Capítulo 30 - O Falso Profeta II/III

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Domingo, 07 de setembro, 21h20min – Condomínio de Salvador Lavezzo.

A mansão principal era enorme, havia cômodos e extravagâncias suficientes para abrigar mais de vinte pessoas com muito conforto, desde os convidados até os empregados. Um luxo que apenas tamanha a abastança poderia proporcionar. Um luxo que não valia de nada quando, preso em sua própria armadilha, era obrigado a estar frente a frente com uma das criaturas mais odiosas de sua infância. Salvador titubeou. Havia mudado de expressão, abdicando da postura forte, por algo pálido e de ombros frouxos. Sua fala sempre precisa e coerente deu espaço a miscelânea de maus pensamentos, mantendo apenas o olhar vidrado em ódio. Suas últimas fichas estavam depositadas na palavra de um inimigo que, por ironia do destino, havia sido um dos principais culpados pela morte de seu avô.

— Que generoso da sua parte. Mas, vá direto ao ponto. — Preocupado com o horário apertado, Salvador arrematou.

— O sarcasmo não deveria ficar a cabo dos vencedores? —Médici devolveu o desaforo. — Ao contrário de você, conheço os colombianos como a palma da minha mão e, acima disto, desejo regressar aos negócios.

— E daí? — Questionou Salvador.

— E daí?— Parafraseou-o — Não tenho nada contra você. Se eu pudesse, mataria o Riccarditto no teu lugar, mas existe uma mulher, dois filhos e três netos que me esperam. Pessoas que me forçaram a não recusar a quantia de cinco milhões de reais.

— Cinco milhões! Eles me venderam por essa ninharia? — Chocado com valor tão irrisório deu um tapa de mão aberta no braço da poltrona — Eu to devendo sessenta, em dólares! Por que não me falou antes? Eu pago o triplo se você desistir do esquema.

— Com certeza, mas você jamais chegaria a este valor — Médici deu uma pausa — A não ser que estivesse em maus lençóis.

— E como sempre tudo se resume a dinheiro... — Salvador comentou embargado.

— Dinheiro chama dinheiro. Tudo é dinheiro, sempre foi e será. Contudo, você tem a oportunidade de escapar do destino "inevitável" e ter acesso a informações privilegiadas sobre a melhor maneira de lidar com esse "problema" além-fronteiras. — observou o consentimento do anfitrião e deu seu preço — Basta deixar o orgulho de lado e mover alguns pauzinhos, pois, como é sabido, sou um posato que deseja regressar ao ninho além de, por justiça, merecer uma fatia generosa do pizzo cobrado em sua região. Contudo, caso ache caro, ao menos, me diga o seu buquê favorito.

Compreendendo imediatamente a referência ao seu possível funeral, Salvador evitou prolongar-se mais. Conhecia homens como Médici, da velha guarda. Eram criminosos diferenciados. Tratadores à moda antiga, sem papas na língua ou recursos judiciais. Crápulas da pior espécie, porém, dignos ao ponto de honrar com sua palavra. Perderia mais de oitenta milhões de reais ao ano, além de ser obrigado a conviver com um dos seres mais detestáveis na face da Terra, entretanto, dando a mão para não perder o braço, deixou o plano seguir seu curso "natural", afinal, após o estopim, não restaria pedra sobre pedra.

— Como será? Carrasco ou aliado? — Médici tratou de falar com mais intensidade.

Notando a ironia nas palavras do visitante, Salvador contraiu um sorriso severo e, ciente de que a aliança proposta se restringiria até a morte de Riccardo Battisti, consentiu. Ao fim, seria manipulado por outro cretino. Um preço a pagar por nunca ter abaixado a cabeça.

— Você não é obrigado a acreditar em mim. Mesmo assim, saiba que eu sempre tentei ser um homem ético e a honrar com a palavra— Comentou o experiente criminoso. — Por que desta vez seria diferente?

— Você só pode estar de sacanagem com a minha cara. — Sem paciência, Salvador respondeu. — Trama contra mim, invade a minha casa e ainda tenta me extorquir com esse papinho de ser ético? Agora, me dê um motivo para não matá-lo?

Bella Mafia - Dinheiro se lava com SangueOnde as histórias ganham vida. Descobre agora