Colapsando

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Vocês já descobriram muitas surpresas com a Rita e sabem que ela vai receber alta. Agora devem estar curiosos sobre como consegui que os planetas girassem para que pudesse morar por algum tempo na minha casa, não é? Eis abaixo tudinho:

Quando o médico bateu a derradeira porta 13 na minha cara, eu continuei ali com a testa franzida, um pouco atordoado. Até então, as conversas que tive com esse doutor foram bem normais, a reação exasperada me deixou assustado. Já fui me preparando para alguma informação bem séria sobre Rita. Talvez algum teste revelara que sua saúde havia piorado? Sem chances de sua memória voltar? Me perguntava muitas coisas atropeladamente, enquanto aguardava alguma explicação, ele me encarando, eu encarando ele. E depois de alguns poucos minutos, o médico maluco respirou e decidiu enfim se manifestar.

— Bom dia, Benjamin. — Tentava um breve sorriso e eu retribuí tão forçadamente quanto ele. — Tenho uma notícia boa para te contar. Podemos ir para algum lugar um pouco mais longe daqui? — Fomos andando pelos corredores azuis para mais perto da entrada do hospital e ele mandou. — Bem, a Rita vai receber alta daqui a alguns dias.

Mesmo sem estar esperando por isso,no momento inicial, senti uma onda de felicidade e alívio me cobrir. Parecia que o local tinha ficado mais iluminado e com as cores azul e branca das paredes, mais vivas. Tentei imaginar como Rita reagiria quando descobrisse, ela coraria? Abriria seu lindo e claro sorriso? Daria uma risada de nervosismo? Fiquei divagando nessas ideias quando o médico voltou a falar, cortando essas emoções positivas que me rodeavam.

— Ela ainda não sabe, porque sempre preferimos que um psicólogo a prepare para a novidade, até porque o caso dela é especial.— Pigarreou e espremeu os lábios, mas não parecia tão nervoso quanto antes, suas sobrancelhas estavam relaxadas e sua voz controlada. — Você deve compreender as questões. Ela está sem memórias de antes do acidente, a família não veio procurar, não tem para onde ir e nem o que fazer fora desse hospital... a paciente só tem você e esperamos que te contando primeiro, você consiga encontrar algum lugar para ela ficar e ajuda-la nas coisas, sabe?

Assenti hesitante. Me senti um pouco idiota por ter alimentado uma esperança interna de que dariam alta para ela depois que a família aleatoriamente aparecesse. Ainda imaginava que fossem pessoas muito legais e tivessem as melhores desculpas do mundo para não terem visitado ela durante esse tempo todo; tudo culpa do meu inconsciente para não pensar que a responsabilidade de "colocar ela de volta à vida" não estava em minhas mãos. Eu não tinha seguro sobre minha própria casa e emprego, acrescentei sem-graça para o médico.

— Até mais, Benjamin. — Ele só deu um leve tapa no meu ombro e saiu.

— Até... — Falei quando ele já estava de costas. Até hoje não tenho certeza se chegou a ouvir.

Em seguida fui falar com a Rita e tive que disfarçar minha raiva do doutor loucão. Vocês são minhas testemunhas: o cara tinha acabado de dizer que ela ainda não sabia de nada e lá estava a criatura fazendo perguntas cada vez piores sobre como as coisas iriam ficar daqui para a frente. Ela esperava que minha família só tivesse santos! Pobre iludida!

Tive que fazer um enorme exercício para afastar todas as ideias negativas com uma vassoura mental e tirei ânimo de algum buraco negro para manter a calma e dar o maior apoio possível. Porém, mais tarde, quando estava prestes a girar a chave da porta do apartamento, me dei conta que não tinha falado absolutamente nada com Alex sobre Rita e resolver isso não seria nada simples. Encostei a testa na superfície de madeira da porta antes de entrar, exausto, e tive de tirar inspiração de algum buraco negro, mais uma vez, para enfrentar meu irmão.

Contudo, antes de passarmos para essa conversa, preciso deixar claro que não sou um total alienado: minha cabeça não parou vindo no busão para casa. E cogitei bastante a possibilidade de Rita morar em alguma casa de aluguel. Depois de várias e longas "espirais de pensamento", me convenci que seria muito fria a ideia de deixar sozinha a menina tão perdida na vida, além de que eu que teria que pagar pela casa, sendo que, já tenho que gastar o pouco que recebo para manter o apartamento. Ainda pensei nela morando com Kaio, Pietra ou algum outro amigo meu, mas achei que tentando passar a menina para estranhos eu estaria fazendo dela uma batata quente. Por fim, guardei a opção de falar com o chefe para ver se tinha alguma vaga para ela e cheguei a conclusão que seria melhor para todos que a gente morasse junto. Ela confia em mim e eu gosto dela... eer,no sentido da amizade, é claro! Não sou nenhum aproveitador de mulheres indefesas! Céus! Quanto mais tento explicar, mais minha reputação piora...Melhor voltar para a narrativa.

Estrelas PerdidasWhere stories live. Discover now