Capítulo 3

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Ilgaz saiu furioso da audiência. Queria pensar que sua irritação tinha a ver com a injusta absolvição do réu, mas sabia que ia muito além. Perder era ruim, mas perder para Ceylin era muito pior.

Testemunhas e provas começaram a surgir de todos os cantos, quando em um minuto a encarou nos olhos conseguiu ver a vitória nos olhos dela e soube que estava perdido.
Para piorar, Ceylin e Cunneyt não paravam de interagir. Ele lhe tocava o ombro, chegava perto demais para confidenciar algo, olhava todo o tempo para trás esperando instruções dela. Em certo momento da audiência Ilgaz não se conteve e questionou se o advogado havia trago uma professora para lecionar durante a audiência. Possivelmente a grande maioria do tribunal não tinha notado, porém ele próprio sabia que foi um chilique de ciúme.

Ao chegar em sua sala, derrubar algumas pastas no chão para conter sua ira, puxou todo ar que podia ao sentar em sua cadeira e soltou devagar, procurando acalmar os nervos

**

-Você não pode entrar. -Osman, cunhado de Ceylin, estava como uma parede na frente de Ilgaz, que apenas reuniu forças no braço e o empurrou para longe. Mas logo em seguida foi parado também por Eren.

-Ilgaz, você precisa se acalmar. Vão acabar mandando prender você. -O agarrou arrastando-o para longe.

-Irmão, a garota não quer te ver. Vá para casa, esfrie a cabeça. -Osman falou, ainda se recuperando do empurrão.

-Ela é minha mulher. -Gritou. Eren usava a força que não tinha para detê-lo.

-Ilgaz, porra! -Gritou para o promotor, finalmente conseguindo atenção. -Chega! Ceylin está bem, a família dela já está chegando. O rapaz apenas está fazendo o que ela pediu.

**

-Voltei a vê-la.

Suas pernas balançavam  freneticamente, a agonia expressa em seu rosto era evidente. Há meses ele não pisava na terapia, mas de repente se viu pressionado a voltar pelo mesmo motivo qual procurou ajuda anos atrás.

-Como quando você a imaginava? -Perguntou o terapeuta. Ilgaz negou com a cabeça.

Ilgaz viveu momentos tensos no primeiro mês após terminar o casamento. Sem saber onde Ceylin estava, como estava e o que estava fazendo, ele a via em todos os lugares. Era tudo um jogo de sua mente, da necessidade e inconformidade com tudo. Quando a viu pela última vez ela estava sofrendo tanto, tudo que havia nela era melancolia e ódio dos Kayas.

-Não, ela de verdade. Ela voltou. -Respondeu jogando as costas contra o encosto do sofá. -Voltou e está me atrapalhando.

-De que forma? -Questionou.

-Como 'de que forma'?! Essa mulher está na minha cabeça 24 horas. Eu durmo e sonho com ela, acordo e penso nela, vou trabalhar e ela está lá.

-Acha que ela machuca você intencionalmente, Ilgaz? -Ilgaz pareceu refletir e logo maneou a cabeça negando. Não, Ceylin jamais o machucaria intencionalmente.

-Ela nunca faria algo assim propositalmente.  -Admitiu.

Mesmo que entendesse a necessidade, todas as visitas de Ilgaz ao psicólogo eram contra sua vontade. Depois de semanas devastado, sem fechar os olhos e paranóico, resolveu que deveria procurar ajuda. As coisas se desenrolaram muito rápido após o inicio do tratamento, ele parou de ver Ceylin em todos os cantos e ouvir a voz dela. No fim daquele caminho, chegou a conclusão que era um oásis motivado pelo esgotamento físico e mental.
Mas ele ainda sonhava com ela voltando quase todas as noites, algumas vezes ia dormir mais cedo para mesmo que em sonho pudesse vê-la. Enquanto gritava e se despedaçava por dentro, conseguiu voltar a passar a imagem de sempre: o promotor forte e racional. Mas toda sua racionalidade parecia ter sido levada embora assim que ela voltou. O jeito como Ceylin mexia com ele não podia ser normal. Desde o início, do primeiro dia até hoje, as coisas que ela causava nele não tinham condições de ser normais.

Enquanto dirigia de volta para casa virou o carro em direção ao escritório de Ceylin. O escritório que costumava ser deles.
Não sabia se ela estava lá, não sabia se seria recebido, e se encontrasse com Cunneyt reuniria todas as forças para não enchê-lo de porrada, pensou. Uma risada escapou dele então, nunca esteve tão  parecido com Ceylin quanto agora.

A fachada do prédio estava um pouco diferente do que lembrava, a rua um pouco mais agitada. Olhou para as janelas e viu uma aberta, ainda não sabia direito o que foi fazer lá, mas já que estava iria até o fim.

Cunneyt acabara de sair e já tinha voltado para encher o saco, pensou ela enquanto marchava até a porta. Nem verificou o olho mágico, abriu a porta pronta para reclamar, e seu corpo teve a mesma maldita reação sempre que via aquele homem.

-Algum problema? -Clareou a voz ao perceber como a pergunta saiu falha. Ilgaz observou dentro, antes mesmo de perguntar se podia entrar.

-Aquele imbecil está aí? -Ceylin negou com a cabeça.  -Posso entrar?

-Cla-claro. -Saiu da frente permitindo que ele entrasse.

-Está bem diferente. -Sorriu analisando tudo. Ceylin sentiu os olhos arderem, só assim percebia o quanto ainda era sensível a tudo àquilo. -Ele trabalha aqui com você?

-Claro que não, Ilgaz.  -A rapidez da resposta o deixou curioso. -Aqui é só meu, não dividiria com ele.

-Não me dê satisfação.  -Esclareceu ele. -Responda se quiser, apenas.

Ela suspirou exasperante.

-O que você quer? -Perguntou impaciente. -Pediu para ser deixado em paz, eu deixei. Mas veja, você novamente na minha porta.

-Acabei de vir da terapia. -Ceylin abriu os lábios, sua feição preocupada se tornou evidente, e antes que pudesse dizer algo ele continuou. Parecia realmente interessado nos móveis novos. -Não, estou normal. Mas ele me fez pensar em algo que achei que deveria perguntar para você.

-Pergunte. -Incentivou.

-O que você fez foi para me punir? -Perguntou ainda de costas para ela. Suas mãos alisavam a mobília nova com muita atenção, não havia qualquer vestígio que um dia aquele lugar foi como um lar para eles. -Você foi embora para me punir?

-Desculpe? -Ele virou calmamente para ela e caminhou em sua direção. -As coisas não são todas sobre você. Fui por minha causa.

-E foi bom? -Questionou. Quando as mãos dele tocaram seu rosto ela fechou os olhos. Se fosse como os outros sonhos, não queria acordar. -Você ficou triste? Sentiu saudade? Você me a...

-Não diga. -Colocou o dedo sobre os lábios dele. -Tenho quase certeza que  se terminar essa pergunta irei odiar você.

-Eu tento buscar respostas todos os dias, Ceylin. Quebrei as coisas, troquei de cama porque a antiga lembrava você. Mandei queimarem o sofá, pintei as paredes e guardei suas fotos em uma caixa escondida. Parei de comer pilaf por quase dois anos, não fui mais ao mar porque ele me lembrava você. -Os olhos dele estavam cheio de lágrimas e suas mãos seguravam firme o rosto dela. -Nunca encontro essas respostas, mas sempre encontro você. Por quê, Ceylin? Me dê uma razão, mesmo que uma pequena razão, para que eu esteja tão fodido por você.

-Sinto muito, Ilgaz. -Lamentou. -Eu juro que teria ficado fora do seu caminho se soubesse de todas as coisas. Eu preferia uma vida sem te conhecer do que saber que faço você sofrer.

-Você consegue pensar em algum motivo para vida ser assim com nós dois? -Deu um sorriso triste para ela, Ceylin deixou escapar uma risada em meio as lagrimas. Ela balançou a cabeça negando, os dedos de enxugavam suas lágrimas.  -As vezes amor não é o suficiente.

-Não. -Concordou abraçando-o. -Mas não quer dizer que ele não exista.

-Eu precisava disso. -Aspirou o cheiro dela, que era como um calmante para sua mente. -Desculpa. Não incomodarei mais você.

Ele a soltou aos poucos, e indicou a porta dando a entender que já estava indo, mas antes mesmo que ele saísse do lugar Ceylin enlaçou a mão na dele.

-Você podia ficar. -Falou sem jeito, voltando a se aproximar dele. -Amanhã esquecemos tudo e voltamos pro zero.

-Isso não funciona com nós dois. -Ela sorriu concordando. -Nunca esquecemos tudo, nunca voltamos para o zero.

-Eu só estava, desesperadamente, tentando te fazer ficar. -Soltou a mão dele. -Ficaremos bem. Até amanhã, então.

-Até amanhã. 

SEE RED -IlceyOnde histórias criam vida. Descubra agora