Via de mão dupla

63 15 23
                                    

Se um ser humano normal pisca de 15 a 20 vezes por minuto, eu com certeza devo ter piscado, no mínimo, 42 vezes, bem devagar, apenas para assimilar o que estava diante dos meus olhos - e eu ainda não acreditava. Quis desviar o olhar, mas seus orbes negros me prendiam como a própria gravidade.

- Olá - saudou. O grau de curvatura do seu sorriso fora friamente calculado para provocar esse tipo de reação, deixar as garotas sem fala ou algum outro efeito hipnótico. O que ele não contava é que eu não era como as outras garotas. - Então é você nossa nova funcionária.

- Ao que tudo indica.

- Parece que o Universo nos uniu novamente, Takamura Alexa - disse, ao beijar minha mão, sem desviar os olhos dos meus. Sorri, aceitando o desafio.

- Aparentemente sim, Jeon Jungkook.

Gwen é como uma caixinha de surpresas.

Lembro quando terminamos o colegial, no último dia de aula, ela disse que "estamos a apenas um passo de uma nova vida, uma grande mudança nos espera; é um grande passo para a humanidade e um ainda maior para nós" e. com essas palavras, pintou o cabelo em uma aurora boreal de mechas azuis, verdes e roxas.

A mente por trás disso, obviamente, fui eu. No Japão, celebramos a mudança, os fins e os começos; há uma espécie de costume entre as garotas com base nisso: mudar o cabelo, significa deixar para trás aquela fase da vida e fazer com que se sinta diferente e renovada, exteriorizar a mudança desejada internamente. Conviver com Guinevere na Coréia foi trazer um pouco do Japão para a vida dela também.

Quando Gwen coloca algo na cabeça, nem mesmo uma remoção de cérebro seria capaz de matar sua ideia. Uma das coisas que mais me marcaram, também no colegial, foi quando a garota bolou uma teoria de conspiração sobre concursos de culinária e disse que provaria ao vencer sem saber cozinhar; ela dominou com maestria apenas duas receitas para as tais fases e hoje ostenta um troféu dourado em sua sala de estar. Guinevere sempre tem as ideias mais fantásticas e inusitadas - essa, em questão, era um exemplo de ambas.

- Mais uma! Você é realmente boa com vendas, Takamura! Estou impressionado.

- Se eu soubesse disso, teria começado a trabalhar mais cedo - coloquei os discos que o cliente não se interessou de volta na prateleira e dei de ombros. - Não é difícil.

- Vá com calma, garota. Desse jeito, será promovida e ocupará o meu lugar. - Jeon parou de limpar o balcão e sorriu para mim. Em minha cabeça, a ideia era tentadora, o salário devia ser maior e eu teria mais autoridade, devo ter sorrido e ele interpretou errado. - Desconfio que o número de clientes tenha aumentado nos últimos dias por sua causa, quem não quer ser atendido por uma vendedora linda assim?

- Quem não quer ser atendido por uma vendedora que sabe o que está fazendo, não?

- Eu que o diga, por trás de um grande funcionário há sempre um supervisor melhor ainda - minha indiferença sofreu um pequeno trinco e eu segurei o riso.

Jungkook mantinha o ego elevado e um sorriso no rosto, ele não mudara nada. Desde o colegial, Jeon era o tipo de cara na dele, que não é de falar muito, mas sempre tem algo a dizer. Na pirâmide social asiática, ele facilmente poderia se imaginar no topo; eu não precisava dizer a Jeon Jungkook o que 80% da humanidade pensa dele, simplesmente porque ele já sabe disso - eu não achava que ele fosse tudo isso, mas desde que aquele falso reinado não subisse em sua cabeça durante o expediente, eu ficaria bem.

Não faz muito tempo que estou trabalhando na loja de Donnie, mas sinto que atingi o Nirvana sempre que atravesso a porta e ouço um pequeno sino anunciando minha chegada. O salário é ótimo e o ambiente é o melhor que eu poderia imaginar, passo o dia todo ouvindo música e, quando não estamos atendendo, fico explorando os discos e trocando algumas palavras com meu supervisor. Não demorei muito para aprender minhas funções, ironicamente, meu maior desafio está sendo aprender a mexer na caixa registradora.

Os prós e contras do UniversoWhere stories live. Discover now