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O dia da reunião de ex-alunos enfim chegou. Foi numa manhã de sábado muito ensolarada. Depois de pensar bastante, decidi encarar mais esse fantasma da minha vida. E lá estava eu diante do portão da Machado, a um passo de voltar ao passado. Não me produzi, porque se as coisas dentro de mim ainda não tinham se curado, eu não poderia aparecer de outro jeito a não ser o meu de sempre. Com meus tênis, calça jeans e camiseta. Rabo de cavalo e óculos de grau de armação escura. Qualquer outra maneira de me vestir, para ir até lá, seria uma fantasia. Os pelos dos meus braços se arrepiaram assim que botei os pés ali. Minha respiração ficou ofegante, como se eu tivesse acabado de correr uma meia maratona. Fechei os olhos por alguns segundos e escutei as vozes vindas dos corredores vazios. Cerrei as mãos, apertando com muita força os punhos. Buscava coragem para seguir em frente. Tremendo, dei o primeiro passo para dentro do colégio. E em meio ao ar quente, que tocava a minha pele, senti um frio na espinha. Uma gélida fisgada que se espalhou por todo o meu corpo rapidamente.

— Quem diria que algum dia eu voltaria aqui? — Observei o prédio, que frequentei por longos 7 anos. — O tempo fez bem a você, Machado, não sei se foi tão generoso assim comigo.

O prédio passara por uma boa reforma. O portão não era mais o enferrujado; aquele que depois de muitas demãos de tintas de tons diferentes, já não tinha uma cor definida, era apenas um borrão de ferrugem. Agora ele ostentava um azul-marinho uniforme e luminoso. No lugar dos pedriscos sobre a terra vermelha, um gramado com plantas nativas do cerrado. As janelas das salas pequenas e gradeadas, bem diferente daquelas espaçosas de madeira, nas quais os alunos se sentavam com as pernas esticadas, na época em que eu estudava ali. E que os meninos ficavam pulando de um lado para o outro. No corredor da entrada, alguns funcionários conversavam algo sobre o capítulo da novela da noite anterior, alguns criticavam as falcatruas da vilã, já outros a defendiam com unhas e dentes. Nenhum deles era daquele tempo, nenhum deles tinha uma fisionomia familiar para mim. Eles deviam estar por ali para dar suporte ao encontro de ex-alunos, pois no final de semana a escola ficava fechada.

No canto do lado de dentro do portão, no qual ficava o moço que vendia balas de coco com caramelo, havia um banco de concreto, com uma pintura de um tabuleiro de xadrez. O piso já não estava mais tão escorregadio e apresentava uma cor mais clara. Não era nada parecido com o cinza chumbo do passado. As paredes que eram divididas ao meio, metade azul e metade branca, agora estavam cobertas por um tom amarelado, de gema de ovo. Caminhei pelo corredor, sem reconhecer aquele lugar. As salas estavam diferentes. A biblioteca estava maior, o dobro do tamanho, com um anexo de um laboratório de informática. As luzes mais fortes e claras, o que facilitava com certeza a leitura dos estudantes, antigamente eu passava horas na biblioteca, na mesinha próxima da enorme janela dos fundos. O local ideal para usufruir do ventinho que vinha do balanço dos galhos das árvores do lado de fora e para conseguir uma iluminação mais adequada para fazer as minhas leituras. Ainda assim meus olhos doíam, minha cabeça doía também. Forçava muito a vista. Era em meio aos livros que eu me escondia, ou tentava me esconder, de todo o caos que aquelas agressões provocavam em mim. Os livros me levavam para longe daquele lugar. Eu podia estar em OZ ou na Terra do Nunca ou em qualquer reino que eu quisesse estar longe de tudo e todos. A janela continuava no mesmo cantinho, só um pouco menor, mas a minha mesinha de leitura não estava mais por ali.

A Menina do CasuloOnde histórias criam vida. Descubra agora