Capítulo 07

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Dias após a noite louca com o Grande Alisson, eu subi o morro para trabalhar com o pai, e o interior da oficina me fez gritar.

"Fomos assaltados!" Gritei, percorrendo os olhos pelo galpão vazio.

Não havia mais nada. As plainas, serrotes, caixas de tinta... tudo desapareceu. Restavam apenas a mesa e alguns armários.

Meu pai ergueu uma caixa e jogou sobre a mesa, com um sorriso tranquilo. Só então percebi que a mãe também estava ali, e pelo sorrisinho em seu rosto cansado, pela primeira vez na minha vida eu não ouviria algum desastre.

"Não teve assalto, filhão." O pai abriu a caixa e chamou para que eu viesse. "Precisei vender algumas coisas, ou como eu compraria isso?"

Desconfiado, eu me aproximei da mais nova loucura do pai, já pensando no quanto deveríamos ao banco. Mas dentro da caixa não havia nada especialmente esquisito, apenas leashes para pranchas, uns potes estranhos, caixas de parafina, e muitas daquelas bisnagas prateadas que o Grande Alisson usou para consertar minha prancha.

"Comprou tudo isso vendendo nossos equipamentos?" Eu franzi a testa, vasculhando a grande variedade de produtos e percebendo que no chão haviam outras duas caixas como aquela. "Como pretende construir pranchas, agora?"

A mãe parecia prestes a aplaudir e dar risada, de tanta alegria. Mas em respeito ao pai ela só demonstrou um leve entusiasmo.

"Vamos transformar esse lugar numa loja de surfe. Alguém convenceu seu pai a tentar algo novo." Ela piscou pra mim, e pegou a vassoura que descansava entre vários produtos de faxina. Pelo visto os dois limpavam a oficina quando eu cheguei.

Eu arregalei os olhos, em choque mas também profundamente animado. Aquele galpão caindo aos pedaços precisaria de muita limpeza, mas era um lugar enorme. Poderíamos construir uma linda loja para os caras ricos do bairro central, e finalmente ter o que comer.

Emocionado, eu me joguei na mãe e no pai, abraçando aos dois. Eles também me abraçaram e afagaram as molas do meu cabelo.

"Essa vai ser a melhor loja de surfe do mundo." Eu me sentia prestes a chorar, não só por mim, mas pela mãe parecer tão animada. Há quanto tempo ela só se arrastava por aí, aguentando as idéias bobas do pai? "Me diz por onde começar, mãe. Vou varrer com a senhora e deixar brilhando esse lugar."

Eu tentei tomar a vassoura e a mãe recuou, dando risada.

"Não, não. A parte da limpeza é comigo. Você vá com o seu pai divulgar nossa loja."

"Como assim, divulgar? Ainda não tem nada aqui." Falei, começando a ter um pressentimento estranho.

E então meu pai desceu uma placa de papelão branco por cima do meu ombro. Havia uma segunda placa nas minhas costas, as duas se equilibrando por cordas nos meus ombros.

Eu baixei o rosto e li, de cabeça para baixo, a mensagem pintada na letra da mãe "Surfe Somos Nós".

"Não é um bom nome? Seu pai quem sugeriu, e me parece bem convidativo." A mãe ajeitou as alças nos meus ombros, enquanto eu tentava entender qualquer coisa.

"É um bom nome, mas... por quê estou vestindo ele?" Perguntei, e meu pai jogou a caixa pesada nos meus braços e pegou uma das outras caixas.

"Ninguém vai visitar uma loja no topo do morro sem divulgação." Falou o pai. "Por enquanto venderemos na praia."

Eu forcei um sorriso, me sentindo ridículo com aquela coisa. Mas era tudo pela loja. Poderia ser pior.

E então o pai vasculhou as outras coisas, e vestiu na minha cabeça um enorme chapeu de pelúcia, no formato de um polvo cor-de-rosa.

O Preço da Adoração (AMOSTRA)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora