26 - Segredos

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— Bom dia. Elena Tavares se encontra internada neste hospital? — Eu não saberia dizer o que me levou a dirigir em pleno sábado até o hospital onde a mãe de Nora se encontrava hospitalizada. Mas cá estava eu: “o presidente da Martinelli Corporation vestido com um jeans qualquer num hospital público, visitando a mãe de uma funcionária.” Meneei a cabeça, desaprovando minha própria conduta, enquanto analisava o local. “ Você só pode estar ficando louco, Gian”...

— Senhor? — ouvi a voz da recepcionista, despertando-me dos devaneios. 

— Sim?

— A senhora Elena Tavares se encontra hospitalizada sim, o senhor deseja visitá-la?

— Na verdade, eu gostaria de falar com a filha dela. Acredito que ela esteja acompanhando a mãe. 

— Têm três pessoas com ela no momento, senhor — informou, após analisar a tela do computador — seria qual delas?

— Nora Tavares.

— Não tem nenhuma Nora, senhor.

— Tente Eleonora Tavares — elucidei, ao que ela voltou a estudar a tela a sua frente. Porém, no momento em que a atendente abria a boca para me dar uma resposta aparentemente positiva, ouvi uma voz doce e um pouco rouca atrás de mim.

— Como sabe o meu nome?— virei-me para buscar a dona da voz e encontrei uma Nora abatida, com olheiras nos olhos e um rabo de cavalo que domava os belos cachos de forma improvisada. Ela segurava uma pequena mala nas mãos e uma bolsa tiracolo nos ombros. A calça jeans envelhecida e a blusa simples, denunciavam que mal teve tempo para pensar ao sair de casa.

— Nora…— dei dois passos em sua direção, alcançando seus ombros — como ela está? 

— Estamos aguardando os resultados dos exames — respondeu com o olhar triste. As pálpebras mal conseguiam se sustentar em pé. 

— Está indo para casa? — ela anuiu acenando com a cabeça — vamos, eu te levo — interpelei, puxando a mala de suas mãos, porém ela a deteve, hesitante.

— Giulio, não precisava se incomodar… eu ia chamar um Uber — içou as sobrancelhas em minha direção. 

— Ia, não vai mais, okay? eu estou aqui, não estou? — ela relaxou os ombros cansados, soltando os dedos da alça da mala — isso. Me deixe te ajudar, está bem? — ela assentiu novamente, cansada demais para articular qualquer coisa coerente e eu a guiei até o meu carro, pousando uma mão em suas costas. 

***

No caminho para a casa, Nora adormeceu no banco do carona. Não sem antes me relatar por alto a dor de cabeça insuportável que acometera a mãe, a ponto de fazê-la sair correndo da faculdade para casa. Depois de um desmaio súbito de dona Elena, Nora precisou ligar para a ambulância que correu às pressas com as duas para o hospital. Depois de uma noite insone, Elaza chegou para rendê-la, junto com a tia. 

Parado no semáforo, virei-me para estudá-la um instante. Nora era, definitivamente uma princesa, por não render-se às minhas investidas e mostrar-se sempre respeitosa consigo mesma. Uma jóia rara de se encontrar, num mundo de sexo banalizado e mulheres vendidas por pouco ou nada. Todavia, naquele momento a princesa Nora havia perdido parte do seu encantamento, pois mantinha uma boca semiaberta e um leve ronronar, fazendo-me sorrir inconscientemente. Levei uma mão por sobre os seus olhos para tapar o sol, e só me dei conta do gesto de gentileza que se arrastava por segundos, concomitante ao meu olhar por sobre ela, quando levei algumas buzinadas por ficar parado com o semáforo aberto por um longo, longo tempo. 

“Por que raios eu me importo?” Era a pergunta que martelava a minha cabeça durante todo o trajeto. “Acaso me importo, ou apenas estou sendo um cafajeste ao usar um momento de fragilidade da mulher ao meu lado para logo depois tê-la em minhas mãos? Ou em meus braços? Em que ponto termina o Gian canalha e começa o Giulio gentil e prestativo? Acaso ele existe em algum lugar dentro de mim?”

Se Não Marchar... Não Tem Cortejo (Romance Cristão)Where stories live. Discover now