15. Marina decide que até as vadias precisam de um pouco de dignidade

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Gritos e tapas no rosto me faziam abrir os olhos, mas eu não via nada além de flashes sem sentido. 

Primeiro, vi o rosto do Michael e ele ficava repetindo:

— Fica acordada! Você precisa abrir os olhos Nina! Fica acordada!— Mas eu não tinha forças, o sono era muito forte.

Quando abri os olhos novamente enxerguei um AllStar de cano curto vermelho. Virei a cabeça para cima e o Tiago entrou no meu campo de visão. Eu estava no chão, deitada de lado. A cabeça no colo dele. 

— Ela acordou! — Ele gritou. O que diabos eles estavam fazendo aqui? Reunião do jornal na minha casa?

— Falaram que entraram em contato com a ambulância. Deve chegar em 15 ou 20 minutos. Nunca demorou tanto assim. — A voz de Michael estava falhando, como acontece quando ele está nervoso. 

— Eu não sinto o pulso dela, Michael! 

— Que se foda a ambulância!  — Senti meu corpo ser guinchado e a última coisa de que me lembro antes de apagar novamente foi um cheiro. Canela e café. 

...

A primeira coisa que eu vi ao acordar foi uma lâmpada quadrada gigante no teto. Depois um uma agulha enorme enfiada no meu braço. Segui com os olhos o tubo com um líquido transparente até ver Michael sentado em uma cadeira. Ele saltou ao notar que eu estava me mexendo.

— Enfermeira! Ela acordou! — Ele gritou e então sentou-se na beirada da maca, me fazendo carinho na testa. — Você quase me matou de susto, garota idiota!

Soltei um riso soprado seguido de uma tosse seca. Ouvi a cortina que cercava a maca ser aberta e a enfermeira entrar na sala.

— Como está se sentindo? 

Dei de ombros. —  Mal?  

— Alguma dor? — Ela insistiu.

— Minha garganta está ardendo. A cabeça. O estômago. — Olhei para Michael. — Meu ego também está ferido.

— Ótimo. Temos uma engraçadinha. — Ela sorriu forçadamente e riscou algo na sua prancheta. — Fizemos uma lavagem estomacal em você. A dor de garganta deve ser por causa da cânula. Vai passar em um ou dois dias. O restante dos sintomas são comuns após a intoxicação alcóolica, inclusive o dano no ego. — Ela soltou outro sorriso irônico e se dirigiu ao Michael.

— Ela precisa ficar até o soro acabar, depois o médico vai passar para examiná-la e dar alta. — Michael concordou e a enfermeira entregou um panfleto para ele antes de sair.

 —Desculpa. — Falei respirando fundo.

— Já fazem quase 6 anos, Nina. Não é para mim que você tem que pedir desculpas. Quando você vai parar de se culpar por algo que foi acidental? 

Minha visão começou a ficar turva enquanto meus olhos se encheram de água. Pisquei várias vezes tentando me livrar do choro, mas algumas lágrimas rolaram solitárias pelas minhas bochechas. Não era a primeira vez que eu vinha parar no hospital por intoxicação alcóolica. E era sempre Michael quem me socorria. Todas as vezes. Todos esses anos. 

Ele me entregou o panfleto que a enfermeira havia lhe entregado. Era um informativo sobre reuniões dos Alcoólicos Anônimos. Revirei os olhos e amassei o panfleto, jogando-o no chão.

— Eu imaginei que você fosse fazer isso. — Ele riu e eu também, o que gerou outro acesso de tosse.  — Você lembra o que aconteceu?

— Não sei se lembro ou se deduzi porque a enfermeira acabou de falar, mas eu acho que enchi meu cu de álcool até apagar.

VizinhosWhere stories live. Discover now