Capítulo 15

385 54 15
                                    


Na ausência do decorrer dos dias, Lex se faz cada vez mais presente. Não digo das ligações infindas ou das mensagens insistentes que manda sem hesitação ou timidez. Das palavras amorosas que as vezes vislumbro pelo celular e me seguro para não responder, as palavras acusatórias da minha própria filha ainda a ressoar em mim...

Velha.

Desde quando a idade limita os amores?

Mas a presença de Alexandre, que pulsa em mim e toma conta é a da imaginação, do corpo que reclama, fazendo-me lembrar com saudade daquilo que afastei de mim. Ela me possui a alma e toma conta da minha criatividade e movimentos diante da tela. A voz da tinta só se mantém firme e articulada quando pinta os traços e gestos dele... Traça curvas como o seu andar felino e ritmado, sobe e desce como o corpo dele fazia sobre o meu, pulsa e cresce, toma forma, vira vento e impulso. Em uma terra vejo os olhos de tempestade, no outro o revolto dos cabelos, em certo detalhe o dourado que me lembra da pele que beijava, numa mescla de suor e cio. Partes da minha memória se fragmentam para celebrá-lo, para que meu coração nunca se esqueça do homem que um dia amei... Sepulto o sentimento ao passado, para que possa viver de luto o meu presente. Pois do futuro, esse jovem e inocente momento, nada espero.

E aos poucos, através da arte, volto a respirar... Não com o mesmo fulgor de antes, onde o suspirar se mesclava aos gemidos do sexo incauto e prazeroso, mas encontra um ritmo próprio. Começo então, aos poucos, a desfazer os nós. Atendo primeiro a minha filha, que me pede desculpas, as quais eu aceito sem hesitar. Que mãe não perdoa aquela que é parte do próprio coração? Mas por mais que tente esquecer, as palavras ainda estão ali, no ar, entre nós, a me limitar como uma ferida que ainda arde nos pés, impedindo-me de andar adiante. Pergunta sobre mim, meus trabalhos e projetos, mas Lex é deliberadamente descartado, omitido, como algo vergonhoso a não ser lembrado. Esse gesto, mesmo que pareça impensado em alguns momentos, me fere, magoa, mostra a maneira com que julga a situação sem pensar na minha felicidade.

Meus amigos me mantinham sã, à tona diante da reclusão que me autoimpusera. Enquanto Pati me respondia meus e-mails falando sobre minha recuperação pessoal, lidar com a sombra que me habitava e teorias zen, trazendo a sua face holística à tona, Danilo me ligava e aplicava suas teorias de choque, as verdades sejam jogadas em mim sem contenção ou receio, fazendo com que eu confrontasse aquilo que evitava ou fugia.

— Vanessa, quando você vai se lembrar de que não é atriz e sair desse palco?

— Do que está falando, Dan? Que palco, tá doido? — com o telefone em uma mão e um copo de chá gelado na outra, me sento em frente a televisão para ver um episódio da minha série favorita de ficção científica.

— Então pode parar de fazer papel de trouxa!

Dou uma risada seca diante da acidez habitual dele ao ficar nervoso. Danilo não se conforma de eu continuar fugindo do meu sonho de consumo, segundo ele. Três meses se passaram desde a última vez que nossos olhares se cruzaram, naquele desastroso encontro... A mente e o coração em constante duelo, hesitante diante do próximo passo.

— O que acha que devo fazer, Danilo? Largar tudo e tentar descobrir se aquilo que ele diz sentir é verdade ou encenação?

— E porque não? O que tem a perder? O que não posso admitir é você fugir quando todas as coisas que precisa para ser feliz estão ali, ao alcance da sua mão.

— Dan, o Lex é só um sonho lindo que veio aquecer o inverno da minha existência... Algo que me fez bem, e deu certo durante um tempo, enquanto tínhamos papéis prontos e delimitados para atuar, barreiras que nos deixavam seguros.

O GarotoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora