Capítulo 1.6

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— Nãããão! Não, não, não... Cof-cof! Não me deixa! Não, cara! Nã... cof-cof-cooooof...

Ah, merda! Ah, merda! — Eu andava em círculos, de frente para os elevadores.

"Fuja"

Merda!

"Fuja"

Aaaah! Foda-se! Eu nunca fui um maldito covarde!!

Disparei de volta, numa corrida a toda velocidade, atravessei a porta como se ela fosse de isopor. Pedaços de madeira voaram e rodopiaram pelo ar, as chamas engoliram vários deles. O fedor de madeira, plástico e tecido queimado fulminaram meu olfato.

— Ediiiiii! Aguenta, grandão!

Meu Deus! O que diabos eu estava fazendo ali?
Procurei por brechas, lutava contra a menor possibilidade de me queimar. Andava como um gato acuado que procura rotas de fuga, os olhos quase saltando das órbitas. O calor das chamas tentava me dobrar a um pedaço de nada. A maior luta era contra mim mesmo!

Encontrei um espaço e invadi a sala onde ele estava. Tentei erguê-lo e descobri que as correntes eram afixadas em uma base parafusada ao chão. Os cretinos tiveram o cuidado de soldar os parafusos à base. Agarrei um pedaço da corrente que envolvia Ed com as duas mãos, bombeei sangue para os músculos e forcei. Rilhei os dentes, as veias estufaram.

— Quebra, porra!

— Me tir.... cof-cof... tira daqui...
caaaaaaaraaaa... — Ed desfalecia.

— Tô tentando, Ed! Tô... unnnng... tentando! — um elo partiu com um estalo metálico.

O fogo aumentava seu domínio sobre a sala. Eu tinha pouquíssimo tempo. Tentei desenrolar uma parte da corrente, metade de Ed estava solto. Faltava livrar as pernas.

Mais sangue, mais força. Ed estava apagando.

— Aguenta, Ed! Não dorme, caralho! NÃO DORME, CARALHO! — O rosto do gorducho dançou mole com o tabefe que eu dei.

Ele despertou com a injeção de adrenalina, mas foi insuficiente, começou a apagar de novo.

Força. Força. FORÇA! — Mais um elo se partiu!

Uma labareda chicoteou meu braço. Eu o puxei e colei ao tronco, bati com a outra mão sobre a queimadura, tinha a sensação de que o fogo ainda crepitava sobre minha pele. O ardor puxava uma dor aguda, que vinha do fundo do peito. Gritei!

Toquei o último pedaço de corrente que faltava para libertar o boi de vez, e larguei no mesmo instante. Foi como colar as palmas em um ferro de engomar ligado. As mãos deixaram pedaços de pele colados ao metal, cuspi sobre os ferimentos, queria tempo para aliviar a dor. Impossível! Era lutar ou morrer — no meu caso, pela segunda vez.

Bombeei o máximo de sangue que pude de uma vez só. Nunca havia tentado aquilo. Era o desespero obrando milagres. As veias dos braços a ponto de explodir. Tirei a camisa e a rasguei em dois pedaços, enrolei nas mãos, agarrei a corrente.

— QUEEEEEEEEBRA, CACEEEEEEETEEEEE!!!!!

Clang! — O último elo partiu. Ed estava livre.

— Acorda, Ed! Acorda! — Uns tapinhas em seu rosto. Ele não respondia. — ACORDA, PORRA!!!— Calibrei a mão e dei um tapa tão escroto que por pouco não arranquei uns dentes do coitado.

Acordou cuspindo palavras desconexas, o rosto virando em várias direções, o olhar perdido. Coloquei-o de pé e ele enfim retornou ao planeta terra.

Só então percebi o inferno que o andar tinha se tornado. Pedaços do teto começaram a desprender e cair, poucos móveis ainda restavam intocados. Eu girava em torno de mim mesmo, procurando uma solução.

Memórias Rubras. Episódio 2 - Lança.Tempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang