Do outro lado, estava o povo mais pobre, poucos felizardos que haviam tirado a sorte, embora eu julgasse como azar, de poder assistir uma coroação tão de perto. Certamente seria algo que eles contariam às seguintes gerações, como um motivo de orgulho.

Eu odiava aquilo tudo.

Hawk entrou na sala e se aproximou do trono, assisti seu corpo se abaixar até que ele estivesse ajoelhado; era a etapa em que o futuro rei deveria orar, em nossa frente, como uma forma de demonstrar respeito à Igreja.

Eu estava sentada entre os nobres e logo na primeira fileira, local reservado para os mais importantes entre eles. Quando Hawk sentou no trono, ele sorriu discretamente para mim, e eu não pude deixar de sorrir de volta. Estava realmente feliz por ele.

O arcebispo começou um discurso ensaiado, utilizado desde muito antes de meu pai ter sonhado em nascer, onde ele o reconhecia como rei, dessa vez oficialmente. Eu já havia lido tantas vezes o discurso, para ajudar Hawk com os ensaios, que me permiti viajar o olhar pelo local, mas meus olhos ficaram presos entre o lado do povo, mais precisamente em apenas duas pessoas: Berryan e Fedore. A saudade latejava em meu peito, e, por mais que eu soubesse que precisava escolher um e deixar o outro livre, eu havia fugido dos dois durante esses meses.

- Deus salve o rei!

A frase, entoada por todos ali, significava a bênção do novo rei, mas me serviu de sinal para acordar do transe em que me encontrava.

O homem se aproximou de Ivey com a Bíblia em mãos e a esticou em sua direção. Hawk tornou a respirar fundo antes de levantar sua mão direita e a posicionar em cima do Livro. Umedeceu os lábios antes de começar as promessas: honrar e ser fiel ao povo, à justiça e às leis.

Meu coração explodia no peito, e eu tinha a sensação de que o vomitaria. Enquanto o arcebispo levava à Bíblia de volta para onde, inicialmente, estava e pedia que um dos funcionários trouxesse as vestes douradas, encarei meu anel, me perguntando se eu havia feito a escolha correta.

Eu sabia que não havia nascido para isso e que, nem ao menos, era bem-vinda ali, mas, por vezes, me imaginei como rainha.

Já de volta, o arcebispo segurou o manto, que brilhava tanto que chegava a ser incômodo, e o vestiu assim que ele levantou do trono. Agora, a apresentação das joias da coroa começaria.

A primeira joia era o par de esporas feitas de ouro, e eu senti um arrepio me subir a espinha quando as vi. Eu odiava o uso delas e, embora aquelas fossem apenas simbólicas, meu estômago embrulhou ao imaginá-las sendo usadas nos pobres cavalos. Hawk as pegou e, com cuidado, as depositou no trono.

A segunda joia era uma espada com o cabo coberto de rubis, era belíssima, mas não tinha serventia alguma. Por ser feita de ouro e cheia de ornamentos, a espada era pesada demais para ser usada em uma batalha e uma lâmina feita desse material tende a amassar com mais facilidade do que uma feita de ferro ou aço; portanto, ela era usada apenas nas cerimônias oficiais. Ivey a colocou sobre os braços do trono, já que ela não caberia no estofado junto com a joia anterior e as seguintes.

O próximo era o bracelete, que, na verdade, costumava ser um par, mas que meu pai já havia dado um deles para Hawk; ele o posicionou ao lado das esporas e esperou, com a mão direita esticada, o homem colocar o anel da realeza em sua palma, o depositando perto do bracelete.

Eu não aguentava mais a cerimônia, era exaustivamente longa e eu sentia vontade de sair correndo e não voltar mais. O silêncio no local era sepulcral. E eu me peguei tentando entender se era por estarem presenciando a tomada do poder feita por um plebeu ou se era por Hawk ser negro, o que era o total oposto da pele pálida e quase doentia da antiga família real.

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