Juliano para de falar e me encara, fazendo com que eu perceba que estou calada - e com os olhos fixos na boca dele - há tempo demais. Pigarreio.
- Rum, eu...desculpa, tô meio distraída hoje. O que você tava dizendo? - Ele para o carro no sinal vermelho.
- Que adoraria pintar todas as paredes da minha casa de verde limão. - Meu amigo ri. - Você não tá prestando atenção, né? Tô sendo chato?
- Não, você nunca seria chato. - Coloco a mão sobre a coxa dele, e uau, como ela é dura! - Eu é quem tô com sono, e...pra onde estamos indo, mesmo?
- Vista Alegre. A minha casa é em um condomínio perto do parque Tingui.
- Não conheço o Tingui, mas fui no Barigui e no Bosque Alemão. A quantidade de parques aqui em Curitiba é impressionante.
- Os curitibanos adoram parques, Kellyzinha, e eu não sou exceção. A pista de corrida do Tingui, especificamente, é muito boa.
- Confesso que eu tava esperando que a sua casa fosse no Batel ou no Bigorrilho...
- Vi muitas casas no Batel e em outros bairros nobres, mas nenhuma me interessou, sabe? Acabei me apaixonando pelo lote de Vista Alegre e contratando a Cris pra fazer o projeto. Ela é ótima.
O sinal abre e Juliano para de falar, colocando o carro em movimento enquanto eu tento, desesperadamente, não parecer estar irritada e com ciúme - o que, aliás, estou. E muito.
Porra de arquiteta!
- Ótima é o meu pau de óculos - resmungo para mim mesma, baixinho, e pergunto: - A obra termina quando?
- Em mais ou menos seis meses, mas eu não tô com pressa. Morar na casa dos meus pais não é tão ruim.
- E você, hum...nunca saiu de lá? - questiono, hesitante.
- Saí, sim, mas voltei há quatro anos.
- Por quê? - Quase roo as unhas de tanta curiosidade.
- Porque eu saí do apartamento em que eu morava com a minha noiva bem no meio da noite e não quis ir pra um hotel - ele despeja, mantendo os olhos fixos na rua. - Estávamos juntos há três anos e a uma semana de casarmos, a Cecília não te disse?
- Ela disse que você tinha sido noivo, sim, mas não deu muitos detalhes. Eu sequer sabia que vocês moravam juntos ou que romperam uma semana antes do casamento.
- E o motivo do rompimento, você sabe? - Paramos em uma portaria elegante e Juliano se identifica.
- Não. - Balanço a cabeça.
O portão se abre e nós acessamos o condomínio; entretanto, eu estou tão tensa que não consigo prestar muita atenção às ruas e casas impressionantes.
- Eu a peguei no flagra, Kelly. Me traindo. - Meu amigo ri sem humor algum. - Fernanda tava na cama com o Ricardo.
- Como assim ela te traiu com o seu próprio irmão, Juliano?! Puta que pariu! - quase grito, chocada. - E o Ricardo, como ele pôde...?!
- Na verdade o meu irmão não teve culpa, ele acordou com a Fernanda em cima dele e gritou. Eu tava no quarto do lado e os gritos dele me acordaram também.
- Mas...mas...
- Esquece, Moranguinho, passou. - Juliano apoia uma das mãos no meu queixo e acaricia a minha bochecha com o polegar. - Saí de casa e vendi o apartamento assim que pude pra não ter nada que me lembrasse dela, sabe?
- Eu provavelmente faria a mesma coisa - digo, hipnotizada pelos olhos azuis nos meus e pelo carinho que ele continua a fazer no meu rosto, próximo demais da minha boca. - Sinto muito, Juliano. Muito mesmo.
- Não precisa sentir, eu fiquei bem. Sempre fico. - Ele abre o cinto de segurança. - Vamos? A Cris tá esperando a gente.
Ele abre o meu cinto também e sai do carro, cumprimentando uma morena alta e bonita que está na frente da construção. Percebo, imediatamente, que a casa é muito grande.
- Quantos metros quadrados a casa tem? - pergunto, olhando para o telhado triangular. - Parece ser enorme...
- Seiscentos - é a morena quem responde, estendendo a mão. - Oi, eu sou a Cris. A arquiteta.
- Kelly. Amiga do Juliano. - Aperto a mão que ela me estende.
- Namorada mudou de nome agora, Ju? - Ela olha para o irmão de Ricardo e ri, divertida. - Porque amiga dando palpite em projeto eu nunca vi...
- Eu não namoro, Cris, esqueceu? Eu e a Kelly somos apenas amigos - ele frisa.
- É uma pena, vocês seriam um casal bem bonito. - Ela suspira. - Vamos entrar pra eu mostrar a casa à Kelly e decidirmos os pisos e os revestimentos?
Assinto com um movimento de cabeça, tão vermelha quanto um tomate, e passamos quase três horas escolhendo pisos para os cômodos e revestimentos para os banheiros e cozinha. A casa é um sonho: quase toda em conceito aberto, tem 5 suítes com banheira e chuveiro mais dois banheiros para as visitas, sendo um na área gourmet perto da piscina coberta e aquecida. Há ainda uma jacuzzi na suíte master, um solário, um escritório com biblioteca, um salão de jogos e um jardim.
- Vocês fizeram bem escolhendo o piso laminado pras áreas que não são molhadas. É muito adequado pro frio de Curitiba e a manutenção e troca são simples - ela aprova. - Também gostei dos revestimentos e do porcelanato das áreas molhadas. Faremos o tratamento antiderrapante nos banheiros e na cozinha. - Ela olha para o relógio. - Olha a hora, eu tenho que ir. Prometi almoçar com a minha esposa.
- Pode ir, Cris, não quero que a Cassandra brigue comigo. - Ele sorri, mostrando as covinhas nas bochechas. - Muito obrigado mesmo por vir hoje.
- Não foi nada demais, Juliano. Cassandra e eu gostamos muito de você. - Cris beija o meu amigo na bochecha e me encara. - Foi ótimo conhecer você, Kelly, espero te ver mais vezes.
- Duvido muito, mas obrigada. - Dou um sorriso envergonhado.
Ela se aproxima e beija a minha bochecha também, aproveitando que Juliano está distraído para sussurrar:
- Você vai namorar o Juliano e nós nos veremos bastante. Pode acreditar.
Coro que nem um tomate outra vez. Meu amigo ri.
- Caralho, Cris, o que você disse pra deixar a Kelly tão vermelha?! Esqueceu que é casada e deu em cima dela na cara dura?!
- Claro que não, Ju, eu nunca esqueceria a Cassandra ou furaria o seu olho. - A morena pisca. - Eu tava agradecendo pela ajuda, e...nossa, eu tenho que ir! Beijo!
Rio enquanto ela sai correndo.
- A Cris é muito engraçada - comento.
- É, sim. Nos conhecemos desde crianças, éramos vizinhos.
- Então ela também é multimilionária? - brinco. - Achei-a tão simples...
- Sim, ela é. - Ele se aproxima. - Gostou da minha casa?
- Claro.
Penso em dizer que a casa é tão linda quanto o dono, mas Juliano continua a se aproximar e eu acabo perdendo a voz quando ele coloca as mãos na minha cintura. Olho para cima e o encaro, querendo...não, precisando ser beijada o quanto antes.
Deus, é uma...
- Tortura - o irmão de Ricardo completa, fazendo-me perceber que, droga, eu havia pensado alto outra vez. Ele esfrega o nariz no meu pescoço. - É uma tortura sentir o seu cheiro e estar tão perto de você, Kelly.
- Por quê? - a pergunta sai tão baixo que eu quase não escuto.
- Porque eu não posso fazer o que você tá pedindo.
- Não lembro de ter pedido nada, Juliano. - Volto a encará-lo, emburrada.
- Não pediu mesmo, Kellyzinha...não com palavras. Os seus olhos, entretanto...
- Rum - pigarreio, o sangue do meu corpo inteiro bombeando nos meus ouvidos. - E o que...o que os meus olhos tão pedindo? - gaguejo, umedecendo os meus lábios com a língua.
- Ah, você sabe, Kelly. Eles tão me pedindo pra te beijar. - Juliano me solta abruptamente e se afasta. - É uma pena eu não possa.
Inspiro fundo para tomar coragem.
- Não pode ou não quer?
- Eu até poderia dizer que não quero, mas seria mentira e eu prometi que não mentiria pra você. Eu quero sim. - Ele suspira. - Me sinto muito atraído por você.
Meu coração dá um salto dentro do peito.
- Então me beija... - peço, segurando-o pelo braço.
- Não posso. Primeiro porque eu não quero me meter entre você e o meu irmão, e segundo...
Espero-o terminar a frase por alguns segundos, e ar que nos envolve se torna tão denso que poderia ser cortado com uma faca. Insisto:
- Segundo...?
- Segundo que nós estamos sozinhos aqui, e, se eu te beijar, posso me sentir muito tentado a tirar algumas outras virgindades suas no chão sujo.
Amado?!
-
Todo mundo me odiando em 3, 2, 1...
Beijo e por hoje é só! Dani.