Voltas

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Não sei por quanto tempo eu dormi, só sei que quando acordei estava no meio do nada, só tinha mato, cheiro de barro com bosta.

— finalmente acordou — uma mulher bonitona me olhava curiosa, seu rosto me lembrava o de Lauren, o sorriso grande e cabelos compridos e pretos. – eu me chamo Clara Jauregui, sou mãe daquela menor infratora.

— caralho, onde eu fui amarrar meu jegue. Você também é...

— ou o que? Traficante? — afirmei com a cabeça — aqui chamamos de comercio ilícito, sou uma fazenda muito conhecida, plantamos de tudo aqui, temos um dos melhores queijos de minas.

— porque você está me contando isso? Não quero saber da sua vida de merda.

— olha criança, por algum motivo, razão ou circunstância minha filha menos promissora abriu o jogo pra você, eu ja tinha colocado ela na terapia antes para que não roubasse mais, só que Lauren é o cordeiro menos disciplinado.

— onde ela está?

— está esperando Lucia chegar pra dizer que a melhor amiga morreu numa troca de tiros. — me sentei na cama e só então notei que estava com roupas pretas de banda, certeza que eram de Lauren. — venha criança, elas estão lá em baixo. — ela segurou minhas mãos com firmeza enquanto me olhava de cima a baixo.

Ela estava flertando?

Ignorei esse pensamento e foquei na casa, era de madeira maciça, devem ter matado centenas de arvores pra fazer o casarão, Lauren estava na sala de estar enquanto conversava com uma mulher alta e testuda.

— ela amava você, não pode fazer isso!

— ela queria uma vida simples, nós duas e um filho, agora ela se foi e eu não quero o filho! — só então olhei o menino que parentava ter uns seis meses engatinhando perto de Lauren, era tão rechonchudo que só no seu braço tinha cinco dobras.

— Lucia!

— Lucia uma ova! Você a chamou pra aquela merda, agora você se vira! Eu não vou conseguir cuidar do Jonas, não quando tenho que reconhecer o cadáver da minha melhor amiga!

— nem consegue dizer o termo namorada, ou esposa, ou sei lá que merda que vocês duas tinham, você é uma merdinha... — Lucia a olhou puta da vida e meteu um soco no rosto de Lauren.

— Jonas fica com você, ele é um problema seu agora.

— Porque o bebê é problema da Lauren...? — sussurrei pra dona Clara.

— Lauren doou o óvulo já que Veronica tinha um problema hormonal, parece loucura, mas saiba que elas fizeram isso enquanto eu passava uma temporada em Barcelona.

— mãe!

Lucia olhou dona Clara e bufou.

— você Lucia, minha melhor contadora! Amiga de meus filhos, era pra você cuidar da criança e a manter longe do nosso mundo.

— não posso, não sem a Veronica.

— eu compreendo, e sendo assim a criança será criada por Lauren, e essa coisinha aqui — ela apontou pra mim e eu soltei uma gargalhada.

— mas nem a pau! Lauren diga a sua mãe lunática que você me sequestrou e eu estou aqui porque você ameaçou matar minha mãe.

Dona Clara me olhou torto

— LAUREN!

Clara saiu arrastando a branquela azeda pra dentro de um dos quartos enquanto eu e Lucia ficamos nos encarando até eu sentir Jonas tocar meu tornozelo.

— olá carinha que ninguém quer — me abaixei o pegando no colo. — porque vai deixar essa criança com Lauren? Ela é completamente desestabilizada.

— Vero era um unicornio fantástico, seria uma mãe incrível, eu não consigo sem ela.

Coitada daquela criança, só tinha gente doida do lado. Lucia deu um beijo nas bochechas de Jonas antes de sair, pelo jeito a criança era mais apegada a Veronica porque nem ligou quando a mãe saiu da casa.

Alguns minutos mais tarde, depois do menino ter tomado toda a mamadeira e estar tirando um cochilo na poltrona fofa, Clara saiu das profundezas do inferno com Lauren, a palmito com pernas estava de cabeça baixa e eu notei varias escoreações roxeadas nos seus braços, e o soco que Lucia tinha dado ja estava quase preto na sua bochecha.

— peça desculpas a Camila, e chame um helicóptero pra levá-la de volta a sua casa.

Lauren se aproximou de mim e me abraçou pela cintura, seu coração estava tão agitado que eu achei que ela fosse ter um treco ali, então a continuei abraçando, fazer uma boa ação de vez em quando era bom.

— cadê seus irmãos? — eu perguntei baixo mas Clara ouviu.

— Taylor está morta, Christopher está num MBA no Canadá. Interessante perguntar deles.

— sua filha é uma péssima mentirosa. E o pai?

— morreu primeiro, Taylor morreu tentando ajudá-lo — Clara dava umas respostas que mais pareciam cortes da tramontina. —  e sim, Lauren nasceu intersexual, ela gosta de usar sua história triste para convencer pessoas de bom coração, eu paguei a cirurgia plástica pra que ela não morrece em depressão. Vamos providenciar um caminhão igual ao seu, e se você quiser continuar transportando nossa mercadoria, sinta se bem vinda a família.

— deus me livre — gargalhei negando — vocês só se dão mal, ou vão acabar mortos ou presos.

— meu pai tem noventa e oito anos, ele que arquitetou tudo isso, até hoje ele nos ajuda.  — Clara deu de ombros enquanto ascendia um cigarro.

— eu preciso ir embora Lauren, to doida pra ver minha mãe e me livrar de vocês. — olhei sobre o ombro de Lauren e Clara estava me olhando com malícia, agora deu!

— não quer levar essa criança? — Clara ofereceu — um bebê aqui não seria adequado. Lhe ofereço uma pensão mensal, trinta por cento do salário da Lauren.

— mãe!

— por deus, eu não vou ficar com uma criança!
.
.
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Algumas horas mais tarde eu estava num helicóptero com Lauren do meu lado segurando um bolsa cheia de dinheiro e um bebê.

— tem certeza que quer fazer isso? Posso deixar ele num abrigo.

— o máximo que posso fazer por Vero... criar seu catarrento já que ela se jogou na minha frente e salvou minha vida. — o bebê estava numa cadeira de transporte muito bem equipada no cinto de segurança da aeronave, ele nos olhava puto da vida, parece que reconhecia nossas falas. — complicado vai ser explicar pra minha mãe que eu sai por alguns dias e voltei com uma criança, logo ela que me avisa desde que me entendo por gente sobre os benefícios da camisinha. — ajustei o fone anti ruído nos ouvidos de Jonas enquanto o copiloto nos avisava que ia levantar vôo.

Eram quase três horas da tarde, chegaríamos em uma hora num heliporto perto de osasco de lá Lauren ia chamar um uber pra me levar até em casa, Jonas pareceu odiar tudo aquilo, agora ele não só nos olhava puto como fazia bico e chorava.

– deve ser a pressão sabe — Lauren começou a falar tentando lhe oferecer comida — ele não era de chorar quando estava com Vero.

— deve ser porque ele saiu de dentro da Vero enquanto nós duas somos completa estranhas né? – debochei e Lauren bufou, seria um vôo muito longo.

Minhas informações eram, Lauren não era um peixe pequeno, por isso Vero foi de isca, Clara além de "comerciante" era uma fazendeira conhecida e renomada, mas parecia ter imparcial e um pouco empatica? Talvez só comigo, porque não demonstrou apego ao neto biológico, e Lauren? Ela ainda era uma estupida burra.

UMA CAMINHONEIRA SEM FREIOWhere stories live. Discover now