CAPÍTULO 1

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Nós precisamos voar por nós mesmos antes que alguém nos diga como. - The Neighbourhood

Dias atuais

O inverno está menos chuvoso neste ano, mas o nublado e o frio intenso permanece. Estamos no começo de Janeiro, um pouco distante do meio do semestre.

Aqui estou eu, caminhando sobre o corredor da escola, cheio de alunos impacientes. Eu olho para os lados e vejo alunos rindo, conversando.

Eu continuo a andar, indo na direção da sala C-3 para a aula de Biologia, segurando meu caderno e meu livro do ensino médio, arrastando meu tênis rosa, sendo esbarrada a todo o momento.

O corredor é extenso, porém, com tantos alunos que se torna estreito.

Sinto uma tontura repentina, um mal estar, deixando-me aflita.

A sensação rapidamente passa e eu não entendo. É como se ela tivesse passado por mim literalmente me secando com os olhos. Sabe aquela sensação de estar sendo observada por distância? Sinto que eu estou sendo agora.

Eu olho para trás, não vejo ninguém me encarando, somente alunos andando e andando. Eu prossigo. Chego à curva do corredor e volto a olhar para frente. DROGA! Acabei de esbarrar em alguém de aço.

Lá se vão meus livros pelo chão.

— Opa, foi mal. — voz masculina.

— Ah, tudo bem. — eu me abaixo para pegar meu material, sentindo-me uma completa lerda, pois eu sempre esbarro em alguém nesse corredor, mas não ao ponto de derrubar o meu material. — Você é a centésima pessoa só nessa semana. Não se preocupe. Não é você, sou eu.

— Que trágico hein. — ele se abaixa também ao meio de tanta gente em nossa volta. Eu reparo sua mão grande, pegando um livro meu.

Noto que usa um bracelete preto e tem tantos anéis em seus dedos que parece um homem de metal.

Usa tênis gastos, pretos, casaco preto. Ele literalmente está todo de preto.

Eu ergo meu olhar até seu rosto e reparo seu sorriso torto.

Ele usa alargadores pretos e pequenos nas orelhas. Tem um nariz empinado, cabelo escuro e um pouco de olheira abaixo de seus olhos claros.

Parece que eu já vi esse olhar em algum lugar. Deve ser de alguma aula.

O garoto começa a desfazer o sorriso. Ele franze o cenho para mim e parece se espantar.

— Algum problema? — eu pergunto sem compreendê-lo.

Ele desvia o olhar do meu e pisca repetidamente.

— Não, não. — ele nega e eu tento voltar ao que estava fazendo segundos antes de encarar o seu olhar indecifrável.

Silêncio mútuo; somente o falatório em volta de nós.

Percebo que suas mãos cheias de anéis pararam de se mover.

Eu olho para o rosto dele e vejo que me encara com os lábios entreabertos. Está petrificado, encarando-me novamente.

Vai ficar aí parado? Olá? Terra chamando Rock 'n' Roll?

— Err... Eu tenho que ir para a aula. — ele semicerra os olhos, ainda me encarando.

No que ele está pensando?

— Ah, ok. — respondo, tentando decifrar seu olhar fixo.

— Tchau. — ele ainda me olha, imóvel.

A Maré das LembrançasWhere stories live. Discover now