Apenas Uma Partícula de Poeira na Galáxia

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Suzana já se sentia minha amiga de vários anos atrás. Bem, era recíproco. Já tinha perguntado para ela da última vez que nos esbarramos se nunca estudamos juntas na infância e eu que não lembro.

— Se aconteceu, então somos duas desmemoriadas.— Respondeu rindo.

Digo isso porque desde a festa aleatória organizada pelo Benjamin, nossa amizade cresceu ainda mais. Também, pudera, colou no Kaio como se um fosse a versão em outra profissão do outro. Na segunda-feira seguinte à festa, depois de sair do meu check-up inconclusivo como sempre, antes de entrar na administração do Hospital Municipal do Sul de Niterói para perguntar sobre possíveis vagas de emprego, ela me puxou pelo braço no meio do corredor para mostrar que as mensagens de texto que já trocava efusivamente com Kaio. Depois falamos mais algumas amenidades, e besteiras da vida. Foi no meio disso que rolou o diálogo narrado no início do capítulo.

Acho que começava a chegar num estado em que me lembrar do passado não importava mais tanto. Estava construindo uma vida bacana sendo somente Rita. Talvez por isso, durante o restante daquele dia atrás de emprego, cada vez que estranhavam minha situação na vida, eu não me sentisse mal por nada. Rita sem sobrenome era a única coisa que eu era no presente. Uma garota com amigos super legais, vivendo numa casa acolhedora e sonhando em construir o próprio futuro. Mesmo que o passado nunca mais volte. Quer dizer, os poucos vestígios de lembranças que tive só me deixaram nervosa e mal; não havia mesmo ninguém que procurasse por mim, talvez fosse melhor seguir em frente de uma vez.

Quando estava começando a anoitecer, voltei para o apartamento que dividia com Benjamin confiante. Não tinha sido efetivamente contratada ainda, mas só o respeito e compreensão que recebi de alguns prováveis chefes já deviam ser suficientes para um primeiro dia. Me taquei exausta no sofá, afinal de contas, não estava mais acostumada a andar tanto. Ainda tive que catar os estabelecimentos usando aquelas revistinhas de guia de bairro, afinal, eu não possuía celular, nem dinheiro para comprar um, então o esforço foi maior do que parece. Cheguei em casa mais acabada que filme depois da cena pós-créditos.

O sonho que tive ao adormecer de exaustão foi bem confuso. Era parecido com aquele em que imaginei eu e Benjamin como estrelas cadentes, mas dessa vez, estávamos em um lugar extremamente escuro. Algo nos sugava. Tínhamos quase o tamanho de poeiras em meio a uma imensidão negra e sufocante. Várias sensações estranhas começaram a me preencher como um déjà vu. Choro, berros, angústia, sufoco. Mas eu não conseguia visualizar nada claramente, veio tudo numa enxurrada, parecia até que tinha um rugido de leão vindo de algum lugar. De repente, a poeira/Benjamin começou a cantar. E eu, não sei exatamente porque, só acompanhei. Sabe aqueles movimentos meio involuntários que a gente faz quando está sonhando? Pois é... Na mesma hora tudo ficou mais bonito; mais calmo, aí sim parecendo o céu estrelado do sonho anterior. Comecei a voar embalada pela canção, um balbucio, sem letras ou melodias fixas. Quando dei por mim, estava era acordando embalada nos braços de Benjamim.

Acho que não preciso dizer aqui os detalhes do diálogo que se seguiu, já que ele narrou antes para vocês. Fiquei falando sobre meu sonho, depois conversamos algumas bobeiras como "farofa é boa com feijão" e "parece que vai chover hoje". Só paramos de tagarelar quando entrou um cheiro de comida vinda de algum apartamento vizinho.

— Hum, coxinha!  —Falamos juntos e rimos igual os dois idiotas que éramos.

— Beleza, eu vou lá cozinhar para você. — Conversou se levantando da cama.

Eu estava ajoelhada na beira do colchão. Algum dos meus neurônios afetados, sabe-se lá por qual razão, ao ver o cara levantando, ao invés de me dar vontade de simplesmente falar "hey, não precisa!", me fez ter um ímpeto de empurrar ele de volta para cama. Contudo, preciso deixar frizado que o Ben é um cara muito magro, então quando eu fiz isso, ele caiu com tudo, rolando pela cama desengonçado. Ou realmente peguei-o de surpresa, ou ele quis fazer graça. Fato é que ele foi com tudo para o lado da parede. Tive que puxá-lo de volta, pedindo desculpas pois não queria que tivesse sido tão forte. Foi uma confusão de braços e pernas um puxando,outro caindo; só quando conseguimos ficar um pouco mais confortáveis, ele estava deitado por cima do meu corpo.

Estrelas PerdidasWhere stories live. Discover now