4 | Siete Horas _ Bebe

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07h. Amaya levantou-se.

07h30. Solano despertou e Amaya saiu.

08h. Piro acordou e Solano saiu.

08h30. E Clara ainda permanecia dormindo.

Piro fez a primeira tentativa do dia de falar com Mika. O telefone chamou por cinco vezes e foi desviado para a caixa postal. Tomou um banho e desceu para tomar café. Não havia nada sobre a mesa. Aquela casa precisava de uma empregada, pensou Piro. Comeu um pouco de cereal matinal e tentou ligar novamente, sendo mais uma vez em vão. "Onde estaria Mika?", se perguntou. Passaria mais tarde na casa dela, depois de fazer umas pesquisas na biblioteca.

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Amaya já tinha ligado para Paloma, que pediu para que o encontro fosse realizado no Parque de los Patricios, onde tomariam café. Um local estranho para um treinamento, Amaya imaginava.

Em poucos minutos estacionou seu Jaguar preto na entrada do parque e encaminhou-se para o devido ponto, onde de longe pôde avistar uma loira, sentada sobre uma manta verde-caqui, com pernas cruzadas, e que olhava atentamente para a tela do seu notebook. Aproximou-se.

— Olá. Bom dia, Paloma!

— Lindo dia se faz hoje. Eu estava precisando renovar minhas energias perto da natureza. Sente-se e me conte como passou a noite.

— Incrivelmente consegui dormir. Eu estava muito elétrica, pensei que demoraria...

— Está lindo! — disse Paloma interrompendo a voz de Amaya. — Seu cabelo ficou ótimo! Como está se achando?

— Na verdade, nem tive tempo ainda de me sentir loira, mas logo estarei adaptada ao novo visual.

— Entendo. Foi uma mudança súbita — tirou o olhar do cabelo da nova contratada e voltou para a pequena tela. — Eu trouxe algo para comer. Está nessa bolsa. Coma algo para iniciarmos o treinamento.

Paloma era uma mulher muito atenciosa, tinha elegância e simplicidade ímpares. Passaram horas a fio conversando, olhando dados no computador e contemplando a beleza do lugar.

Amaya fez muitas anotações, pois tinha toda a atenção voltada às instruções de Paloma. Decidiram ficar ali até por volta do horário de almoço.

O sol cintilava sobre todo aquele verde dos jardins, mas poucos aproveitavam toda aquela beleza.

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Depois de ter folheado muitos livros, Piro decidiu que era a hora de sair da biblioteca e ir procurar um local para almoçar. Já acomodado a uma mesa do restaurante resolveu fazer mais uma tentativa de ligação para Mika, mas não conseguiu. Terminou de comer, entrou em seu Pegeout 504, azul, e dirigiu até a casa da namorada. Ao chegar lá viu que não havia sinal de pessoas na casa. O jardim parecia mais abandonado do que da última vez que ele estivera por lá. Para onde teriam ido? Porque Mika não o avisou? Aquilo ficou martelando em sua mente. Pulou o pequeno muro e, olhando pela janela, teve a confirmação de que a família tinha abandonado o lar. Sentiu o rasgar da angústia percorrendo o seu íntimo. Aquilo não poderia ser verdade. Sentou-se na grama acobreada, fazia dias que não caia uma gota de água naquele chão. Permaneceu de cabeça baixa por uns dez minutos. Já tinha percebido que aquele namoro não estava indo muito bem, mas aquela fuga era demasiadamente pesada para ele. Ser abandonado, sem ao menos um último adeus. Ninguém consegue aceitar essas condições facilmente.

Só restava a ele agora esperar notícias, ia tentar voltar para a biblioteca e continuar a pesquisa.

Por volta das catorze horas estacionou o carro em frente à biblioteca. Estava sem ânimo para estudar, mas precisava fazê-lo, pois tinha aquilo como um propósito. Sabia que não seria fácil descobrir a cura de uma doença tão estudada há anos, mas teria de fazer aquilo em memória de Bold. Até o último dia de vida iria buscar a cura para aquela terrível devastação corporal. Piro entrou nessa fantasia para aliviar um pouco todo o remorso que carregava como uma valise estimável.

Pegou alguns livros na prateleira e procurou um local onde pudesse se sentar. Em um canto tinha um sofá vazio e era perfeito. Sentou-se, colocou os livros sobre a pequena mesa que ostentava um pequeno vaso com flores e algumas revistas. Acomodou-se e pegou um livro, abriu e leu por não mais que dois minutos, pois não conseguia tirar Mika da cabeça e o porquê da fuga inesperada. Fechou o livro e o jogou de lado no sofá. Tanta coisa na cabeça o perturbava, era a falta de trabalho, a morte de Bold e agora o sumiço de Mika. Encostado naquela posição ficou divagando. Navegando o olhar por toda a extensão da biblioteca, via pessoas sorrindo, outras concentradas, não havia muita gente por ali, todavia, só ele parecia estar atordoado. Voltando o olhar para as revistas sobre a mesinha, suspirou, esticou-se e puxou uma. Curiosamente aquela publicação traria um norte para Piro. Ficou folheando a revista, prestava mais atenção às imagens que aos textos. Por um segundo seu olhar foi atraído para uma pequena nota no canto da página que dizia:

Cientistas da Pensilvânia estavam próximo da descoberta de um tratamento de cerca de 90% dos Cânceres. Pois todas as formas de câncer tinham algo em comum, uma enzima chamada telomersae. Essencial na proteção do DNA durante a replicação das células, a telomersae ajuda no crescimento até a fase adulta e então para de funcionar. Nos pacientes com Câncer a telomersae é religada, o que causa o crescimento celular descontrolado. Contudo, após um estudo, decodificou-se a possibilidade de se encontrar uma molécula capaz de neutralizar os efeitos danosos.

Piro passaria alguns dias ainda refletindo sobre o texto sem saber como agir. Já saindo com o carro do estacionamento notou que o combustível não era eterno, precisava pegar mais dinheiro com o pai. Não suportava mais essa dependência, precisava ter sua própria renda.

O sol já se colocava em ponto de fuga. Logo seria noite e Piro queria chegar à sua casa para dormir e esquecer todos os problemas que lhe sugavam as energias. Cruzando todas aquelas avenidas, olhando aqueles prédios, Miramar tinha suas belezas, mas imaginava o porquê de aquela cidade ser tão parada. De vez em quando, tinha vontade de ir morar na capital, Buenos Aires. Miramar se fazia tão restrita às vezes. A vontade de ir para uma cidade mais agitada, ocasionalmente, o fazia pensar em abandonar toda a vida pregressa ali. Não sentia ter raízes naquele local, nada o prendia, não tinha amigos e agora nem mesmo uma namorada.


E o céu de Miramar?Onde as histórias ganham vida. Descobre agora