Capítulo 1

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Seus passos apressados percorriam o corredor, seu semblante iluminado fracamente por ocasionais lâmpadas. O cabelo era de um negro intenso, longo o bastante apenas para ser penteado para trás e sobrar algumas pontas rebeldes, a barba curta escondia antigas cicatrizes que seus quase quarenta anos de vida não conseguiram apagar. A preocupação era visível em seu rosto, mas uma pontada de alívio tomou conta dele logo que uma voz conhecida surgiu:

- Jen.

- Töra - Ele cumprimentou em retorno, sem interromper seu caminho nem mesmo para olhar em seu rosto.

A mulher que estava reencostada na parede de braços cruzados começou a segui-lo. Ela era quase vinte anos mais nova e, ao contrário dele, era kryawm, o que não é difícil de perceber quando se tem longos cabelos negros, pele levemente escura e olhos de um vermelho mais vivo que o sangue.

- Ainda bem que a chuva não está entrando mesmo com todas essas malditas rachaduras. Não podíamos ter escolhido um lugar melhor? - Töra comentou ao passarem por uma janela estilhaçada que revelava uma leve chuva no exterior.

- Esse era o mais próximo disponível. E não fique tão esperançosa, já vamos nos molhar.

- Não sou uma garotinha medrosa, Jen. Se for para servir a Adaga, eu faço muito mais do que apenas ficar molhada.

- É isso que eu gosto de ouvir.

O caminho os levou até uma porta fechada ao fim do corredor. Dois homens esperavam por eles. Um de cabelos e olhos escuros, pele muito alva, outro de cabelos loiros arrepiados e olhos castanhos, com um sorriso no rosto enquanto conversavam.

- Fehls, Neil - Jenisson chamou respectivamente.

Foi o bastante para fazê-los se aquietar. Todos usavam uniformes negros, portando joelheiras, caneleiras e cotoveleiras de couro, coturnos grossos, luvas de dedo e um colete a prova de balas com ombreiras de proteção. Seus armamento e seus trajes eram compatíveis com os de um exército regular e bem organizado, mas isso estava longe de defini-los, mesmo que estivessem acima dos padrões de qualquer simples facção de Porto Tempestade.

- Os homens estão esperando, estamos prontos para as ordens - Disse Fehls.

- Mas é claro que a diversão não pode começar sem o chefinho, pensei que não chegaria mais - Completou Neil.

- Não se precipite, Neil. Bons amigos sempre chegam na hora certa.

Jen acenou com a cabeça e eles abriram a porta à sua frente. Ele adentrou no aposento passando por um declive do batente da porta apoiando-se no ombro de Fehls.

O lugar estava caindo aos pedaços, as rachaduras estavam por toda parte como se as paredes fossem ceder à qualquer momento, a luz provinha apenas de uma lâmpada improvisadamente fixada ao teto, cujos fios expostos cortavam a sala de um canto à outro. Tudo isso já era de se esperar de uma construção abandonada há anos, mas isso não impediu que os adagas de tomassem-na como ponto de encontro para discutir a missão vigente.

Quase dez homens e mulheres vestindo o mesmo uniforme negro rodeavam inquietos um caixote no centro da sala, ao ver seu líder entrando, colocaram-se em posição. Ao entrar, Jenisson juntou-se a seus homens e apoiou seus braços sobre o caixote, a sombra de seu corpo se projetou sobre um mapa do local recém feito que jazia sobre a caixa. Töra, sua segunda em comando ficou logo ao seu lado cruzando os braços, Fehls e Neil ficaram logo atrás. O silêncio tomou conta do ambiente enquanto todos olhavam para seu líder esperando as instruções, mas Jen não os fez esperar muito:

- Senhoras e senhores, eis o que temos para hoje.

- Já era hora - Neil cochichou para quem estava ao seu lado.

- Todos devem estar familiarizados com uma das novas gangues de Porto Tempestade, liderada por um novato de nome Roan - Um coro de grunhidos afirmativos surgiu antes de Jen prosseguir. - Não temos nenhum problema em deixar que pessoas se reúnam ao fim do dia e usem tatuagens iguais por ai... mas recebemos relatórios de que Roan e seus homens estão contrabandeando drogas há mais de um mês. Já temos problemas o bastante com Perseus, não queremos mais alguém envenenado nossa ilha... e fica por nossa conta nos livrarmos do lixo e fazer desse desgraçado um exemplo.

Todos concordaram, sabiam que Jen podia ser um pouco exagerado quanto à suas utopias de justiça em meio à podridão daquela cidade, mas acreditavam nele até a última gota de sangue e o seguiriam até que o último suspiro saísse de seus pulmões. Dentre eles, Töra era quem mais acreditava em seus ideais. Ela até mesmo abriu um sorriso enquanto Jen começava a explicar o plano:

- Nossas informações traçaram exatamente as rotas e os horários exatos nos quais os comboios de drogas estão sendo conduzidos. De dois a três caminhões não blindados, pouca escolta, armamento leve. Roan está brincando com suas chances, mesmo sem poder ou homens suficientes, ele quer jogar um jogo no qual não pode sair vencedor. E cabe a nós mostrar isso a ele.

Jenisson apontou no mapa a estrada pela qual o comboio passaria e a seguiu com o dedo até parar em um ponto específico.

- Daqui a nove minutos o comboio do dia estará passando por aqui. Esperaremos até que as minas que plantamos atinjam o primeiro caminhão bloqueando o caminho - Ele moveu seu dedo indicando outros três pontos. - Essas serão as três posições de atiradores que vocês vão tomar. Neil, posição um, Kar, posição dois, Fehls, posição três. Subam nesses prédios o mais rápido que puderem quando sairmos daqui, elas serão cruciais, como de costume. O resto vai me seguir e esperar atrás desta cobertura, emboscaremos o comboio trancando sua retaguarda logo que ele parar e eliminaremos qualquer hostilidade.

Todos concordaram respectivamente ao ouvir suas ordens individuais, mas Töra não coseguiu se conter, atirando-se na explicação:

- E o civis?

- Töra - Interrompeu velozmente. - Quero você do meu lado cem por cento do tempo, sem distrações. Já mandei os poucos que moravam aqui evacuar por meio dos informantes da rede, este local foi escolhido cuidadosamente e esse é um dos motivos. A área está completamente limpa, você sabe como eu ajo - Ela pareceu se aquietar por um instante e Jen pode retomar o ponto. - Mais uma coisa: Roan está nesse comboio, tentando balancear a falta de guarnição. Queremos ele vivo, a ação será rápida e indolor - Os homens abriram sorrisos de diversão com a novidade.

- Como peixe em um barril - Comentou Fehls checando o comunicador preso à sua orelha. - Todos os comunicadores estão sincronizados. Armamentos e homens preparados, senhor.

- Adagas, vamos mostrar à Porto Tempestade o que significa justiça!

Com as palavras de Jen, brados exacerbados ecoaram e todos levantaram sua armas e punhos cerrados para o alto.

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