003 - Atônita

73.2K 5K 883
                                    

Atônita: confusa, perturbada, tonta

Foi assim que Gwen ficou com as novidades que o médico trouxe

 

- Que bom ver que o casal já está feliz – disse o médico ao entrar bem humorado no quarto, passando por alto a expressão de horror no rosto do Gwen.

Casal? Como casal? Era casada? Em que ano estava?

- Que bom que acordou senhorita, o rapaz já estava morrendo de preocupação – continuou o sorridente médico.

Esperem! Até onde Gwen se lembrava, preocupação em relação a ela era algo inexistente. Muito menos de um homem, menos ainda se considerarmos um homem como esse. Não era autodepreciação ou algo do tipo, simplesmente sabia se por em seu lugar.

E enquanto ele perguntava ao médico sobre o resultado dos exames, quando ela receberia  alta e esse tipo de coisa bem simpática, parecia mesmo estar preocupado. Mas ainda assim aquela situação era um pouco inacreditável aos olhos de Gwen.

- Os resultados em geral deram normais. Foi só um susto, senhorita LaDonne. Porém foram feitos alguns exames que só sairão o resultado daqui a alguns dias. Peço para um de vocês que venham aqui buscar. Fora isso, a senhorita já pode se levantar e se arrumar para ir embora. Está liberada.

E imediatamente vieram as mãos enormes daquele desconhecido a ajudando a se levantar e a guiando ao banheiro. Aceitou o apoio porque no momento em que se levantou, notou que tinha dores em alguns lugares do corpo, mas definitivamente não sabia como agir com aquelas mãos segurando seus ombros.

Suas roupas que estavam no banheiro e eram ainda o uniforme do Colégio Santa Tereza. Sujos e com ocasionais manchas de sangue, mas ainda assim, não se lembrava de nenhum momento em que se sentiu tão feliz em vesti-los. Era impossível estar casada, porque oras, ninguém se casa durante o curso do Ensino Médio. É inverossímil.

Mas de um jeito ou de outro isso ainda não respondia quem era o tal homem que estava no cômodo ao lado. Muito menos o status atual da relação deles dois.

Quando ouviu o médico sair também saiu do banheiro, sua intenção era descobrir de uma vez por todas quem era aquele homem. Entretanto...

Quando abriu a porta o homem voltou a sorrir pra ela, como se estivesse feliz em vê-la. E aquilo a deixou sem fala, o que era bem estranho, porque geralmente em situações de nervosismo era quando falava de maneira irrefreável.

- Vamos? – falou ele entusiasmado lhe oferecendo a mão.

Gwen sorriu com amabilidade e o acompanhou, sem aceitar a mão que lhe foi oferecida, pois claro, ainda tinha muitas dúvidas da procedência do cara. Caminharam tranquilamente até um carro muito bonito, um modelo esportivo vermelho. E durante todo o trajeto até o carro, Gwen tentou reunir uma boa quantidade de coragem para fazer certas perguntas que borbulhava em sua cabeça. Talvez as perguntas o ofendessem um pouco, mas ela não tinha culpa se provavelmente estava sofrendo de amnésia.

E ao entrar no carro, a coragem cresceu, juntamente com a apreensão. Então teve que dizer:

- Bom, é... Não quis dizer na frente do médico porque talvez ele não me deixasse sair de lá. Na verdade, eu me lembro de quem eu sou, de onde estudo, da minha família. Mas ainda me sinto estranha e dolorida, mas isso não vem ao caso o que eu queria dizer era que, por alguma estranha razão eu não me lembro de você.

- Estranho seria se você se lembrasse de mim – disse ele olhando para ela enquanto dava partida no carro, o rosto dela mostrava tanta confusão que ele soube que teria que contar a história completa, sem omissões de detalhes culposos – na realidade, não nos conhecemos.

A primeira reação dela foi por a mão na maçaneta da porta. A dele, por sua vez, foi travar a porta. E enquanto ela lutava para abrir a porta sem nenhum sucesso, ele tentou fazer uma explicação convincente.

- Primeiramente, me chamo Justin e muito prazer – mas sua educada apresentação foi interrompida pelas reflexões ensandecidas de Gwen.

- Você é um seqüestrador, não é?  Sim, claro que é, com um carro tão bonito, só pode ganhar a vida na bandidagem. Por que eu me deixei levar por minha confusão e amnésia imaginária? Agora minha vida vai ser tirada, porque eu, senhor seqüestrador, não tenho muito dinheiro. Só o que sobrou de minha mesada, que é bem pouco, por favor, me deixe fugir eu não vou te dar muito lucro.

Justin começou a andar com o carro achando-a um tanto desequilibrada. No entanto, ela realmente tinha lá seus motivos. Sendo assim, mesmo com ela falando pelos cotovelos, resolveu explicar-se.

- Não sou seqüestrador e não quero roubar seu dinheiro, não se preocupe com isso. Mas eu realmente não me portei direito com você. E talvez você ainda queira fugir, mas bom, eu não quero te fazer mal, não mais do que eu já fiz. Bom, não tem jeito fácil de dizer isso. Foi por minha causa que você foi parar no hospital, eu meio que te atropelei e desculpa por isso.

Por dois segundos, ela só olhou para ele sem conseguir dizer nada, mas depois desses dois segundos...

- Ah, então foi isso! Sim, eu me lembro de algo esbarrando em mim, algo bem grande que me fez cair de um jeito bem doloroso. E a partir daí já não me lembro de muita coisa. Só de acordar no hospital – Gwen falava desesperadamente, uma frase atropelando a outra, e se arrependia de cada uma delas depois que falava, estava difícil controlar o fluxo de palavras. Sabendo que estava trancada em um carro com um atropelador. Um atropelador muito bonito, diga-se de passagem. E que ela ainda ousou pensar que ele tinha algo a ver com ela, que embaraçoso.

- Sim, este fui eu esbarrando em você, na verdade, meu carro. Mas eu não tive intenção, claro que eu não tive intenção de atropelar ninguém. Mas você apareceu do nada, ou eu não te vi.

- Não é a primeira vez que isso acontece, fique tranquilo – disse Gwen com uma calma não muito típica de quem acaba de descobrir sobre um atentado à sua vida.

- Já foi atropelada antes? – perguntou Justin abismado.

- Não me referi a isso, mas não é nada. – disse a menina sorrindo, mas seu sorriso não demonstrava nenhuma alegria.

E Justin começou a se perguntar como podia alguém sorrir um sorriso triste.

Depois disso, a menina não disse mais nada. E eles subiram pela escura estrada da serra em profundo silêncio. Ela roendo as unhas e ele ainda filosofando sobre sorrisos.  O que já estava se tornando um tanto ridículo, mas ele não se reprimiu e continuou analisando os sorrisos e todo o mistério que aquela menina tinha.

Já Gwen estava impaciente, se controlando ao máximo para não se desculpar ou retirar tudo o que disse. Ela já estava acostumada com esse sentimento de insegurança e geralmente, sabia como controlá-lo. Só que infelizmente naquele dia específico, ela não estava tendo o sucesso esperado.

Que azar.

Invisível (PRÉVIA)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora