Capítulo 59

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Ele cospe aquelas palavras tão naturalmente na minha cara que sinto minha cabeça rodar. Ele me olhava com os olhos semi cerrados e parece que esperava alguma resposta minha, mas como não obteve, continuou.

Gustavo: eu sei que pode ser difícil -pausa- e é, mas você não pode se abater. Eu tentei convence-los a desistir da ideia mas o Joaquim e o Junior estavam muito decididos.

Lembrei das palavras de consolo do Joaquim ao Junior quando me viram saindo e parece que algo estala na minha cabeça.

Rafaela: e o Pedro? -minha voz sai como um sussurro
Gustavo: não vou mentir pra você, ele não foi o mais satisfeito com a ideia, mas concordou.

Não acreditava no que o Gustavo falava, até o Pedro, ele que eu sempre ajudei, dei uma força. Aceitei entrar num namoro que nem é verdadeiro, lutei contra meus princípios e isso acontece.
O Joaquim e eu sempre tivemos nossas diferenças mas nunca pensei que pudesse ser tão extremo.
O Junior, ah o Junior! Meu grande amor ou amigo, não tenho certeza, sempre estive ao lado dele. Ajudando, aconselhando, consertando as burradas que ele fazia será que nada disso fez sentido? As noites passadas em claro assistindo filme, as risadas, os conselhos, os segredos compartilhados, aquela noite.
Meus pensamentos se escurecem ao lembrar daquela noite. E dou por conta do que estou fazendo. Me martirizando por algo que eu não sou culpada, eles que são os ingratos que não me deram valor. Eu emprestei a eles o meu talento, meu carisma naquela bandinha e é assim que eles retribuem.
Volto pro mundo real em algum momento de um susposto discurso de lamento do Gustavo.

Gustavo: vai ficar tudo bem
Rafaela: eu sei que vai -levanto e fico de costas pra ele, me envolvendo com meus próximos braços.
Gustavo: agora podemos ser só eu e você. Pensa bem, eu empresariando você, seríamos um sucesso.

Dou uma gargalhada e viro lentamente pra ele.

Rafaela: é tudo o que você queria né Gustavo, eu fora da banda pra você empresariar somente eu?
Gustavo: não é tudo o que eu queria, mas seria legal, pensa.
Rafaela: sabe no que eu to pensando? Que você é um oportunista. Nunca deu a mínima pra mim e nem pra nada que eu fazia, mas agora que eu to te dando lucro, você é todo querido comigo. Ah, Gustavo da um tempo, aqui ninguém é criança!!
Gustavo: eu acho que você ta interpretando errado minhas intenções Rafa.
Rafaela: não me chama de Rafa pelo amor de Deus -gritei com os dentes cerrados- é Rafaela pra você -recuperei o tom da voz e o encarei.
Gustavo: Rafaela, calma.
Rafaela: não, não vou me acalmar. Sai da minha casa.

Abro a porta e o empurro pra fora. Quando estava prestes a fechar a mesma ele segura minhas mãos.

Gustavo: você é uma ingrata, sabe o quanto eu investi em vocês?
Rafaela: e tu é um interesseiro, sabe o quanto eu precisei do seu investimento? -soltei meus pulsos
Gustavo: mal agradecida, mimada...

Ele continua gritando e eu bato a porta na cara dele. Ele esmurra um pouco a porta e vai embora, eu escorrego até o chão e caio sentada. Choro um pouco e vou até o banheiro, me olho no espelho, lavo meu rosto e em um momento de loucura vou até o apartamento do Júnior.

Espanco a porta algumas vezes até ele vir abrir. Entro sem pedir licença e quando chego até a cozinha lá estão eles, sentados rodeados de caixas de pizza e cerveja.

Rafaela: ótimo encontrar todos aqui. Que história é essa de me tirar da banda?
Joaquim: isso mesmo! Antes que você comece a falar e não pare, você mereceu. Eu sempre achei mas agora os outros também enxergaram a mimada, egoísta, arrogante que você é. Não queremos mais você entre nós.
Rafaela: você não me conhece pra ta falando assim.
Joaquim: realmente, não conheço. Fala ai Junior, tu conhece ela. Fala que tipo de pessoa ela é.

Junior abaixa a cabeça como se não fosse com ele.

Junior: para, cara
Rafaela: fala Junior, que tipo de pessoa eu sou.
Junior: -me olhou com os olhos verdes e senti meu interior estremecer- ele tem razão Rafaela. Não queremos mais você perto de nós.

Minha cabeça gira. Encaro todos aqueles rostos a minha volta. Joaquim tinha uma expressão vitoriosa. Senti brotarem lágrimas em meus olhos. Vi o Pedro quietinho lá e senti uma pontinha de esperança brotar em meu coração.

Rafaela: Pe... Pedro -me abaixei próximo as suas pernas- fala pra eles, eu sou bacana, né? -ele continua de cabeça baixa- fala caramba.
Pedro: desculpa! -ele parecia triste.

Levantei rapidamente, sequei as minhas lágrimas com a manga do meu casaco e encarei a todos.

Rafaela: Pedro acho que você não sabe, mas aceitei o contrato por sua causa. Estava preocupada com você, sabia o quanto a banda significava muito e não queria que tu a perdesse
Joaquim: não foi por causa do Pedro, Rafaela. Foi por você e pelo seu ego.

Rafaela: vocês são uns ingratos. Eu dei todo meu talento pra essa bandinha ridícula e é assim que vocês me tratam! Quer saber vocês não são nada sem mim - dei ênfase a palavra nada- ou vocês acham que vão conseguir alguma coisa sem mim? Estão muito enganados.
Joaquim: pode até ser, mas só pelo fato de não ter mais você por perto nós já ganhamos muito.

Não falei mais nada, só sai caminhando lentamente até a porta. Quando estava prestes a sair olhei novamente pra trás e entre a voz embriagada pelo choro disse minhas últimas palavras.

Rafaela: fiquem ai. Comemorem bastante a minha saída, deve ser por isso todas essas caixas de pizza.
Junior: o mundo não gira ao seu redor Rafaela. Já olhou pro calendário hoje? É dia da pizza!

Não consegui dizer mais nada, apenas senti meu mundo desmoronar mais um pouco. Esse era meu dia predileto, o dia que todos nós nos reuniamos e comíamos pizza. Foram tantos anos, tantos encontros, sempre pensei como seria o último encontro nosso, mas nunca em hipótese nenhuma pensei que seria assim.

Contrato - Luan SantanaOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz