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2017.

Exausta. Estava muito cansada. Sabe aqueles dias que você deseja muito ter um clone ou um robô programado para fazer as coisas no seu lugar? Para mim, aquele fora um desses dias. Mesmo desejando chegar a minha casa e desmaiar na cama, decidi dar uma passada antes no hospital, onde a prima da minha sócia estava internada. Assim que transpus a recepção, o estômago embrulhou. Respirei fundo e segui até a mesa de informações. A atendente ligou para o quarto e logo Gabi apareceu a passos lentos, por uns dos corredores, vindo até a minha direção. A sua cara não era das melhores, os olhos inchados deixavam claro que ela chorou.

— Oi! Que bom que você veio — disse Gabi com a voz embargada.

— Oi! Como ela está? — Eu perguntei, dando um abraço na minha amiga, em um daqueles momentos em que me desarmava.

Sentamos num sofá de cor clara, próximo ao corredor de onde ela veio. Com semblante caído, Gabi contou que a prima passaria por uma intervenção cirúrgica naquela noite. Mas que não corria risco de morte. Ao contrário do motorista que, além de bêbado, estava sem o cinto de segurança e foi arremessado para fora do carro. O cinto foi à salvação da sua prima. O corpo do rapaz fora encontrado já sem vida, próximo do local do acidente. Ele, infelizmente, fez uma combinação fatal: estava alcoolizado, sem cinto, em alta velocidade, numa estrada escura e esburacada. Triste fim.

Gabi perguntou como me saíra sozinha na confeitaria. Disse que sem muitos problemas graves e que contara com o auxilio de Théo. Finalmente vi um sorriso se formar no seu rosto, num leve arquear de seus lábios. Essa não era a melhor hora para falarmos sobre o que aconteceu entre o gaúcho e eu. Ela pediu para que eu segure as pontas, sozinha, mais um pouco. Gabi ajudaria a tia a cuidar da prima por mais uns dias.

— No máximo em uma semana estou de volta.

Assenti. Despedimo-nos com outro abraço e desejei melhoras a sua prima. Enquanto Gabi voltava para o quarto, ouvi uma conversa entre duas enfermeiras sobre a notícia de uma jovem que morreu na capital por complicações num pós-operatório de uma lipoaspiração, feita numa clinica não autorizada para esse tipo de procedimento cirúrgico. Pensei em como a busca por um padrão de beleza imposta pela sociedade pode não só cegar as pessoas como deixá-las extremamente expostas ao perigo. Eu mesma já passara pelas mãos de médico açougueiro que só queria embolsar mais dinheiro na sua conta bancária e me operaria até dentro de um galinheiro ou de um bueiro.


2002.

As pessoas de modo geral têm certo pavor de dentista. Eu não. Um dos meus sonhos durante toda a infância era ir a um consultório de um ortodontista. Que maluca! Quem sonharia com isso? Pois é... Eu. Mas, foi somente aos 14 anos que eu consegui realizá-lo. Fiquei muito animada, finalmente, eu colocaria o aparelho nos dentes. Algo que me parecia muito distante até então, devido a nossa limitação financeira. Ainda bem que tive acesso a um fonoaudiólogo numa ação social e ele meio que me apadrinhou. Já na adolescência os meus dentinhos de leite já haviam dado lugar aos permanentes. E eles tinham nascido até mais tortos que os anteriores. Eu tinha o tal de apinhamento dentário. Que isso senhor? Nomezinho estranho mesmo. Traduzindo: alguns dos meus dentes eram inclinados para frente, os meus incisivos centrais superiores — aqueles dois dentes grandes do meio, os dentões de coelho que se destacam quando sorrimos — eram projetados para frente e torcidos formando um triângulo com suas pontas, além de outros que eram encavalados. E ainda tinham dois dentes permanentes que haviam nascido no céu da boca. É! Os de leite deram lugar a outros inquilinos. Eu não sorria porque tinha vergonha dos meus dentes. Quem não teria? Quando não resistia a uma boa gargalhada eu sempre colocava a mão na frente da boca.

A Menina do CasuloWhere stories live. Discover now