Capítulo 10

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Emma encarava o teto de madeira da sala da cabana de Harry. Era madrugada e ela não conseguira pegar no sono por algum motivo. Sentia-se bastante cansada e os olhos ardiam, mas toda vez que se atrevia a fechar os olhos, algum pensamento mais profundo se agitava em sua mente, fazendo-a despertar contrariada. Turbilhões de pensamentos puxavam uns aos outros em sua cabeça; como deveriam estar seus pais? Ainda deveria haver esperança para Niall? Deveria haver esperança para ela? Eram tantas possibilidades para cada uma das perguntas e seu cérebro parecia fazer questão de especular cada uma das respostas naquela hora da madrugada; mal percebeu o momento em que finalmente caíra no sono.

Abriu os olhos de súbito, o coração palpitando e a respiração ofegante por algum motivo. Levou algum tempo para se estabilizar e se localizar, estava tão confusa e os pensamentos tão em desordem... E também havia aquele calor excessivo. Sentou-se lentamente e olhou ao redor. Ainda era noite e a lareira estava acesa, a fonte do calor. Não se lembrava de tê-la acendido, mas apenas deu de ombros e bocejou, talvez Harry o tivesse feito, apesar de ter quase certeza de que no momento em que se deitara o clima estava agradável o bastante para não ser necessário a lareira.

Emma levantou-se do sofá e caminhou em direção ao fogo, pegou o atiçador e cutucou um pouco a lenha de forma distraída. Havia despertado de uma forma tão repentina que tinha quase certeza de que não voltaria a pegar no sono tão cedo. Brincava com o fogo e prestava atenção ao seu crepitar quando teve a leve impressão de ouvir um sussurro. A primeira vez não deu atenção, deveriam ser seus sentidos ainda tentando despertar, apenas continuou a brincar com o atiçador na lareira. Mais alguns instantes e ouviu algo um pouco mais alto e mais próximo; desta vez deixou o atiçador de lado e ergueu-se lentamente, como se qualquer movimento brusco fosse desfazer o que quer que estivesse acontecendo.

– Harry? – Ela soltou num sussurro um pouco engasgado pelo medo. Nada de respostas. – Harry, para com isso, já estou assustada o suficiente com tudo o que vem acontecendo. – Murmurou novamente sem sair do lugar.

O silêncio permaneceu e Em bufou, tinha certeza de que Harry tentava lhe pregar uma peça, mas ela não cairia naquilo.

– Ele nunca dorme.

Emma ouviu um murmúrio baixo ao pé do ouvido, o que a fez pular de susto e se afastar em direção à lareira.

– Quem foi que disse isso?! – exclamou, agachando-se para agarrar o atiçador da lareira para se proteger do que fosse. – É bom desaparecer! – disse segurando sua "arma" com força e olhando ao seu redor. – HARRY! – gritou por ajuda.

Menina tola! – Uma voz alta e grossa soou ao mesmo tempo em que o fogaréu atrás de Emma se expandiu em enormes labaredas, quase a pegando.

– HARRY! – ela gritou novamente e correu para a porta do que deveria ser o quarto do rapaz. – HARRY, SOCORRO! – Ela bateu na porta com força e desespero.

Enquanto gritava e batia, sentiu algo quente transpassar seu corpo e no mesmo instante, pôde-se ouvir o barulho das dobradiças se movendo. A porta estava aberta enfim.

Emma deu um passo para trás, assustada. Sentia um incômodo arrepio na espinha e, embora soubesse que deveria dar as costas e sair correndo, algo a impulsionava a ir em frente, escancarar a porta e finalmente desvendar o mistério por trás dela. Não havia percebido, mas naqueles poucos segundos de hesitação, ela inconscientemente já estava quase adentrando o cômodo. Sua respiração estava hesitante, tinha medo de respirar e acabar desmaiando ou acabar chamando a atenção de alguma coisa. Quando finalmente abriu a porta, prendeu a respiração. Não havia nada de anormal ali. Apenas Harry. Sentado em uma cadeira com um boneco ventríloquo ao seu lado.

O rapaz estava sentado ereto, mas sua cabeça pendia para a frente, como se tivesse pegado no sono daquela maneira.

– Harry? – Emma chamou insegura.

Não recebeu resposta.

– Harry, por favor, para de brincar... – Ela choramingou dando um passo à frente.

No mesmo instante, o rapaz ergueu a cabeça e em sincronia, o boneco ventríloquo também o fez. Harry se levantou da cadeira e esperou.

Não deixe ela escapar! Não deixe ela escapar! – o boneco cantarolou sozinho e o rapaz deslizou uma faca afiada pela manga de sua blusa.

Emma correu em direção à porta, mas a mesma bateu com estrondo e se trancou.

NÓS NÃO GOSTAMOS DE ENXERIDOS! – o boneco vociferou e Harry disparou na direção de Em com a faca empunhada. Ele a prensou contra a porta e encostou lâmina da faca em sua garganta. Os movimentos e expressão do rapaz eram selvagens, desvairados, mas seu olhar era vazio, assustadoramente vazio. – ENXERIDOS DEVEM MORRER! – gritou o boneco. – MATE-A! MATE-A! – Ele cantarolou aos berros.

– NÃO! – Emma pulou do sofá onde estivera deitada. Seu coração disparado parecia querer sair pela boca e era difícil respirar, quase como se tivesse corrido durante aquele tempo todo. Sentou-se e olhou ao redor. A lareira permanecia apagada como quando fora se deitar e tudo estava quieto e escuro como deveria. Olhou para a porta fechada do quarto de Harry. Levantou-se e caminhou lenta e silenciosamente em sua direção. Estava prestes a tocar a maçaneta quando sentiu uma mão lhe tocar o ombro.

Soltou um berro de susto e se virou para encarar um Harry de sobrancelha erguida.

– Eu só ia perguntar se queria um chá. – Disse ele apontando a chaleira no fogão.

– Você quase me matou de susto! – reclamou. – E como é que fez chá no escuro? – perguntou, indignada.

– Acendi uma lanterna enquanto o fazia. Eu tinha acabado de apagar quando você acordou. – Explicou. – E então, quer o chá? – perguntou novamente.

Emma assentiu e o rapaz sorriu indo pegar uma xícara para servir sua hóspede que bebericou o líquido respirando ainda um pouco ofegante.

– Com o que sonhou? – Harry perguntou curioso. – Você acordou gritando...

– Eu sonhei com... – Em se deteve. Sentia as memórias se esvaindo de sua mente agora desperta, as imagens de seu pesadelo sendo sugadas por seu inconsciente, estranhamente no mesmo ritmo em que engolia o chá de temperatura perfeita. Não havia sobrado muito agora. – Deixa para lá. – Ela disse finalmente. – Não consigo me lembrar. – Deu de ombros, lavou sua xícara e voltou para seu sofá.

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