FIRE MEET GASOLINE

C a p í t u l o. 43

Setembro de 2019 – Residência dos Di Laurence, Moulwalk City – EUA

Já fui em um velório.

Minha avó morreu quando eu tinha oito anos de um tumor no cérebro. Foi um sofrimento sem fim.

Felizmente Fire estava comigo naquele dia, ficou ao meu lado e segurou minha mão.

Assim como Sky.

Mal sabia eu que o próximo velório que eu compareceria seria o seu.

- Como você está? - Minha mãe pergunta enquanto ajeita minha gravata.

Não respondo.

Ela tem um vestido preto simples e os cabelos loiros presos em um coque.

Estou com o terno preto de meu pai, já que não tinha nenhum.

Nossa faculdade decretou uma semana de luto para que quem conhecia Daniel pudesse participar do velório.

O caixão vai estar fechado pelo o que me falaram.

Daniel se suicidou em sua casa, com a arma do pai. Ele estava sozinho e escreveu uma carta antes que tudo acontecesse.

Na carta ele pedia perdão a Deus.

Coisa que me surpreende, já que Daniel nunca foi religioso.

Também contava o que aconteceu na noite do baile de formatura, desde sua chegada, as bebidas, as drogas e o acidente.

Ele fez uma nota pedindo perdão a família Yue também.

Poucas pessoas sabem dessa carta, seus pais deixaram que apenas os mencionados na carta tivessem acesso a ela.

Para Fire ele escreveu: [...] "Para você que perdeu importantes pessoas em sua vida, sinto muito por ter causado tanta dor. Quando me contaram que você estava em coma, o alívio me preencheu e quando acordou, terror me consumiu. Não vou justificar o que fiz, porque fiz e como fiz, mas espero que um dia consiga me perdoar, sei que eu mesmo nunca o fiz."

- Você leu a carta? - Ela pergunta.

Assinto.

Minha mãe deixa a gravata como está e a apoia as mãos em meus ombros.

- Então você sabe que a decisão dele não tem a ver com você. - Ela completa.

Uma lágrima solitária escapa de meus olhos.

- Se eu não tivesse falado sobre isso, esse fantasma não teria voltado pra ele. - Digo entredentes. 

- Cas, - ela começa - Daniel sabia o que estava fazendo desde o momento em que entrou em um carro alcoolizado. 

- Eu devia ter percebido antes que ele estava mal. E quando eu percebi, devia ter ajudado e não acusado. - Há mágoa em minha voz. - Você sabia que ele fazia tratamento para depressão? - Pergunto.

Minha mãe assente.

- Vi ele no hospital umas duas vezes.

- Ele se matou porque eu disse que ia contar pra polícia. - Digo.

- Ele se matou porque não conseguiu suportar a culpa, Cas. - Ela fala. - Qualquer coisa pode ter ativado esse gatilho nele.

- E pode ter sido eu.

Sinto culpa, uma culpa que me consome.

Minha mãe me olha enquanto enxugo minhas lágrimas.

- O que dizia na carta sobre você? - Ela pergunta.

Para mim ele escreveu: [...] "A culpa nunca foi de Fire, a culpa sempre esteve dentro de mim. A possibilidade de perder você para ela me consumia. Eu o amo e você sabe disso, somos irmãos, mas eu sempre soube que se você descobrisse a verdade, essa irmandade seria perdida. No fundo fico feliz que você tenha escolhido ela, afinal, Fire é uma pessoa muito melhor do que eu. Isso não é sobre você, Cas, isso é sobre um peso que não aguento mais carregar. Sinto muito irmão, seja feliz e não a deixe escapar."

- Isso não é sobre você, Cas. - Ela repete minhas palavras. - Isso não é sobre você, ele mesmo disse. Agora você vai ao velório do seu melhor amigo, e vai chorar muito e vai se culpar por muito tempo. Mas as pessoas que estão lá vão estar na mesma situação. - Ela coloca a mão novamente em meu ombro. - E você vai precisar ser forte por todos. - Mamãe me abraça. - E principalmente por você mesmo.

- Você acha que a Fire vai ir? 

Minha mãe se afasta.

- Se ela não for, - ela diz - não a julgue.

Em um momento Fire desconhecia totalmente a origem dos boatos e as circunstâncias do acidente que matou a pessoa mais importante da sua vida, e no outro, ela é invadida pelo sentimento de ira por estar ao lado da pessoa, que causou a sua dor por tanto tempo, e não saber.

Não a vejo a dois dias, e sinto sua falta.

Quero abraçá-la.

Mas no momento, isso não é sobre mim.