Capítulo 12

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Aquele dia era especial por muitos motivos.

O primeiro motivo descobri logo ao acordar. Eu segui o aroma gostoso de pão com café e me surpreendi ao ver a mesa posta. A mãe terminava de aquecer uma jarra de leite enquanto o pai marcava as palavras cruzadas do jornal.

"É o aniversário de alguém?" Perguntei, babando ao ver as torradas com omelete no meu prato.

Pela primeira vez desde nossa chegada à Orla, nós conseguimos sucesso nos negócios. Vendemos apenas dez tijolinhos de parafina, mas e daí? Poderíamos comer no café da manhã e isso, para nós, já era uma vitória enorme.

Eu me perguntava como os surfistas encontraram nossa loja, que continuava sendo um galpão velho no topo do morro. Papai dizia que nossas vendas à beira mar começavam a produzir clientela, mas eu acreditava em algo mais. Alisson devia estar contando aos amigos dele. Se isso fosse verdade, eu agradeceria de um jeito muito gostoso.

Pensando bem, eu não precisava de gratidão para realizar meus planos com o Alis. Eu não o via desde a festa do último domingo, pois minhas vendas à beira mar e o treino dele para o campeonato nos mantinham bem ocupados, e aquele era o segundo motivo de ser um dia especial: Naquela tarde eu assistiria o primeiro campeonato do Grande Alisson, só precisava dar um jeito de escapar.

"Mãe, pai, posso sair hoje?" Perguntei, enchendo as bochechas de torrada. "Prometo vender em dobro, amanhã. Por favor?"

Meu pai baixou o jornal e os dois trocaram um longo olhar. Eles olharam pra mim de um jeito desconfiado.

"Michel, o que tem te ocupado tanto?" Perguntou a mãe. "Você mesmo insistiu em abrir uma loja, seu pai não dará conta sozinho."

"Sem contar que você está de castigo." A voz do meu pai soou bem mais grave. "Você desapareceu domingo, e só voltou segunda de tarde. Nós quase morremos do coração."

Eu abri a boca, completamente frustrado. Nunca na vida meus pais me puniram por nada, eu sempre fui o filho de ouro deles. Pensei que estivessem brincando sobre o castigo, mas porque justamente naquele dia?

"Não vou desistir da loja, prometo que ajudo amanhã mesmo. Vou virar a noite limpando o galpão, qualquer coisa." Implorei, agoniado. Alisson não me perdoaria por faltar um dia tão importante.

Meu pai revirou os olhos e, bebericando o café, voltou a ler o jornal.

"Você pode sair na semana que vem." Ele disse. "Aprenda a não fugir de casa, como um delinquente sem criação."

Aquilo só podia ser um pesadelo. Eu arregalei os olhos pra minha mãe, pedindo socorro, mas eu conhecia a dinâmica daquela casa. Mesmo apiedada, minha mãe geralmente concordava com o meu pai.

"Pelo menos nos conte onde esteve, Michel. O que fez de tão importante, que não poderia nos ligar? Até uma praia como essa tem pessoas ruins, não quero ninguém te machucando."

Minha raiva foi tanta que, quando percebi, havia destroçado a torrada nas minhas mãos. Eu precisava ver o Alisson. Eu precisava assistí-lo competir. Eu sempre fui o filho perfeito, não era justo.

"Vou conseguir uma parceria pra loja." Falei, conseguindo novamente a atenção do pai. "É isso o que tenho feito. Desculpa não contar, queria que fosse uma surpresa."

Meu pai franziu a testa, como se eu fosse um bobo.

"Filho, essa cidade tem no máximo cinco agências, e nós fomos recusados por cada uma."

"Sei de alguém que quer, e é uma pessoa muito famosa, que sempre aparece na televisão." Falei, me empolgando com a minha própria mentira. "Vai dar certo, eu prometo."

O Preço da Adoração (AMOSTRA)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora