Arrebatados

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Imaginei que vista de fora eu parecesse tão parado quanto uma estátua. Minhas mãos estavam entrelaçadas à minha frente, meu rosto estava sem expressão, minha respiração era demasiado superficial para fazer meu peito mover. 

Por dentro, eu girava como uma centrífuga, como se partes dos meus átomos estivessem invertendo a polaridade e se dispersando. 

Trazer Gabriel de volta não o salvara. Tudo o que eu podia fazer não era o bastante. 

O corredor diante do quarto estava cheio. Sam, Adam e Dean tinham voltado da sua incursão desesperada de mãos vazias. Uma caixa de isopor com gelo — era tudo o que eles tinham para mostrar após três dias arriscando a vida. Laila estava fazendo compressas e colocando-as na testa de Jack, na nuca, no peito.
Mesmo que o gelo baixasse a febre, que consumia fora de controle, quanto tempo ia durar até derreter? Uma hora? Mais? Quanto tempo até Jack estar morrendo novamente? 

Eu teria sido a pessoa a aplicar o gelo, mas não conseguia me mexer. Se me mexesse, eu me desfaria em fragmentos microscópicos. 

— Nada? — murmurou Doc. — Você verificou... 

— Cada lugarzinho em que pudemos pensar — interrompeu Adam. — Não é como os analgésicos, que muita gente via razões para guardar escondido. Os antibióticos ficaram à mostra. Não há mais, Doc. 

Sam apenas fitou o rosto avermelhado da criança na cama, sem falar.
Dean ficou ao meu lado. 

— Não fique assim — sussurrou ele. — Ele vai superar. Ele é forte. 

Eu não pude responder. Não podia sequer ouvir as palavras, na verdade.
Doc ajoelhou-se ao lado de Laila e puxou o queixo de Jack. Com uma tigela, pegou um pouco da água do gelo na geladeira e derramou devagar na boca do jovem.
Nós todos ouvimos o ruído áspero, doloroso, que Jack fez para engolir. Mas seus olhos não se abriram. 

Eu me sentia como se nunca mais fosse ser capaz de me mexer. Como se fosse me tornar parte das paredes de pedra.
Se eles cavassem um buraco para Jack no deserto vazio, teriam de me pôr dentro, também. 

Não foi o bastante, rosnou Gabriel. 

Eu estava desesperada, mas ele estava cheia de ódio. 

--Eles tentaram. 

Tentar não resolve nada. Jack não vai morrer. Eles têm de sair de novo. 

--Para quê? Mesmo que encontrem seus velhos antibióticos, quais as chances de ainda estarem bons? E, de mais a mais, só funcionavam a metade das vezes. Coisa inferior. Ele não precisa da
sua medicina. Precisa de mais que isso. Algo que realmente funcione... 

Minha respiração acelerou, aprofundou-se quando entendi.
É da minha que ele precisa, compreendi.
Gabriel e eu ficamos ambos espantados com a obviedade da ideia. A sua
simplicidade.
Meus lábios de pedra se romperam. 

— Jack precisa de remédios de verdade. Remédio de alma. É o que precisamos
arranjar para ele. 

Doc franziu o cenho para mim. 

— Nós nem sequer sabemos o que aquelas coisas fazem, como funcionam.
— Isso importa? — Uma parte da raiva de Gabriel estava passando pela minha
voz. — Eles funcionam. Podem salvá-lo. 

Sam me encarou. Eu também pude sentir os olhos de Dean sobre mim, e os de Adam, e de todo o restante do quarto. Mas eu só vi Sam. 

— Não dá para pegar, Cas— disse Bob, seu tom já de derrota. Desistindo. — A
gente só pode pegar coisas em lugares desertos. Há sempre um bando da sua espécie num hospital. Vinte e quatro horas por dia. Olhos demais. Não vamos fazer bem nenhum a Jack se formos apanhados. 

A Hospedeira/DestielWhere stories live. Discover now