Por volta das cinco da manhã, quando Scott e Donna já se preparavam para partir com Emily, a garotinha escreveu em seu caderno uma pergunta. Queria saber se podia ver a mãe. Scott olhara para Margot e Donna.

- Ela tem o direito – dissera Margot, levantando-se da cadeira à mesa da cozinha. Eles tinham improvisado muletas para ela com cabos de vassoura. – Venha, querida.

Ela pegara a mão de Emily e a levara para a sala. Scott permanecera na cozinha com Donna e Henry. Cinco minutos depois, Margot e Emily voltaram. Não havia sinais de choro no rosto da garotinha. Scott supôs que a tristeza chegaria depois: no momento, o que Emily vivenciava era raiva. Era ira.

O barco deu outro sacolejo. Scott agarrou a amurada, tornando a fechar os olhos e contando até dez para acalmar o estômago. Se Margot o visse naquele estado, com certeza iria tirar sarro da cara dele. Só que Margot não embarcara: nem ela nem Henry. Eles tinham ficado em Oak Island enquanto Scott, Donna e Emily partiam para Nova York. Primeiro, porque Margot não conseguiria andar com o pé enfaixado, mesmo com as muletas; segundo, porque ninguém queria deixar Zoey morrer sozinha.

- Não vai demorar muito agora – dissera Margot a Scott quando se despediram em frente à casa do lago. – O que resta dela é só consciência vestigial. A verdadeira Zoey já foi embora. Mas vou mantê-la confortável. Não se preocupe.

- Não estou preocupado só com ela. Estou com você também.

Margot lhe dera um sorriso doce. Seu rosto estava pálido. Ela com certeza sentia dor no pé mutilado: o suor em sua testa e as caretas que fazia denunciavam isso.

- Não precisa ficar preocupado comigo – ela fizera um gesto para Henry, que conversava baixinho com a mãe e tinha o rifle pendurado nos ombros. – Chris Kyle estará aqui para me defender.

- Mais fácil você salvar o rabo dele – Scott respondera. – Mantenha a pistola por perto, tá bem? E tranque as portas e as janelas, só para o caso daquelas coisas voltarem.

- Quem é o mais velho, Scott? Você ou eu? – ela sorrira e largara as muletas para abraçá-lo. – Eu estava errada.

- Pode repetir isso? Acho que meus ouvidos estão me pregando uma peça.

- Cala a boca e escuta, estou tentando pedir desculpas – ela descansara a cabeça contra o ombro dele. – Eu estava errada e você estava certo. O que vocês estão fazendo não é loucura. Vale a pena lutar – beijara-o na barba por fazer. – Boa sorte.

- Vou voltar por você. Sabe disso, certo?

- Claro – e o beijara de novo, agora na outra bochecha. – Vá logo.

Scott então tinha pegado a mão de Emily e, após Donna terminar de se despedir de Henry, eles seguiram até o barco que Skies consertara e que ficava ancorado ao leste de Oak Island.

- Pegou a tiara? – Donna perguntara.

- Peguei. Está na mochila.

- Bom – Donna parara de andar e olhara para trás, para a casinha do lago. Margot e Henry tinham entrado, e a varanda estava vazia. Tudo era deserto. Tudo era silêncio. – Vou sentir falta daqui.

Naquele momento, Scott entendeu que talvez nunca mais voltassem.

***

O barco seguia na direção de Nova York. Os prédios se avolumavam cada vez mais. As nuvens iam embora, sopradas para longe, deixando a luz do sol vazar. No manche, Donna era jovem outra vez: seus cabelos brancos abriam-se para trás com o vento e ela tinha no rosto uma expressão tranquila, que suavizava suas rugas. Sorria. Scott a olhou, vendo com clareza a mulher linda que ela fora.

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