Capítulo 6

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2016

Agosto

Eu não consigo pegar no sono.

Solto o ar com força e me viro pela milésima vez.

Abro os olhos e encaro as estrelas pintadas no teto. Minha mãe e minha avó pintaram-nas juntas quando eu tinha apenas 1 ano. Confesso que não me lembrava de serem assim tão delicadas. 

O quarto, ou deveria dizer o sótão que virou quarto, é grande e cheira a poeira. O colchão continua afundando no meio, mas os travesseiros parecem novos.

Pouco mudou, ou quase nada, ainda assim há um incômodo no meu coração. Algo que faz com que eu me sinta uma farsa, como se eu não tivesse o direito de estar aqui. Como se fosse uma invasora, tomando o lugar de um outro alguém.

Meu coração palpita querendo pular fora do peito. Sinto-me, ao mesmo tempo, deslocada e em casa. O que é loucura! 

A verdade é que nunca pensei que voltaria a me deitar nessa cama depois de perder minha mãe. Não fazia muito sentido estar aqui sem ela. Continua não fazendo.

Decido me levantar porque sei que não vou conseguir dormir de jeito nenhum; visto um roupão, uma touca cor-de-rosa, minhas botas e saio do quarto.

O vento estava cortante e o céu escuro como se imerso em seu próprio sono, a única coisa que me reconfortava eram as estrelas brilhando lá em cima. Eu tinha me esquecido da imensidão delas. Respiro fundo, o ar é tão pesado que penso que vou desmaiar e morrer congelada, mas então algo dentro de mim vibra e me aquece.

Vou me afastando da casa principal, mas não sem contemplar a construção antiga. O térreo é cheio de portas francesas, que pelas manhãs ficam escancaradas e dão de cara com um gramado imenso permeado pelas roseiras da vovó. 

O amplo cômodo era dividido em sala de TV e de jantar; de um lado um sofá comprido e três poltronas mais uma televisão; do outro, uma mesa comprida cheia de cadeiras, um armário de pratos e copos, e um gaveteiro para os talheres. Seguindo um corredor encontra-se a enorme cozinha com vista para o vale que se estendia do lado oeste da propriedade, lá se realizavam trilhas e passeios.

O primeiro andar, com suas janelas de madeira escura, era onde se localizavam os 5 quartos e os banheiros espaçosos e antiquados. O segundo andar, também conhecido como sótão, era o meu quarto. 

O topo da casa tinha um formato triangular e uma janelinha redonda, emoldurada da mesma madeira escura das do andar inferior, só para dar um charminho.

Do lado da casa de madeira há um chalé de três andares, onde os funcionários que moraram no haras, dormem e passam o seu tempo livre. No térreo há uma porção de jogos, como: mesa de ping-pong, de sinuca, um tabuleiro de alvo para jogos de dardos e uma mesinha para jogar cartas. No primeiro e no segundo estavam localizados os quartos e banheiros. 

Oposto ao chalé, em um espaço vazio do gramado, havia uma porção de cadeiras e o que me pareceu restos de uma fogueira. Perto dali um lindo pé de jabuticaba parecia uma assombração escura.

Sorri observando a harmonia enigmática que a noite trazia para aquele lugar, guardado em minha memória com tanta luz e calor. Eu mordi os lábios e segui o caminho de pedras que levava até uma área cheia de árvores. 

Logo avistei a casa de jardim estilo gazebo e, na calada da noite, os pequenos gritinhos infantis que escapavam meus lábios quebraram o silêncio sepulcral. 

Quase sem fôlego, parei na frente da estrutura arredondada de telha e madeira; meu avô construiu esse gabezo para a minha vó, como presente de casamento. Foi aqui, também, que meus pais prometeram que se amariam para todo sempre... Com todo o respeito que se tem por esse tipo de história, subi os dois degraus de pedra e fui tomada por uma emoção inexplicável. Minhas pernas ficaram, de repente, pesadas, e meu peito se encheu.  

Imperfeitamente Perfeito para MimWhere stories live. Discover now