XXVI

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O estalo desconcentrou o meio-dragão Uromazar, que se comprazia ante a agonia de Gavril a brigar por sua vida. Em sua surpresa não reparou que o espadachim voltava a se mover, alongando os braços e estalando o pescoço.Parecia livre do encantamento conjurado instantes atrás.

– Ainda não morreu? – disse Omniak. – Infelizmente terei que abrir uma exceção e arrancar sua vida com minhas próprias mãos. Seus companheiros estão causando mais dano e me irritando mais do que sua presença é capaz.

O espadachim começou a sorrir e o broche de safira se acendeu em seu bolso com uma luz pálida, contudo trazia grande reconforto ao guerreiro.

– Você não conhece nenhum espadachim de Benvähn. – disse Gavril, quase com um rosnado. – Eu sigo minha vida dentro do código ensinado por meus mestres. Não tenho arrependimento nenhum. E a única culpa que eu sentiria, seria a de perder para um fracassado como você.

Gavril agarrou o meio-dragão utilizando os dois braços e o atirou contra o chão de metal. Cerrou os punhos e começou a socar o rosto de Omniak com tudo o que tinha.

Era como atingir uma armadura. Cada ataque feria mais um pouco as mãos do espadachim, porém causavam danos ao meio-dragão, que tentava se desvencilhar, mas não conseguia escapar da sequência de socos do guerreiro montado sobre ele. O último soco atingiu o nariz de Omniak, o quebrou e provocou um sangramento que surpreendeu aos dois. Os ossos da mão de Gavril partiram em pedaços com a violência do golpe, mas o estrago havia sido proporcional.

– Você veio protegido por magia de xamãs... – disse o meio-dragão, se levantando com dificuldade e apoiando os braços no chão. O sangue escorria do ferimento em seu rosto em postas grossas. – Surpreendente, eles aprenderam a resistir aos poderes de dragão.

O espadachim estava mais uma vez em frangalhos. Fisicamente não tinha mais forças para ficar de pé. O que restava de energia mágica em seu corpo era o bastante para mantê-lo vivo, caso utilizasse quaisquer de suas habilidades, acabaria morrendo de inanição mágica.

Algo, contudo, deteve Omniak que se preparava para finalizar o espadachim caído no chão. Ele se comunicava em uma língua estranha e demonstrava todo medo, desespero e agonia de quem experimenta uma morte iminente e inevitável. O meio-dragão protegeu seu rosto, fechou os olhos, tateou em busca de ventos mágicos. E, movido por uma força invisível, foi partido ao meio.

Pela cabeça do espadachim passava a ideia de que os dois clérigos obtiveram sucesso e conseguiram pôr as mãos em uma das estacas, liberando o Sabri no processo. Os únicos naquele local capazes de eliminar o meio-dragão com tamanha facilidade pareciam ser os monstros adormecidos.

Restava saber se os seus companheiros ainda estavam vivos depois disso.

Horas depois.

– Deu trabalho arrastar o anão até você. – disse Flayfh, ainda ofegante. – Por sorte minhas preces aos deuses o mantiveram vivo.

– Temos que sair daqui. – disse o espadachim. – É perigoso demais.

– Eu estava esperando você acordar. – respondeu ela. – Udur não vai acordar tão cedo, ele ficou entre a vida e a morte por tempo demais. Só está vivo por clemência divina.

Gavril sentou-se com as pernas cruzadas. Meditou de olhos fechados por alguns segundos e depois ficou de pé em um movimento veloz. Jogou o anão sobre os ombros e começou a caminhar em direção à saída do lugar. Suas mãos estavam doloridas, mas a clériga havia curado os ossos partidos enquanto o guerreiro encontrava-se inconsciente.

– A propósito, ótimo trabalho com o conjurador que guardava o lugar. – Flayfh apressou o passo para acompanhar Gavril – Você realmente supera as expectativas quando se trata de batalhas.

– Não fui eu. – respondeu ele. – Bati bastante nele, mas não fui eu. Por isso precisamos ir embora o mais rápido o possível daqui.

Os dois caminharam em passos acelerados até a saída da misteriosa construção metálica. Cruzaram com alguns dos monstros que haviam derrotado anteriormente e utilizavam o globo de luz criado pelas orações da clériga para enxergarem na escuridão do local. Flayfh aprendia rápido, bastou acompanhar a oração uma vez para aprender a reproduzi-la na sua própria língua.

Do lado de fora Gavril resolveu seguir mais uma vez seu instinto. Anos atrás, quando se aventurava pelas planícies, o espadachim conseguira montar um Wyvern e conviver com ele durante semanas. O tempo foi o suficiente para aprender a vocalizar alguns comandos característicos das criaturas.

Um guincho agudo e prolongado, amplificado pelas mãos em formato de concha e intercalado com curtos estalos da língua. Gavril o repetiu por três vezes e aguardou.

A clériga iniciava uma reclamação quando doiswyverns apontaram nos céus. A carona acabara de chegar.    

Espada e Dever  - Um livro no Mundo de ThystiumOnde as histórias ganham vida. Descobre agora