Capítulo 32: Lorena

120 17 0
                                    

Nem lembro quanto tempo fiquei de olho naquela mesma janela durante o ano. Algumas vezes contemplando as árvores ao redor da escola, outras vendo a reforma no ginásio que tinha queimado. Também não serei hipócrita para dizer que não olhei Klaus de sunga quando o teto da piscina estava descoberto. Ele era gostoso, e de sunga ficava algo entre "misericórdia" e "valei-me senhor".

O fato era que eu estava me despedindo de mais um ano de escola, dos dois que ainda teria pela frente. Três se levarmos em conta que ter um bebê exigia mais tempo de mim do que eu poderia doar enquanto estudante assídua.

Pensar no bebe fazia meu estômago se revirar.

Eu ainda não havia decidido o que fazer com tudo isso. A melhor opção na minha cabeça era a adoção, mas então eu ia dormir com um travesseiro entre as pernas e acordava no susto quando, sem querer deitava de bruços, com medo de machucá-lo. Eu já tinha me afeiçoado a essa coisinha que crescia dentro de mim. Ele era valente e atrevido, e eu tinha certeza disso pela forma como ele tinha aparecido na minha vida, e pela quantidade de enjoos que me causava. Eu sabia que teria muito trabalho se ficasse com ele, mas meu coração dizia que eu sentiria muita saudade se eu o deixasse.

— Loren? — A voz de Rany me despertou. Ela estava segurando as baquetas da bateria e sorria para mim de uma forma delicada, pouco comum no rosto dela.

Rany havia terminado a escola, e ano que vem eu teria que me virar sem minha nova melhor amiga. Os planos dela consistiam em ir fazer faculdade na cidade ao lado. Ela queria ser professora de crianças, o que me surpreendeu bastante, já que ela não tem paciência nem para esperar os carros da frente andarem no sinal. Se ela não tivesse me falado dessa ideia antes de estar saindo com Samuel, eu diria que estava indo para a mesma faculdade só por causa dele, que iria cursar odontologia no mesmo lugar.

— Lou, você está ai dentro? — Rany brincou e eu levantei rápido, me apoiando na mesa para esperar a tontura passar. Ela segurou meu braço antes mesmo que eu pudesse protestar e dizer que estava bem.

— Estou bem, Rany. Só um pouco cansada. — Falei baixinho e sai do seu aperto preocupado, pegando minha bolsa e as chaves da sala em cima da mesa.

Rany me olhou por um tempo, e acho que decidiu que eu conseguiria andar sozinha quando eu sai pela porta e apaguei as luzes. Ficamos ambas do lado de fora olhando para a sala vazia e escura, até que ela puxou a maçaneta para mim, quebrando o próprio ciclo de coisas que estavam acabando.

Ela não se demorou no caminho para sair da escola. Minha amiga era daquelas que arrancavam de vez o curativo. Ela não sabia tratar o sofrimento de modo cauteloso. Era agressiva e selvagem, exatamente como eu costumava ser antes de ter Klaus e um bebê revirando minha vida.

Eu pegaria uma carona com Rany para casa. Klaus tinha me proibido, usando Adônis de porta-voz, de dirigir para qualquer lugar que fosse sozinha. Então eu havia passado a última semana reversando entre os carros de Rany, Tony, Débora e de Adônis. Klaus inventou uma história de que eu estava doente e não podia dirigir, e então eles colaboravam com caronas. Se dependesse de Klaus, ele mesmo faria todo o percurso que eu precisasse. Mas ele estava respeitando o tempo que eu havia pedido, além de que ele parecia neurótico com coisas ligadas a segurança, e a moto dele não era segura o suficiente para mim e o bebê. E eu simplesmente me deixei levar por aquela história babaca porque não estava muito afim de bater de frente com Klaus. Eu já não sabia mais nem quem eu era.

— E ai. — Rany começou a falar, atenta a estrada. — Você decidiu o que vai fazer? O prazo que Klaus deu vence hoje, não é?

Ela foi cautelosa com as palavras, provavelmente com medo que eu explodisse. Mas naquele momento eu só queria minha cama, me enroscar com meu travesseiro, e desligar o telefone para Klaus me dar até amanhã. Seria uma noite complicada.

A Mais Bela MelodiaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora