13 - Orgulho e preconceito

96 14 11
                                    

- Que diabos é cortejo!? - Inquiri ao meu secretário que, ousadamente, estava sentado em minha cadeira atrás da mesa. Ele deu um salto desajeitado ao me ver, arrumando os óculos no rosto. Bati a porta do escritório atrás de mim, movido pela indignação de ter sido dispensado, sem nem mesmo ter ideia do porquê.

- Anh... cortejo? Fúnebre ou nupcial? - revirei os olhos, esfregando a dor latente no centro da minha testa. Caminhei até a mesa e sentei na minha cadeira, recostando-me enquanto mirava o teto. As imagens da conversa com Nora ainda estavam rodando em minha cabeça. "Eu tinha tudo sob controle! Não tinha?"- O senhor está bem?- fiz que não com a cabeça, fitando-o em seguida.

- Ela me dispensou!

- Ela quem?

- Ela, rapaz! - estapeei a mesa - Ela! Primeiro disse que eu poderia "cortejá-la"- cuspi com uma careta - com a naturalidade de quem diz a previsão do tempo! Como se eu fosse obrigado a saber o que significa tal coisa! Depois, como se lhe ocorresse uma epifania, mudou de ideia e revelou que não poderia ser "cortejada", pois seria...- estalei os dedos freneticamente, tentando me recordar, atraindo o olhar atento do senhor Park - alguma coisa desigual...

- Jugo desigual - completou. Apontei meu indicador para ele.

- É isso! Park, você é a minha enciclopédia pessoal. Trate de me esclarecer que diabos essa menina disse, ou faça sua carta de demissão! - despejei, com raiva saindo pelos poros.

- Fique calmo, senhor - ergueu as mãos em defesa e sentou-se à minha frente - eu vou explicar tudo ao senhor.

***

Cortejo, no sentido de cortejar uma mulher, refere-se ao conjunto de comportamentos e gestos realizados por alguém com o objetivo de conquistar o interesse romântico dela. Isso pode incluir elogios, gestos gentis, demonstrações de afeto e atenção especial, entre outras ações que visam demonstrar interesse e criar uma conexão emocional.
Fonte: Chat gpt.

- Então é como se fosse um namoro para crente? - estreitei os olhos.

- Não exatamente, senhor. É uma coisa de época, como nos filmes. Mas ressurgiu no meio cristão, ao estipularem uma espécie de "namoro santo" nas igrejas.

- Namoro santo? - bufei, com um sorriso sardônico - que piegas! Então o casal não pode ter intimidade?

- De forma alguma! - Atalhou, como se eu tivesse proferido um palavrão. Meneei a cabeça, incrédulo com que os meus ouvidos ouviam.

- Está mais para cortejo fúnebre mesmo - murmurei.

- É só lembrar do filme Orgulho e Preconceito, senhor. Os casais mal davam as mãos, naquela época.

- Não assisto esse tipo de filme, Park. E você também não deveria ferir sua masculinidade, assistindo essas baboseiras! Se é que lhe sobrou alguma...- sussurrei a última frase. Recostei novamente a cabeça no encosto da cadeira, olhando para o teto iluminado. Talvez eu devesse, de fato, ouvir o conselho do meu irmão e me afastar dessa menina. Talvez, tudo que eu tenha é um ego inflado, o suficiente para provar que consigo 'pegar' qualquer mulher. Mas, pelo visto, esta já provou ser 'impegável'. Ao mesmo tempo que tento me convencer de que ela não é a mulher certa, lembro-me do dia que a encontrei no elevador, ouvindo música nos fones. "Eu sou do fogo..." ela disse, graciosamente. O que será que ela quis dizer com isso? Eu tinha que descobrir! E se eu entrasse no jogo dela, para ver onde vai dar todo esse... fogo? Talvez, ela só esteja se fazendo de difícil. Talvez, sua forma de 'cortejo' seja um pouco mais adaptada para os dias atuais. Quem sabe? Possibilidades, possibilidades, possibilidades...- e quanto a esse tal de 'jugo desigual'? Que cazzo ela quis dizer com isso?

- Bem - levou um dedo ao meio dos óculos, enquanto refletia - ela, basicamente, quis dizer que não pode te aceitar porque vocês não professam a mesma fé. - Ouví-lo dizer tal coisa, a qual eu julgava ser algo pré histórico, me fez bufar novamente. O sarcasmo unido à indignação vestia minhas feições.

- Mas quanta bobagem...- murmurei, tamborilando os dedos na mesa. - então quer dizer que eu tenho que ser crente, do contrário, não estarei apto para "cortejá-la"? - fiz aspas com os dedos, vendo o senhor Park assentir. Balancei a cabeça de um lado para o outro - acaso estamos no século 19? Isso é ridículo! Beira a loucura! - protestei, vendo-o dar de ombros.

- É um mundo diferente, senhor. Mas se me permite expressar opinião, mulheres assim é que valem a pena.

- O que quer dizer com isso Park?

- Quero dizer que ela se valoriza, senhor. Já vi mulheres pularem nos braços de um cara por muito menos. A Nora é diferente e isso é bom. Ela impôs as condições dela, cabe ao senhor julgar se vale a pena ou não.

- Deixe eu ver se entendi. Está me dizendo que eu tenho chance, contudo, devo virar um crente e aceitar ter um relacionamento cafona com base em cortesias?

- Se ela valer a pena...

- Ora, por favor! Eu tenho um mundo de mulheres aos meus pés, por que eu me daria a esse infortúnio? - novamente ele deu de ombros e eu decidi ao final daquela conversa que não entraria naquele jogo. Eu não precisava me rebaixar a tanto. Precisava?

***

Cheguei ao meu apartamento, naquela noite, atônito. Eu queria acreditar que não me importava em ser dispensado por Nora. Eu poderia investir em uma relação com uma mulher normal, não precisava me dar ao trabalho de "cortejar" uma louca fanática. Mas eu me importava. O incomodo gerado dentro de mim era desconfortável demais. Eu queria e precisava dela e depois de muito pensar, percebi que não era de todo ruim que ela fosse cafona daquele jeito. Era até bom. Quanto mais conservadora e recatada ela fosse, melhor limparia a minha reputação. Por isso decidi que dançaria aquela valsa antiquada e me renderia ao Deus dos crentes se preciso fosse. Faria qualquer coisa que ela pedisse e mesmo sem pedir, comecei naquela noite a dar voz a minha determinação.

Depois de toda a rotina noturna, nem olhei para a varanda do apartamento, apenas abri uma fresta da porta, para que a brisa salgada do mar entrasse pelas cortinas. A minha atenção estava voltada para outra coisa. Joguei o corpo no sofá, peguei o controle e busquei o tal filme 'orgulho e preconceito', encontrando-o em uma das streamings.

Logo de cara, o filme exibiu mulherzinhas afoitas para se casar, uma mãe desesperada para casar as filhas e um cenário rústico do século 19. - Goodness! não posso assistir a isto sóbrio - sorri atordoado. Busquei uma taça de vinho na cozinha aberta e sentei novamente, enquanto balançava a taça. Sentia-me um palhaço. Mas eu assistiria àquela coisa. - é para o bem da ciência, afinal, como um profissional, devo conhecer o mundo feminino, não é mesmo? Não vou perder minha masculinidade - assim espero.

Se Não Marchar... Não Tem Cortejo (Romance Cristão)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora