso é cruel e genial, Sarah.

Minha amiga sacode os ombros e guarda o celular,

— Se ele quer te dar tratamento de "vadia", seja uma vadia de respeito. Isso inclui voltar lá fora e dançar a noite toda, ao invés de ficar no banheiro chorando e mandando mensagens emocionadas. Porque vadias não choram no banheiro por homem.

Eu sei que ela tem razão, então acabo me deixando ser arrastada de volta para festa. Pedro com certeza não está chorando em banheiros de festas por minha causa, e eu não vou chorar mais em banheiros de festa por causa dele. Vou me divertir.

Então viro mais uns drinks, e danço com o rosto sujo de lágrimas e daí a gente entra numa competição de beerpong com uns caras aleatórios, e quando eles começam a dar em cima da gente, a Sarah diz que é minha namorada, só pra despistar, só que homens parecem ser todos uns babacas insistentes e sem noção.

Ninguém mais que nós doisWhere stories live. Discover now