- 𝘼𝙉𝙏𝘼𝙍𝙀𝙎; (𝘮𝘪𝘯𝘴𝘶...

By godhannie

65.8K 8.7K 16.9K

[COMPRE O LIVRO FÍSICO EM https://www.luoeditora.com/produtos/antares-aqueles-que-nao-tem-perdao-em-producao... More

AVISOS
Prólogo | I can't forgive and I can't forget
001
002
003
004
005
006
007
008
009
010
011
012
013
014
015
016
LIVRO FÍSICO CONFIRMADO
017
018
019
020
021
022
023
024
025
026
027
028
030
031
032
033
034
035
036
037
038
039
040
041
AGRADECIMENTOS + LIVRO FÍSICO
PRÉ-VENDA ABERTA!!!!!!!

029

888 106 192
By godhannie

— Ficou bom? – perguntei a Jisung.

Ele tocou do até o e sorriu como uma criança feliz. Pra ser sincero, não achei que Mingi ia ter sucesso consertando um teclado, mas agora me sinto mal por ter duvidado. Se não fosse por ele, Jisung ainda estaria triste e eu desesperado tentando arrumar.

— Ficou ótimo – seus olhinhos ficaram pequenos com o sorriso enorme – Obrigada, obrigada!

Ele me puxou pra dar beijinhos na minha bochecha e lábios, e eu retribui com mais beijos e um carinho no seu rosto.

— Vou compôr uma melodia hoje – ele disse – Uma só pra nós dois.

— Pra nós dois? – perguntei surpreso e lhe dei um beijo na testa – Mal posso esperar pra ouvir.

— Minho! – ouço Gahyeon me gritar da sala de estar, e deixo um beijo no topo da cabeça de Jisung pra me despedir.

— Eu já volto – disse e ele assentiu.

Fechei a porta do seu quarto e fui até a sala onde Gahyeon está, confesso que até parei de andar quando vi quem estava parado na porta conversando com minha irmã. Sinto o mesmo aperto no coração ao vê-lo outra vez, as palavras que ele me disse no posto de gasolina me machucaram tanto que eu acho que nunca vou me recuperar totalmente.

Gahyeon me olhou, nosso pai continuou parado e nem sequer me cumprimentou. Não esperei que fosse diferente, mas ver que ele não se esforça nem pra parecer educado me dói um pouco.

— O papai vai embora hoje – ela disse.

Não sei o que Gahyeon espera que eu diga, quando viemos pra Coréia nossos pais nem me abraçaram direito na hora de se despedir. Eu não sei porque ele se deu o trabalho de vir aqui, foi só pra me fazer perder o emprego e voltar a ter controle sobre mim. Preferia que ele nunca tivesse saído da China.

— Boa viagem – me curvei brevemente, sem saber o que dizer ou fazer.

— Ele me pediu pra acompanha-lo até o aeroporto – Gahyeon me olhou apreensiva – Ia te pedir pra ir com a gente.

Fizemos um trato quando viemos morar na casa de Sicheng, eu e Gahyeon sairíamos pro trabalho e pra faculdade, e caso tivessemos que ir pra outro lugar só iríamos na companhia um do outro. Eu não obedeci muito bem esse trato, acabei indo atrás de consertar o teclado de Jisung e pagar minhas dívidas no banco sozinho, mas acredito que Gahyeon fez sua parte pois o trauma que ela carrega de Xiaojun é muito maior que o meu.

Eu não quero ir, mas nós dois nos comunicamos com o olhar e sei que ela está me pedindo isso pois sente medo de voltar sozinha do aeroporto até aqui. Eu poderia dizer a ela pra deixar nosso pai ir sozinho, mas a relação dos dois é diferente, meu pai realmente a ama e minha irmã apesar de tudo tem um carinho enorme por ele. Se eu tivesse um pai que me amasse, eu também ia lhe acompanhar pra onde ele quisesse, por isso não julgo Gahyeon em nenhum momento.

— Tudo bem – digo contra a minha vontade, mas pensando no bem estar dela – Eu vou pra que você não volte sozinha.

Vi meu pai rir disfarçadamente com ironia, ele sabe que eu disse isso só pra ele saber que a razão pela qual estou indo não é ele, e nunca vai ser. Talvez se ele fosse um pai presente ele saberia do que aconteceu naquela noite, talvez eu teria confiança o suficiente pra deixar ele saber e dividiriamos o peso das coisas, mas esse não é o caso. Somos como dois desconhecidos um pro outro, e talvez a única coisa que temos em comum seja nossa consideração por Gahyeon.

— Obrigada – ela sorriu aliviada – Vou pegar um casaco.

Ela nos deixou a sós na sala, e o silêncio me incomodou a ponto de me deixar nervoso e com as mãos suando. Não posso ficar perto dele com tanta mágoa no meu coração, por isso vou até o quarto de Jisung e escuto ele treinando uma melodia calma e gostosa. Estou louco pra ouvir o que ele está compondo pra nós dois.

Bato na porta levemente, e ele abre em seguida com uma expressão brava.

— Você estava espiando.

— Não estava – ri – Eu juro, não escutei nada.

— Hum – ele cerra os olhos – Estou de olho em você.

— Eu vou precisar sair, meu bem. Meu pai quer que eu e Gahyeon acompanhe ele até o aeroporto – seguro sua mão e faço um carinho – Vou ligar pra Sicheng vir ficar com você, tudo bem? Eu volto rápido, prometo.

— Tá bom, não se preocupe – ele me da um beijo e um sorriso compreensivo.

— Até logo – lhe dou outro beijo.

— Até.

Assim que saio do quarto, disco o número de Sicheng no meu celular e ele não demora muito pra atender. Explico a situação brevemente e sem muitos detalhes, ele diz que chega em cinco minutos e meu coração fica mais aliviado.

Tem sido bom ter ele por perto, todas as vezes que tentei proteger Gahyeon e Jisung juntos eu acabei falhando de alguma forma. É bom ter mais alguém pra confiar e dividir o peso, e mesmo que Sicheng saiba parcialmente das coisas ele não é o tipo de pessoa que insiste em saber. Sou grato por isso, a última coisa que preciso é alguém me investigando.

— Vamos? – Gahyeon perguntou quando cheguei na sala e ela já estava pronta vestindo seu casaco de lã.

— Sicheng está chegando, vamos esperar.

Ouvi meu pai bufar, mas Gahyeon não me contrariou mesmo sabendo que ele estava irritado, e por isso tentei controlar meu nervosismo pra não acabar surtando com ele. Estou fazendo um favor pra Gahyeon, se dependesse de mim eu deixaria ele ir sozinho pro aeroporto e tenho certeza que ele chegaria bem, não sei porque ele continua agindo como se isso fosse sobre ele.

Depois de alguns minutos, Sicheng estacionou o carro em frente a casa e nós saímos pela porta principal enquanto ele entrava. Trocamos um olhar discreto, eu sorri em agradecimento disfarçadamente e ele assentiu com a cabeça em resposta. Me despedi e fui até meu carro, Gahyeon abriu a porta pro banco do passageiro e vi meu pai ainda esperando que ela entrasse no carro dele, mas desistiu de esperar um segundo depois.

As vezes parece que eu e ele estamos em guerra, e Gahyeon está no meio, mas a verdade é que apesar de nunca ter tido consideração por mim, ele também nunca gostou que Gahyeon tivesse. Até quando éramos crianças e Gahyeon insistia em dividir algum brinquedo dela comigo, meu pai fazia a mesma expressão que acabou de fazer ao vê-la preferindo entrar no meu carro do que no dele. Expressão de profundo desgosto e decepção.

— Por que ele não vai sozinho? – pergunto ao entrar com o carro na rodovia.

— Para, Minho – Gahyeon disse com cuidado – Ele só quer companhia.

Eu sei que é só isso, mas sinto um pouco de raiva e não consigo disfarçar  perto de Gahyeon. Ela sabe dos meus problemas com nossos pais e não vai me convencer a ficar sorrindo forçado, mas talvez se eu continuar tão irritado ela vai se sentir culpada por precisar da minha companhia.

Liguei o rádio pra me distrair e não deixar o silêncio criar um clima ruim entre nós. Tocou a música que Jisung gosta de ouvir, e automaticamente meu coração ficou mais leve e metade da minha raiva se dissipou. Me pergunto qual melodia ele está compondo pra nós dois agora, se ele está feliz com o teclado que Mingi consertou, e se Sicheng está cuidando bem dele. No final de tudo, meus pensamentos sempre estão em Jisung, não importa o que está acontecendo a minha volta.

Segui o carro do meu pai até a rodovia que dá pro aeroporto, foram quase cinquenta minutos dirigindo na estrada por alguém que nem faço questão de me despedir. Gahyeon sabe que estou fazendo esse esforço por ela, e que isso sirva pra selar a paz entre nós sobre o que aconteceu anteriormente.

Estacionei meu carro logo atrás do dele, e antes de descer vi um homem se aproximar e pegar a chave do automóvel com meu pai. É um dos motoristas dele, quem vai levar o carro até uma garagem alugada e deixar guardado pra caso ele volte pra Seul um dia. Espero que isso não aconteça tão cedo.

Eu e Gahyeon o seguimos até o portão de entrada, não me dei o trabalho de levar suas malas pois o motorista nos seguiu carregando elas. Fomos até a fila do check-in, havia dezenas de pessoas esperando pra serem atendidas. Meu pai se sentou em uma das cadeiras e respirou cansado.

— Pai, eu preciso ir agora. Vou tentar chegar na segunda aula da faculdade – disse Gahyeon.

Ele lhe deu um sorriso compreensivo e assentiu.

— Tá certo, filha – se levantou pra abraça-la – Obrigada por ter vindo me acompanhar.

— Não precisa agradecer, pai. Fiquei feliz por ver o senhor – eles se abraçaram forte – Eu senti sua falta.

Uma parte de mim fica feliz ao ver os dois se despedindo, pois mesmo que nossos pais morem longe, eles nunca deixaram de dar apoio a Gahyeon e de cuidarem dela da maneira que podem. Mesmo que eu sempre tenha feito tudo que posso pra cuidar dela, sei que nada substitui o cuidado e carinho de um pai e uma mãe, e fico feliz por ela ter isso desde sempre e não conhecer a dor que carrego.

Por outro lado, meu coração sempre dói em momentos como esse. Queria que ele tivesse a mesma consideração por mim, que me abraçasse e fizesse questão de saber se vou ficar bem. Durante toda a minha vida eles prometeram me dar isso, mas só se eu cumprisse com todas as minhas obrigações e fizesse tudo que eles queriam. Faz mais de vinte anos que faço tudo que me pedem, e mesmo assim, nunca recebi um abraço como esse em troca.

— Diz pra mamãe que estou com saudades.

— Pode deixar, filha – lhe deu um beijo na testa – Se cuida, e me liga se precisar de alguma coisa.

— Tá bom, pai – sorriu – Boa viagem.

Ele olhou pra mim e desviei o olhar por impulso, mas quando Gahyeon começou a se afastar para irmos embora acabei me curvando brevemente pra me despedir. Por incrível que pareça ele também se curvou e se despediu de mim, me deixando com um leve aperto no coração que respirei fundo tentando afastar.

— Vamos? – perguntei pra Gahyeon.

Ela acenou pra ele uma última vez e me seguiu pra fora do aeroporto. O fluxo de pessoas circulando é grande, e no meio desse movimento todo vejo que eu realmente deveria ter vindo com Gahyeon pois seria perigoso se ela estivesse sozinha no meio de tanta gente.

— Será que ele vai ficar bem? – perguntou.

— Vai, não se preocupe – disse – Ele provavelmente vai avisar quando chegar na China.

Gahyeon me seguiu até a saída, e passamos ao lado da escada rolante que leva até a praça de alimentação em outro andar. Ela olhou pra escada e parou, continuei andando esperando que ela me seguisse, mas bufei irritado tendo que olhar pra trás pra ver o que ela está olhando.

Andei até ela outra vez, e segui seu olhar tentando encontrar alguma coisa, mas não vi nada.

— O que foi?

Ela piscou os olhos rapidamente e disfarçou olhando pra outro lugar.

— Tá vendo aquele garoto loiro de blusa azul? – sussurrou.

Olhei pra escada outra vez e encontrei um garoto alto, cabelo loiro acinzentado, rosto longo e um sorriso descontraído no rosto. Ele tomava um café gelado enquanto conversava com outro garoto aparentemente da mesma idade dele.

— Sim – respondi – Qual o problema?

— Aquele é Yunho.

Estremeci quando ela disse, e voltei a olhar pra ela atentamente tentando ler sua expressão. Não quero que fique magoada, mas a forma como ela o olha mostra que seu coração sente um aperto ao vê-lo, o que ainda é natural por ser algo recente.

Quando me separei de Felix, evitei ver qualquer revista ou site em que alguma notícia dele aparecia. Mesmo sabendo que não fiz nada de errado, sentia um aperto no peito ao vê-lo e pensava se ele estava bem, se já tinha encontrado alguém que o merecia.

— Você está bem? – perguntei a Gahyeon, mas a resposta pra essa pergunta é um pouco óbvia.

— Eu não o vejo a bastante tempo – respondeu – Depois que ele terminou seu intercâmbio, ele resolveu ficar no exterior.

Não sei o que dizer a ela, já passei por situações parecidas mas nenhuma é igual a dela. Gahyeon foi usada por ele, mesmo tendo boas intenções e sentimentos verdadeiros ele a desprezou. Não é tão incomum quanto parece, situações como essa acontecem o tempo todo quando uma pessoa vazia e outra de coração aberto resolvem se envolver.

Me sinto mal por ela, a forma como Yunho parece feliz devia lhe deixar feliz também, afinal de contas, amar é querer felicidade para o outro. Mas isso não funciona quando há mágoa, não funciona quando seu coração guarda tanto rancor que te impede de ver o lado bom das coisas. Sei disso porque quando Felix me viu feliz, ele sentiu ódio, e eu nem pude lhe culpar por isso. É uma reação natural, todo mundo tem direito de se sentir assim quando é machucado por outra pessoa.

— Está tudo bem – Gahyeon piscou os olhos pra afastar as lágrimas que já se formavam – Que bom que ele está bem, eu só espero não vê-lo outra vez.

— Prometo que não vai – acariciei sua cabeça – Agora temos que ir antes que ele te veja e resolva falar oi.

— Ele não vai fazer isso – riu com tristeza – Ele provavelmente nem lembra meu nome.

— Outra pessoa vai lembrar – agarrei seu braço lhe guiando pra saída e tentando a consolar um pouco – Você vai conhecer alguém melhor.

— Eu só quero me formar por enquanto – disse – Não quero me envolver com outra pessoa tão cedo.

— Calma, calma – dei batidinhas no seu ombro e Gahyeon riu.

— Tá tudo bem, bobão – ela desenrolou nossos braços e deu um passo pro lado – Não precisa ser meloso.

— Ainda bem – fiz cara de nojo – Eu só tava fingindo.

— Sei.

Chegamos no estacionamento e entramos no carro, me seguro pra não fazer outro comentário sobre ter que viajar mais uma hora de volta pra casa por conta do meu pai. Ligo o rádio de novo e dessa vez coloco uma playlist que Gahyeon e eu gostamos, e espero que o tempo passe rápido enquanto cantamos juntos algumas músicas que costumávamos ouvir quando éramos adolescentes.

Viajamos por mais trinta minutos até chegar a rodovia principal, e depois de um tempo em silêncio escutando as nossas músicas Gahyeon de repente abaixou o som e se virou pra mim.

— Posso te pedir uma coisa?

— O que? – me assustei com a pergunta pois estava muito distraído olhando pra estrada.

— Preciso ir em casa, esqueci um dos meus livros lá e tenho um trabalho importante pra entregar. Ia te pedir pra ir comigo quando pudesse.

— Só isso? – perguntei – Eu já fui até lá sozinho pra buscar meu carro, não foi tão perigoso.

— Eu não acho que muda muita coisa – respondeu – Xiaojun sabe que morávamos lá, assim como sabe onde eu estudo, e assim como pode descobrir qualquer outra coisa sobre nós dois. Tudo tem o mesmo risco.

— Exatamente – concordei – É claro que me sinto muito mais seguro na casa de Sicheng, mas não é como se ele não pudesse descobrir que estamos lá. Ele pode e vai, se quiser.

— Também não podemos depender de Sicheng pra sempre, me sinto mal com isso.

— Eu também – respirei fundo – Podemos pensar no que fazer depois. Quer ir buscar seu livro agora?

— Agora? – arregalou os olhos.

— Vai te atrasar pra aula?

— Não... – Gahyeon ficou um pouco aflita – Mas não é arriscado demais?

— Prefere três da manhã? – brinquei – Ainda é dia, não se preocupe.

Gahyeon acaba concordando, e eu mudo meu trajeto em direção ao nosso bairro. Não acho que é arriscado ir lá agora, não é nem meio dia e as pessoas circulam pelas ruas, os carros estão presos no trânsito e o dia está ensolarado. Já faz um tempo que estamos dentro do casulo, acho que está mais que na hora de sair dele.

Não quero que Sicheng nos ajude pra sempre, e não quero que nossa vida se resuma em fugir de casa em casa. Precisamos pensar no que fazer agora, talvez arrumar outro lugar pra morar, ou mudar pra outra cidade. Sei que isso provavelmente não vai resolver muito, pois Xiaojun pode nos encontrar a qualquer momento, mas eu não sei como posso resolver tudo isso definitivamente. São muitos erros acumulados, muito medo e angústia de enfrentar alguém que foi capaz de torturar Gahyeon. Não sei o que fazer, e prefiro fugir enquanto arranjo tempo pra pensar.

Estaciono em frente a nossa casa, e antes de sair do carro olho nas portas e janelas checando se há alguma coisa diferente do jeito que deixei. Está tudo exatamente igual, digo a Gahyeon que ela pode descer e ela obedece mesmo amedrontada.

— Calma – digo a ela quando nos aproximamos da porta – Não tem nada aqui, tenho certeza.

Está tudo muito calmo e em seu devido lugar, por isso afirmo com tanta segurança. Destranco a porta e entro primeiro, quando vejo que não tem ninguém deixo Gahyeon entrar.

Eu a acompanho até seu quarto, e ela rapidamente abre o armário e tira algumas coisas até achar o livro. Ela aproveita pra colocar mais roupas em outra mochila, e assim que ela termina vou até meu quarto pra fazer o mesmo. Pego mais roupas e sapatos pra mim e pra Jisung, mesmo não planejando ficar muito tempo na casa de Sicheng não sei pra onde vamos depois, então é melhor ter tudo nas mãos pra não ter que voltar aqui.

— Pronto? – Gahyeon perguntou olhando para todos os lados.

— Pronto.

Voltamos pra sala e saímos pela mesma porta, chequei tudo antes de ir pra saber como deixei as coisas e tranquei tudo novamente. Foi ainda mais seguro e tranquilo do que pensei, sei que Xiaojun não ia ser tão previsível assim, se ele vier atrás de nós, vai nos pegar de surpresa.

— Viu? Eu disse que estava tudo bem – disse a ela quando chegamos na calçada

— É – ela respirou mais aliviada – Talvez não seja uma ideia tão ruim voltarmos pra cá.

— Acho que ainda é cedo – respondi antes dela entrar no carro – Mas podemos voltar um dia.

Dei a volta no automóvel até o banco do motorista, mas antes de abrir a porta me peguei olhando pro garoto loiro parado em frente a casa da frente. Faz tanto tempo que não o vejo, e confesso que sinto meu coração apertado quando ele olha nos meus olhos. Não queria que tudo tivesse terminado daquela forma, não queria tê-lo magoado naquela noite no bar e muito menos que ele tivesse se despedido de mim com tanto desprezo naquela noite em Antares.

Eu sei que pedir pra que fôssemos amigos é exagero, mas eu achava que depois de tudo nós poderíamos viver em paz sem ressentimentos um do outro. Não acho que o coração de Felix esteja em paz em relação a mim, ele parece ter muitas mágoas e pendências, mas eu fiz tudo que pude pra tirar isso do coração dele, só não consegui.

— Oi – eu dou um sorriso e aceno tentando parecer simpático. É tão estranho pensar que alguém que significava tanto pra mim, hoje é difícil até cumprimentar.

— Oi – ele responde mais baixo, sem mudar sua expressão ou esboçar algum sentimento. É indiferente pra ele.

Sinto que preciso dizer alguma coisa, pois não sei se vou lhe ver outra vez e se terei outra oportunidade. Quero me desculpar, quero tentar pela última vez deixar o meu coração e o dele em paz. Já que provavelmente vou morrer ou ser preso por muito tempo, que eu não tenha nenhum arrependimento pra me lembrar daqui pra frente.

Atravessei a rua enquanto Felix me observava, estava com uma vassoura na mão e a entrada da sua casa cheia de folhas de árvore secas. Não sei exatamente o que dizer quando chego perto dele, então só pergunto o que mais quero saber pois ainda me preocupo com o seu bem-estar.

— Você está bem?

Ele me olha com indiferença, e desvia o olhar depois da minha pergunta. Sei que ele não quer iniciar uma conversa comigo, mas provavelmente essa é a última vez que ele vai precisar me ver na vida.

— Bem – respondeu seco, e não se preocupou em perguntar se estou bem também.

— Que bom – minhas mãos suam de nervoso e não consigo olhar em seus olhos direito. É uma situação um tanto constrangedora, talvez a melhor opção fosse parar no oi – Pensei que não fosse mais te ver, queria saber como você está.

— Bem – repetiu com um tom ácido, mas não tiro sua razão.

Respiro fundo tentando pensar direito, Felix não estava totalmente certo em me tratar mal quando eu tinha apenas terminado com ele, mas agora que eu o magoei de várias formas ele não só está certo como tem seus motivos.

— Olha, me desculpa pelas coisas que falei pra você – disse de uma vez e sem pensar muito – Me desculpa por aquele dia no bar, pelo dia que te acusei daquelas coisas e por todo o resto. Eu estive pensando em te pedir desculpas esse tempo todo.

Felix ouviu e ficou em silêncio, meu coração angustiado me fez questionar minhas ações. Não sei se devia ter dito isso, fiz como uma forma de me redimir e tentar curar sua mágoa, mas a indiferença de Felix me faz pensar se a melhor opção não seria simplesmente deixa-lo em paz.

— Lix? Cadê você? – ouço uma voz de dentro da casa, e só depois disso Felix se vira pra olhar pra porta. Ouço passos e em seguida alguém aparece, alguém que conheço muito bem e já devia ter imaginado que ele estaria aqui. Meu coração acelera de tanto nervosismo ao ver Changbin outra vez.

— Minho? – ele se aproximou de nós e passou o braço pelos ombros de Felix. Me olhou com desconfiança e cerrou os olhos do jeito que sempre costuma fazer, como se eu fosse um pedaço de carne e ele um cachorro com fome.

— Oi – me curvei tremendo um pouco. Gahyeon provavelmente está surtando vendo essa cena de dentro do carro.

— Posso saber o que faz por aqui? – perguntou desconfiado e com um tom rígido na voz.

— Eu apenas passei em casa e vim dar um oi pro Felix – respondi formalmente – Me desculpe incomodar vocês.

— Eu notei que você sumiu, foi viajar?

— N-não – meu coração bateu na garganta – Meu pai veio nos visitar, estávamos com ele em um hotel.

— Entendi – ele sorriu curioso – Não era mais fácil ele se hospedar na casa de vocês?

— Ele... Ele não gosta muito de ficar aqui – pigarreei – Mas já vamos voltar pra cá, estou com saudades de casa.

— Certo – disse ele – Nos vemos amanhã então.

— Amanhã? – perguntei confuso.

— É, amanhã – respondeu um pouco rude – Jisung me mandou uma mensagem dizendo que vai até a delegacia amanhã, ele não te disse?

— Ah, sim. Claro! – ri e levei a mão até a cabeça – Ele me disse, mas eu havia me esquecido. Amanhã o levarei até lá.

— Pode ir sem pressa – sorriu irônico – Também temos muito o que conversar, não é?

— É claro – sorri mal conseguindo respirar – Fico feliz em ajudar na investigação.

— Estou vendo – ele me olhou de cima em baixo – Vamos, Lix.

Ele puxou Felix, e o garoto loiro continuou parado olhando pro chão. Ele não mudou sua expressão enquanto eu e Changbin conversávamos, e por um momento até me pergunto se tem algo acontecendo que lhe deixe aborrecido, mas tenho certeza que o motivo dele não esboçar nada é apenas minha presença que lhe incomoda.

— Eu já te desculpei, não precisa falar disso outra vez.

Senti meu peito doer quando ele me olhou nos olhos e disse isso, mas ao mesmo tempo o alívio que senti ao ver que estamos bem foi muito mais satisfatório.

— Não tenho mágoa de você, só não quero que você esteja na minha vida. Queria que entendesse isso de uma vez por todas.

Ele se virou pra Changbin, puxou o braço do homem e entrelaçou seus dedos. Beijou a palma da sua mão, em seguida se inclinou pra lhe dar um beijo nos lábios e ganhou um carinho na cabeça em troca. Eles parecem felizes e apaixonados, até agora eu pensei que Changbin só estava se aproveitando de Felix, mas agora eu vejo a forma que ele olha pro garoto como se estivesse olhando pra tudo que ele tem, e tudo que ele é. É dessa forma que olho Jisung, é dessa forma que nunca consegui olhar pra Felix, e sinto muito por isso.

— Eu estou feliz agora – disse sorrindo pra Changbin, e recebeu um beijo na testa antes de trocarem sorrisos – Eu nunca fui tão feliz assim.

Não sei o que dizer.

Estou feliz por ele, com toda a transparência e sinceridade dos meus sentimentos, eu estou tão feliz por ele que meu coração sente paz por vê-lo tão bem.

Mas eu também estou perdido, um pouco envergonhado e sem jeito. Não sei se foi uma boa ideia ter vindo aqui, e meu coração dói um pouco por entender que estou recebendo a mesma coisa que dei. Fui eu que deixei Felix, fui eu que terminei com ele no momento mais importante da sua carreira e destruí seu maior sonho. Fui eu que me afastei, fui eu que lhe deixei sozinho simplesmente porque não conseguia mais sustentar uma relação sem amor.

Agora, sou eu quem tinha tantos arrependimentos por coisas que disse a ele, fui eu que busquei desesperadamente por seu perdão pra que pudesse viver em paz, e fui eu que pensei que ele não só me perdoaria como também ia me querer por perto, não como um amigo próximo, mas um conhecido ou um vizinho que lhe diz oi as vezes e que assiste suas competições na TV.

Ao contrário do que pensei, agora é ele que está me cortando da sua vida pra que possa viver feliz, sem lembrar de alguém que já o magoou tanto no passado. Estou feliz por ele ter aceitado minhas desculpas, mas meu coração dói por sentir tudo que fiz voltar contra mim de um jeito bastante doloroso. Agora eu devo aprender com isso e ser alguém melhor pra Jisung, pra que ele nunca sinta o que Felix sentiu, e nunca precise encontrar outra pessoa que o ame de verdade.

— Estou feliz por vocês.

Felix assentiu e até me deu um sorriso pequeno. Ele sabe que estou sendo sincero, e pra mim isso já é o suficiente pra que eu vá embora.

— Com licença – me curvei ao me despedir, e vi os dois se curvarem também. Suspirei fundo ao virar as costas e voltar pro carro, ainda pude ver os dois se abraçando antes de ir embora. Estou um pouco melhor do que antes, mas acho que troquei uma dor por outra.

— Que porra foi essa? – Gahyeon me olhou com as sobrancelhas levantadas.

— Eu precisava falar com ele – respondi frustrado – Só não achei que ia levar uma dessa na cara.

— Tava um pouco óbvio, né? – disse ela – Eles estão juntos, e você está com Jisung.

— Não é por conta disso – respondi um pouco irritado por ter que falar o que sinto em voz alta – Esquece.

Gahyeon respirou fundo, e mesmo com os olhos na estrada vi que ela me olhou com pena, do mesmo jeito que a olhei no aeroporto mais cedo.

— Você magoou muito ele – disse com cuidado – Não é só as pessoas que erram com a gente, nós também erramos com as pessoas.

— Eu sei – respondi – Ele me perdoou, está tudo bem agora.

— Então por que está magoado?

É difícil falar sobre tudo que sinto e sobre as coisas que acontecem, mas ultimamente venho me abrindo mais com Gahyeon desde que ela começou a fazer o mesmo comigo. Não é tão ruim assim, se eu não puder dividir meus problemas com quem eu amo, vou dividir com quem?

— Porque se eu não tivesse o magoado tanto, talvez o término não tivesse sido tão doloroso pra ele, talvez ele não teria que reagir com tanto ódio e obsessão. Nós podíamos ser amigos hoje em dia, nós podíamos desejar o bem um do outro e não precisaríamos fingir que não nos conhecemos, e cada um seguir seu caminho.

Gahyeon me escutou atentamente, mas não disse nada. Por um lado é bom, não gosto que as pessoas fiquem afobadas em me dar conselhos e palavras de afeto como se isso fosse resolver os problemas da minha vida. Gosto de pessoas que me escutam com o coração, que entendam como eu me sinto, e que saibam que às vezes a única coisa que eu quero e preciso é o silêncio e a compreensão de alguém que sabe me ouvir.

— Eu cresci com o Felix, nós crescemos com ele. Você se lembra, ele era nosso único amigo. Ele nos ensinou mais sobre a vida do que nossos pais, talvez – senti meus olhos queimarem – É triste pensar em como as coisas se acabam.

Ela encostou no meu ombro e acariciou na tentativa de me consolar, me deu um sorriso otimista como se nada doesse tanto assim, e me disse algo que eu precisava ter ouvido a muito tempo.

— As vezes o fim é a melhor escolha, só o fim previne outras mágoas e preserva os momentos bons – sorriu.

— É... – respirei fundo e concordei com cada palavra que ela disse – Talvez seja melhor assim, com o tempo vou me acostumar.

E com isso, nossa conversa terminou. Me senti um pouco melhor, pude afastar os pensamentos e focar os olhos na estrada, mas dentro de mim ainda sinto uma ponta de tristeza.

Deixei Gahyeon na faculdade, e voltei pra casa logo em seguida. Estou um pouco exausto hoje, assim como há dias que começam e terminam bons, há dias como esse onde não sei qual foi o momento em que começou a dar errado.

Me preocupo com o dia de amanhã, Sicheng provavelmente ajudou Jisung a digitar uma mensagem de texto pra Changbin, e eu não fiquei bravo com isso, mas fiquei surpreso. Achei que ele não seria tão rápido, e agora estou um pouco amedrontado com o que vai acontecer e com as perguntas que Changbin vai fazer pra mim, me encurralando cada vez mais nesse beco sem saída.

Ainda estou sem emprego, sem lugar certo pra morar, sem apoio dos meus pais, com o peso de recuperar notas baixas na faculdade e com a preocupação em relação a Xiaojun. Tem dias que consigo afastar esses pensamentos com facilidade, tem dias que estou tão bem comigo mesmo que é facil atuar e fingir que minha vida é boa, que minha alma é livre de pecados, e meu coração livre de dores. Mas nem todo mundo é de ferro, as vezes por mais que eu tente acabo falhando, por mais que ocupe minha mente com coisas banais acabo andando em círculos até chegar no mesmo lugar. É cansativo.

Queria ter a ajuda de alguém, queria despejar meus problemas em cima de alguém que confio e deixar que resolvessem tudo pra mim, mas não é tão simples quanto parece. Tenho medo de tudo e todos, e estou tão cansado de sentir medo que só de pensar nisso meus olhos choram. Não aguento mais, meu corpo não aguenta mais sentir a descarga de adrenalina e eu quase não tenho mais autocontrole. Sinto que aos poucos meu lado mau vence, meu ying-yang está se transformando em uma esfera negra a cada dia que passa, e sou eu quem estou deixando isso acontecer sem fazer absolutamente nada.

Sou fraco, vou ser vencido sem nem ao menos tentar, e sei disso. Não quero lutar, não quero passar o restante do meu tempo tentando vencer uma guerra que perdi desde o primeiro minuto, porque não faço mais questão de vencer. Quero estar perto das pessoas que amo, quero consertar meus erros, pedir perdão, amar, errar, acertar e errar de novo até aprender a fazer a coisa certa. Quero viver, como nunca vivi antes, e não importa qual seja meu fim, quero ter lembranças boas e uma alma leve, pra que eu possa morrer sabendo que dei meu melhor até onde pude.

— Você voltou! – Jisung correu sorrindo até a sala quando abri a porta.

Quero ser bom pra ele, e mesmo que eu não receba seu perdão nunca, quero mostrar em cada gesto meu que eu me arrependo tanto, tanto, que fiz tudo que pude por ele.

Dou meu melhor sorriso, e um abraço forte dizendo que também estou com saudades. Não quero demonstrar que estou exausto, não quero que ele saiba como me sinto pois ele vai se colocar em meu lugar e experimentar da dor. Quero que enquanto ele esteja comigo só conheça o amor, o cuidado, o respeito e a cumplicidade que temos um com o outro.

— Desculpa demorar tanto – beijei sua testa.

Sicheng está sentado na mesa da cozinha tomando um iogurte de morango, e acenou pra mim quando entrei em casa.

— Tudo bem, eu quis que você demorasse pra terminar nossa música, mas ainda não consegui – Jisung fez biquinho.

— Não se preocupe, meu bem – sorri – Faça tudo no seu tempo.

Andamos até a cozinha, Sicheng bebia o iogurte com tanta rapidez que imaginei que ele estivesse com pressa. Me sinto mal por ter tirado metade do seu dia de trabalho, mas apesar de Jisung me dizer que talvez já consiga ficar sozinho, sou eu quem não estou preparado pra arriscar isso.

— Desculpa ter te ligado – me expliquei – Eu demorei no aeroporto e não queria deixa-lo sozinho.

— Podia ter me levado, Hyung – disse Jisung.

— Me desculpe, meu pai não é uma pessoa muito agradável, por isso não pensei em levar você – fiz um carinho em suas costas – Mas da próxima vez você vai com a gente, tudo bem?

— Tudo bem – ele me abraçou de lado,  não estava triste por não ter ido comigo, e me senti mais tranquilo.

— Pode me ligar a qualquer hora, Minho. Não se preocupe – disse Sicheng se levantando – Meu trabalho é tranquilo, só quando eu for abrir outra livraria que vai ser corrido, mas posso dar um jeito.

— Você vai abrir outra livraria? – Jisung perguntou empolgado – Seu pai deve estar muito feliz.

Sicheng parou no meio da cozinha e olhou pra Jisung sem demonstrar reação, depois se virou pra jogar a embalagem do iogurte no lixo e pigarreou.

— O meu pai morreu, Jisung.

Vi ele arregalar os olhos e seu sorriso murchar, depois de tanto tempo que se reencontraram eles ainda não tinham tocado nesse assunto. Acho que Sicheng fugiu o máximo que pode, e aproveitou que Jisung não se lembrava direito do passado pra não ter que relembrar nada também.

— Ah... – ele murmurou triste – Eu... Eu sinto muito.

— Tudo bem, já faz mais de um ano – Sicheng tentou sorrir na tentativa de restaurar o clima de antes – Eu preciso ir trabalhar agora, vejo vocês depois, certo?

— Certo – fui eu que respondi, pois Jisung continuou quieto até Sicheng sair e ele me olhar com os olhos tristes.

— Ei – toquei em seu braço e me sentei em uma cadeira da mesa. Puxei Jisung pra se sentar na cadeira do meu lado, mas ele acabou sentando nas minhas pernas – Você está bem?

Acariciei sua barriga, e abracei seu tronco por trás aproveitando da sensação gostosa de tê-lo perto de mim. Meu coração dói um pouco por ele, sei que o pai de Sicheng foi alguém muito importante em sua vida, alguém que lhe deu moradia, proteção e comida quando Bang Chan e ele não tinham nada além de traumas e saudade dos pais.

— Estou – respondeu – Eu imaginei que isso tinha acontecido, mas tive medo de perguntar.

— Eu entendo, meu bem – beijei seu ombro – Sinto muito por isso, sei que ele cuidou muito de vocês.

— É, ele cuidou – suspirou fundo e se deitou em meu peito – É tão rápido a forma que perdemos as pessoas, né?

Essa frase me atingiu em cheio, e não pude evitar respirar cansado e concordar com uma expressão triste. Hoje eu tive a mesma experiência, de uma forma diferente de Jisung, pois pensei no quão rápido é perder alguém que está vivo, mais rápido ainda do que perder alguém pra morte.

— É repentino – disse – Doloroso também. Acho que dói mais quando perdemos alguém que antes significava tanto, e de um dia pro outro não significa mais nada. Perder alguém pra morte é até bom, pois nada muda entre você e aquela pessoa, nem o fato dela não ter mais vida é o suficiente pra apagar o que ela viveu com você.

Não sei se falei demais, mas gosto de dividir meus pensamentos e sentimentos com Jisung. Estamos juntos agora, quero compartilhar com ele não só minhas alegrias e meu amor, mas também meus problemas e dores. Nossa relação não pode e não deve ser feita só de momentos bons, pois só em momentos ruins podemos nos conectar tanto com alguém, só quando nosso coração dói é quando ele se abre o suficiente pra receber o amor de quem não quer te ver sofrer.

— Você já perdeu alguém pra vida, Hyung?

Pensei por um, dois, três e até seis segundos naquela pergunta. Não sei como devo responde-la, pra perder alguém você precisa primeiramente tê-la por perto, então não posso dizer que perdi meus pais, pois eles nunca tiveram grande significado ou presença na minha vida.

Posso dizer que perdi Felix em decorrência dos meus erros, mas eu já havia o perdido desde que terminamos nosso relacionamento, foi uma escolha minha terminar e agora é uma escolha dele se afastar, então talvez antes de ser uma perda, seja apenas uma escolha que fizemos juntos.

Busco na minha memória mais alguém que hoje não é tão próximo de mim, e não consigo encontrar ninguém que eu tenha a sensação de ter perdido em vida. Minha mente vasculha cada passo que dei na minha vida, e de repente me pego pensando na conveniência do posto de gasolina onde trabalhei com honestidade até meu último minuto. Hyunjin me vem a mente, e dessa vez sinto uma pontada no peito quando percebo que sinto a falta dele. Ele era meu amigo, estava começando a ocupar um espaço no meu coração que nunca nenhuma amizade minha ocupou, e tudo que eu fiz foi destruir isso, me afastar quando as coisas ficaram difíceis, e não fazer questão de me explicar quando ele teve tantas impressões erradas de mim no meu depoimento. Eu devia ter dito alguma coisa, devia ter feito mais questão dele, agora sinto que perdi alguém que poderia ter sido um amigo pra vida toda.

— Sim – engoli em seco – Se lembra de Hyunjin?

— O garoto que trabalhava com você? – perguntou – Eu me lembro dele.

— Nós éramos bons amigos, mas hoje em dia não somos tão próximos. Eu sinto falta dele, sempre foi difícil pra mim manter uma amizade com alguém, mas acho que com ele eu não me esforcei o bastante, e por isso hoje não somos o que éramos antes. Eu gostaria de ter feito diferente, talvez hoje eu tivesse alguém com quem contar.

Jisung se virou com tudo e até bateu o braço na mesa pra poder me olhar nos olhos, apoiando suas mãos em minhas pernas e lendo minha expressão com seus olhos castanhos atentos.

— Liga pra ele, Hyung.

— O que? – ri – Claro que não.

— Liga – ele insistiu – Pede pra vocês conversarem, pede desculpa e recomeça de novo. Qual o problema?

— Eu não... – me senti nervoso só de pensar – Eu não acho que é uma boa ideia.

— Prefere viver com essa dúvida e se arrepender depois? – perguntou – Hyung, nós não sabemos o que vai acontecer amanhã, semana que vem, ou um ano depois. Ninguém tem tempo de verdade, ninguém deveria ter medo de se desculpar e recomeçar, e sim de não ter feito tudo que queria a tempo. Se liberta disso, Hyung.

Sinto uma vontade imensa de chorar, cada palavra de Jisung tocou meu coração e cada olhar dele parece entender tudo que eu sinto dentro de mim, mesmo sem saber de tudo.

Quero seguir seu conselho, quero em cinco segundos de coragem me libertar dessa preocupação, e de todas as outras que eu tenho. Quero sentir paz, não quero ter pendências pra me lembrar depois, quero que meu coração esteja leve e minha consciência limpa.

— Se alguém tivesse dito isso pra mim, eu teria me desculpado com a mamãe por sempre ter sido tão chorão – disse ele – E teria dito ao papai que eu queria ser igual ele quando crescesse.

Isso me machucou tanto, mas Jisung não derramou uma lágrima enquanto disse. Ele se conformou, aprendeu a viver com o arrependimento por mais que não estivesse em paz, e sei que ele está me dando esse conselho porque não quer que eu termine como ele, ou viva o resto dos meus dias em sofrimento como estou agora.

— Eu... Eu sinto muito – digo sem conseguir segurar as lágrimas, e seguro seu rosto lhe dando beijos de consolo e amor.

— Tudo bem – ele sorriu – Mas escute meu conselho.

— Tá bem – limpei meus olhos molhados – Eu vou ligar pra ele.

— Obrigada – me deu um beijo na testa, e nem entendi porque ele me agradeceu – Vou continuar compondo agora. Eu te amo, Hyung.

— Eu também te amo, Hannie – lhe dei outro beijo na testa.

Respirei fundo e afastei as lágrimas dos olhos, tentando pensar com clareza no que devo fazer e amadurecer a ideia do conselho de Jisung. Eu realmente não sei o dia de amanhã, cada dia que passa estou mais perto do meu fim, dos meus dias incontáveis em uma cela, ou da eternidade no inferno. Não quero viver pra sempre assim, pensando no que fiz ou não fiz, no que falei ou não falei, nas pessoas que deveriam estar perto de mim nos meus últimos dias, e não estiveram por culpa minha.

Olho pro meu celular em cima da mesa, não vai ser tão difícil assim. Me lembro de Hyunjin me olhando com pena no dia que fui demitido, e dos seu olhar desesperado quando meu pai gritou comigo na frente de todos. Ele entende como me senti naquele dia, mas não se sentiu mais na liberdade de estar do meu lado, já que eu o afastei e nem fiz questão de dizer por que.

Disco o número dele enquanto penso nisso, meu coração bate na garganta e minhas mãos estão geladas pelo nervosismo. Quando ele atende, seu tom de voz é receoso e formal, e é triste pensar que regredimos a isso quando nossas noites trabalhando juntos eram tão divertidas e cheias de informalidades.

— Alô? Minho Hyung?

— Ah, oi... – pigarreei nervoso – Hyunjin?

— Sim, sou eu – respondeu – Está tudo bem?

— Está – meus lábios tremiam – E... E você? Está bem?

— Estou – disse – Obrigada.

Fiquei em silêncio, desesperado tentando pensar no que dizer, mas nenhuma palavra me vem a mente.

— E então... – ele também parece nervoso ao perguntar – O que precisa?

— É... Bom – gaguejei – Eu... Eu só queria conversar com você, queria perguntar se vai fazer algo hoje a noite.

— Ah... – ele murmurou surpreso – Não, não vou fazer nada hoje a noite. Podemos conversar sim.

— Certo – respondi – Quer beber soju em algum posto concorrente?

Escutei ele rir, e o clima entre nós ficou mais leve. Preciso agradecer Jisung mais tarde, é por causa dele que coisas boas ainda acontecem na minha vida.

— Claro, claro – riu – Seria ótimo.

— Então tá, combinamos o horário mais tarde – disse a ele – Até depois.

— Até depois, Hyung.

Senti um alívio enorme quando desliguei, e meu coração está até mais feliz do que antes agora. Respiro aliviado e sorrio sozinho, quero agradecer Jisung por isso mas ele está ocupado compondo, ouço ele tocar a mesma combinação de notas repetidamente e decido não atrapalhar, mas assim que puder vou agradece-lo por isso.

Depois de preparar algo pro almoço e levar pra ele, me sento no sofá da sala e abro o caderno em meu colo prometendo escrever durante toda a tarde. Preciso terminar logo, estou quase no final da história e preciso aproveitar meu tempo o suficiente pra que tudo esteja pronto o mais breve possível. Tenho um pressentimento ruim quando penso no futuro, esse pressentimento me assombra todas as vezes que penso nas pessoas que amo, nos sonhos que não realizei, nas tarefas que não cumpri e nas vezes que não me desculpei. Venho dando o meu melhor diariamente e me apressando pra fazer tudo que quero, só assim faço a angústia ir embora e o pressentimento temporariamente sumir.

Passo o resto do dia escrevendo, e agradeço aos céus pelo meu coração não estar tão afundado em tristeza, pois só assim as palavras se formam na minha mente e eu consigo pensar direito. Quando fecho o caderno, solto um suspiro que estava segurando e me sinto mais aliviado, falta pouca coisa agora. Vou conseguir, por mais difícil que seja, sei que posso fazer isso.

Depois de combinar o horário e o local com Hyunjin, avisei Gahyeon e Jisung que saíria pra conversar com ele, Jisung ficou feliz e me desejou boa sorte, já Gahyeon ficou tão preocupada que leu um pequeno sermão antes de finalmente desistir de me dizer alguma coisa. Sicheng também está por perto, ele sabe que Gahyeon e Jisung ficarão sozinhos e me disse pra ficar despreocupado. Vai correr tudo bem, não vou demorar tanto assim, amanhã o dia vai ser ainda mais difícil que hoje e preciso ter energias pra amparar Jisung e ter que suportar Changbin.

— Gahyeon – escuto Jisung dizer com a voz arrastada enquanto me arrumo, e ele espera sentado na cama.

Minha irmã aponta a cabeça na porta do quarto enquanto seca o cabelo com uma toalha, e Jisung começa a mexer as mãos com nervosismo.

— É... - ele olha pros lados – Você...Você quer assistir aquele filme de novo?

— Claro! – ela sorri animada – Eu ia mesmo te chamar, quer ver Jogos Vorazes? Ainda falta alguns filmes pra terminarmos.

— Uhum! – ele sorriu empolgado e pulou na cama, meu coração quase explodiu de tanto amor e alegria ao vê-los tão próximos – O que você acha que aconteceu com o Peeta, Noona?

Gahyeon gargalha e faz sinal pra que ele se levante.

— Vamos descobrir logo, vem – diz ela – Vou fazer pipoca.

— Eu já volto, Hyung – ele corre até mim que estou calçando meus sapatos e me da um beijinho no ombro – Vem me dar tchau quando estiver indo.

— Pode deixar, meu bem.

Meu coração quase explode ao perceber que os dois estão se aproximando cada vez mais. Gahyeon sempre foi contra eu me envolver com Jisung, e eu sempre procurei entende-la pois sabia que ela só estava se preocupando comigo como qualquer outra pessoa que me ama faria.

Mas, depois daquela noite tudo mudou. A resistência que Gahyeon tinha antes agora diminuiu, e seu coração amoleceu quando começou a se culpar por ter causado toda essa tragédia. Ela sabe que Jisung também é uma vítima, e por causa disso ela passou a entende-lo mais depois que nos mudamos pra casa de Sicheng, e mesmo sem ter tanto tempo livre pra conversar com ele, ela vem se esforçando pra ajuda-lo sempre que pode.

Quando saio do quarto, os dois estão sentados no sofá lado a lado dividindo um cobertor e uma tigela de pipoca. Queria guardar esse momento pra sempre na memória, sem nunca esquecer, porque as duas pessoas que mais prezo e que mais deram significado a minha existência hoje são tudo que eu tenho. Queria ter mais tempo pra criar novas memórias com eles, pra ficar feliz vendo suas conquistas e dar forças em momentos difíceis. O pressentimento volta outra vez, meu coração se aperta, mas respiro fundo e dou um sorriso.

— Prometo voltar logo – dou um beijo em Jisung e bagunço o cabelo de Gahyeon.

— Talvez a gente te espere pra ver o outro filme – ela responde.

— Não demora, tá? – Jisung se inclina pra me dar um beijinho na ponta do nariz – Se não fico com saudades.

— Logo volto pra ficar com você, Hannie – o beijo outra vez – Me esperem pro filme.

— Vou pensar – Gahyeon revirou os olhos e atirou uma pipoca em mim.

Acenei pra eles e fui até meu carro, a conveniência em que eu e Hyunjin decidimos ir não fica tão longe da casa de Sicheng. Dirigi por pouco tempo até chegar em um posto de gasolina, a conveniência daqui é tão famosa que há até algumas mesas onde as pessoas se sentam pra beber. Lembro de como eu e Hyunjin falávamos daqui, fazendo algumas piadas pelo lugar ser incrívelmente melhor que o nosso, mas agora fico um pouco triste quando lembro de lá. Acho que ele também deve se sentir assim, afinal, mesmo que não fosse grande coisa, era o que nós tínhamos.

Quando me aproximo de algumas mesas, vejo que Hyunjin ainda não chegou e não está dentro da loja. Me sento em uma das mesas vagas e decido espera-lo antes de comprar algo pra beber, percebo que minhas mãos estão trêmulas e logo entendo porque estou tão nervoso. Não quero que ele me veja de outra forma depois daquele maldito depoimento, não quero que ninguém enxergue essa parte tão ruim de mim e quando penso nessa possibilidade fico aterrorizado. Não é assim que quero ser lembrado pelas pessoas que me consideram, mas infelizmente, se alguém descobrir o que fiz, vão ser poucos que vão perguntar meu lado da história.

— Oi – olho pro lado e vejo ele se aproximando devagar, vestido com uma blusa de frio vermelha e calças pretas. É a primeira vez que o vejo com roupas casuais, sem o uniforme do posto ou da delegacia.

— Oi – sorri um pouco nervoso – Senta.

Ele se sentou na minha frente, seu cabelo estava úmido como se ele tivesse acabado de sair do banho. Suas olheiras desapareceram agora, acho que ele está se acostumando com o fato de poder dormir todas as noites depois que o posto de gasolina fechou.

— Você parece bem – digo na tentativa de quebrar nosso silêncio constrangedor.

— Pois é – riu fraco – Dormir bem tem sido muito bom.

— Pensei que fosse isso – respondi – Viu? Perder o emprego faz bem as vezes.

— Já sabíamos que isso ia acontecer uma hora ou outra, né? – ele disse um pouco triste – Aquele lugar estava com os dias contados.

— É verdade.

Ficamos em silêncio outra vez, não temos a mesma intimidade que estávamos construindo antes, e agora nosso silêncio me deixa um pouco nervoso. Não quero ser o único a insistir em uma conversa pois talvez ele acabe ficando entediado, isso tudo é muito difícil pra mim, me faz lembrar do porque nunca tive amigos próximos.

— Você está bem? – ele pergunta me pegando de surpresa.

Eu não estou nos meus piores dias, mas não posso dizer que são os melhores. Não acho que minha vida teve melhores dias depois de Bang Chan, pois meu coração nunca deixou as memórias ruins irem embora. São apenas dias bons, mas não os melhores. Talvez meus melhores dias já tenham acabado.

— Eu fiquei me perguntando se estava bem depois de toda aquela história com seu pai.

— Ah – ri sem muito humor – Eu estou bem, não foi nada demais. Coisas assim aconteceram minha vida toda.

O olhar de Hyunjin murchou, acho que ele ainda se lembra de quando contei sobre meus pais pra ele, conheço o típico olhar de pena que as pessoas me davam quando meus pais gritavam comigo no meio da rua.

— Isso é triste – suspirou – Mas espero que as coisas tenham melhorado pra você.

— Melhorou – estou sendo sincero dessa vez – Eu estou com Jisung, tenho minha irmã do meu lado e alguns amigos por aí. É o bastante.

— Fico feliz por você – sorriu.

Outra pausa, outro assunto que acaba e meu coração dispara de nervoso. Ainda não cheguei onde quero chegar, não disse o que quero dizer e não faço ideia de como entrar nesse assunto. Minha mente implora pra que ele me ajude.

— E então – coçou a cabeça nervoso – Seria rude da minha parte te perguntar por que me chamou aqui?

Ele me pega de surpresa outra vez, e engulo em seco sem conseguir o olhar nos olhos. Não sabia que Hyunjin ia tão direto ao ponto desse jeito, mas isso não é de todo ruim. Agora posso dizer com outras palavras que o único motivo que me fez ir atrás dele é porque quero morrer sabendo que ainda tenho um amigo.

— Por que seria rude? – ri.

— Eu não sei – deu de ombros – Nós nos afastamos, não é mais a mesma coisa.

Isso me deixa ainda mais triste, eu tive uma esperança de que isso não fosse afetar ele tanto quanto me afetou, mas pelo tom da sua voz percebo que ele sentiu na mesma intensidade.

— Acha que me afastei de você?

Ele olha pra um ponto qualquer na mesa quando me responde.

— Acho que fizemos isso juntos.

De fato fizemos, mas acho que isso foi mais minha culpa do que dele. Eu o assustei aquele dia na delegacia, eu não o procurei, não fiz questão de confiar nele quando ele me ofereceu seu ombro pra chorar. Foi cruel da minha parte.

— Eu estava passando por muita coisa – disse – Eu te disse isso um tempo atrás, não sou muito bom socializando, acabo afastando as pessoas quando as coisas ficam difíceis. Mas quero aprender e mudar.

— Não é bem assim que se aprende – falou baixo – Mas sei que está tentando.

— E você? – engoli em seco – Por que acabou se afastando?

Hyunjin ficou nervoso de repente, apertou suas mãos uma na outra e desviou o olhar do meu outra vez.

— Ah, eu... – inspirou devagar – Eu só fiquei um pouco confuso com... Com aquela coisa toda na delegacia.

Como eu imaginei, aquele depoimento fez ele desconfiar de mim e por conta disso se afastou. Eu não posso julga-lo, Hyunjin mal me conhecia e certamente preferiu acreditar na polícia já que eu nem sequer dei explicações. Eu faria o mesmo no lugar dele.

— Eu pensei que fosse por isso – suspirei – Você está desconfiado de mim, não está?

— Não – respondeu de imediato – Eu só estava confuso, não fiquei do lado de ninguém pois às vezes acho que Changbin passa do limite. Eu só queria ouvir sua versão da história, mas você nunca mais falou comigo.

Sinto um aperto no peito, e não sei o que dizer. Eu o magoei, eu sei que estou errado mas essa situação toda é muito complicada agora. É difícil reconstruir relações que nunca foram muito bem construídas, é difícil resgatar algo que nunca foi muito sólido.

— Eu tive medo de saber o que estava pensando – falei com peso na voz – Você era o único naquela sala que sabia sobre meu amor por Jisung, tive medo que duvidasse disso, que achasse que eu sou capaz de magoa-lo.

— Eu não achei isso – ele diz ansioso e trêmulo – Mas eu vi que mentiu sobre algumas coisas que havia me contado antes, eu não entendi porque, e achei que fosse me explicar depois mas você não disse nada.

— Me desculpa – minha voz falhou – Eu não achei que fosse necessário, achei que você já confiava o bastante em mim pra saber que eu só estava tentando acabar com isso. É desgastante ter que negar sempre, é cansativo e doloroso ter que jurar pra todos, enquanto tento cuidar de quem eu amo que sofre todos os dias pela mesma coisa.

As palavras saíram do fundo do meu coração, e dessa vez não carregavam mentiras. Tudo que eu disse a Hyunjin é verdade, é cansativo negar e é doloroso ver Jisung sofrer, e essas palavras não significam que sou inocente ou culpado, só significa que eu sofro, e que assim como qualquer outra pessoa, eu não quero sofrer.

— Eu sei – ele parece triste mas aliviado – Eu sei como é cansativo, eu vejo isso todos os dias, mas você podia ter me dito isso antes. Não éramos os melhores amigos do mundo naquela época, mas poderíamos ter sido se tivesse sido sincero comigo, isso ia me fazer confiar em você.

Sinto um nó na garganta, mas não me rendo ao choro. Não é como se fosse a última vez, ainda temos tempo, sua confiança não foi quebrada da forma que seria caso ele soubesse da verdade. Tudo que eu disse hoje foram palavras sinceras, mesmo que ele ainda não pudesse interpretar do jeito certo, eu não menti. Eu nunca quis magoar Jisung, eu nunca quis viver negando algo.

— Eu estou sendo sincero agora – tentei sorrir – Espero que seja o suficiente.

Ficamos em silêncio, sem constrangimento dessa vez, apenas a espera da resposta e o silêncio da reflexão que nós dois tínhamos sobre isso tudo.

A vida não é só feita de coisas ruins, de perdas, dores, e sofrimento. Há momentos como esse em meio a tanta dor, que não importa o quão difícil as coisas estejam, sei que ainda posso arranjar força de todas as coisas boas que construí.

— Eu acho que não é.

Eu arregalo os olhos e meu coração dispara.

— O que?

— Não é o suficiente – respondeu – Não quero ter um amigo que não paga um soju pra mim.

Soltei uma lufada de ar de tanto alívio.

— Pão duro – ele me xingou.

— Folgado – ri e xinguei de volta, me levantando pra entrar na conveniência com um sorriso de orelha a orelha.

Terminei aquela noite brindando garrafas com meu mais novo amigo, uma das minhas melhores companhias e sem dúvidas a pessoa mais engraçada que já conheci. Agora, tenho mais um motivo pra me sentir feliz mesmo sabendo que há uma bomba relógio em mim, os meus outros três motivos estão dormindo dividindo o mesmo cobertor quando chego em casa. É quase como se o cronômetro parasse por um segundo.

Roubo uma das almofadas de Sicheng e me deito ao lado de Gahyeon, decido deixar a televisão ligada por mais alguns minutos pra que eu possa ver o rostinho de Jisung dormindo tão profundo, minha irmã roncando baixinho, e meu outro mais novo amigo dormindo de boca aberta.

Não importa em que casa estejamos dormindo, em que país estejamos morando, ou quanto tempo nos resta até não ter mais tempo nenhum.

Esse ainda é meu lar, meu pedaço de vida, minha eterna lembrança de felicidade.

Continue Reading

You'll Also Like

77.5K 7.8K 27
Jisung é obviamente virgem. Mesmo que ele seja um adolescente com tesão, as únicas coisas que ele sabe sobre sexo são de fanfics que ele lê online...
566 74 7
| FIC EM HIATUS | sempre fui bom em escrever histórias mas nunca testei escrever sobre os meus sentimentos e sobre.....a minha vida Mas oque teria a...
24.2K 3.3K 20
Minha mãe fala que eu sou um homem mas, eu não me sinto assim. Me desculpe mãe, mas eu sou uma mulher. ------ • Esta fanfic é apenas uma adaptação pa...
84.5K 14.7K 23
onde jisung deixa flores no armário de minho todos os dias LMN + HJS [ concluída ]