Bukowskianos

Eu vomitei no meu primeiro dia de escritor

"Eu vomitei no meu primeiro dia de escritor".

Eu só conseguia pensar nisso, do momento que cheguei ao quarto de hotel que a editora alugou para mim até a hora de acordar e pegar o voo de volta. Oh, droga, eu vomitei no meu primeiro dia como escritor. E eles fizeram de tudo por mim. Tinha até um pôster meu. No pôster, inclusive, eu segurava o livro e uma garrafa de cerveja. E os leitores tinham de mim uma imagem de alguém durão ali. Agora, iriam me achar um fracassado fodido e devolveriam o meu livro. 20 mil cópias em 6 dias, pra eu vomitar na mesa de autógrafos. 20 mil, pra eu inundar aqueles bótons e marcadores com o almoço do dia. Estrogonofe de carne e vinho. E eu não bebi durante todo o evento para ser o escritor durão. O novo safado, como eles disseram durante a semana. Oh, meu deus, 20 mil exemplares em 6 dias. 20 anos escrevendo e bebendo. E eu bebi durante todo o evento só porque não consigo ver pessoas. Não consigo conversar com elas. Elas me interrompem, sempre acontece, como se tivessem algo mais interessante pra falar do que eu. Acredito que 90% dos escritores começaram a escrever para poder conversar sem serem interrompidos. Eu comecei por isso. Mas, quando no primeiro dia em que vão me considerar um escritor, afinal, 'você não pode ser escritor se não tem nada publicado', eu fico nervoso, bebo e vomito naqueles bótons, aqueles malditos bótons. Tudo manchado de vinho; pedaços de carne mal mastigados por aqui e ali. Eu só consegui me levantar, limpar a boca nas costas da mão e sair dali. Cheguei ao quarto de hotel que a editora alugara pensando naqueles bótons. Caguei e mijei pensando naqueles bótons. Como eu poderia vomitar no meu primeiro dia como escritor? Não preguei os olhos pensando no maldito vômito, no estrogonofe, no vinho e nas muitas cervejas. E pela manhã o editor me ligou.

Deixei tocando, sabia que era ele. Tocou 5 vezes e parou, e eu ainda pensava nos bótons levados pelo vômito, como pobres numa enxurrada. Tocou mais 4 vezes, resolvi atender.

"Desculpe acordá-lo. Vamos num voo mais cedo. Assim conseguimos fazer outra cidade, ainda na terça".

"Hey, cara! Eu vomitei na cara deles!"

"Sim. E daí?"

"Compravam meu livro por me achar um cara durão. Agora vão saber que eu sou um fracassado fodido".

"HAHA. Você acha isso mesmo? Eles te compram justamente por você ser um fracassado fodido".

Desliguei e me senti bem. Era o meu primeiro dia como um fracassado fodido que não precisava se preocupar em como pagar o aluguel ou em não vomitar na mesa de autógrafos.