Voltando às Aulas

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          Nosso Opala fundiu o motor no meio do caminho e tivemos que ir a pé para casa. Eu simplesmente não entendo o que acontecia com esse carro. Uma hora ele está perfeito, maravilhoso como se fosse um 0 km, e, alguns dias depois, após eu bater no máximo em uns três postes e esquecer de trocar o óleo, essas coisas acontecem. Eu sabia que ir ao posto mais barato da cidade daria nisso...

          Agora, eu e Natto subíamos o aclamado Morro dos Infortúnios, bairro onde ficava nossa falida mansão. Esse nome, aliás, queria dizer exatamente isso: apenas idiotas azarados como nós dois moravam ali. Na verdade, aquele lugar era tão amaldiçoado pela população local que nem mesmo os pobres queriam morar ali. Dá pra acreditar? Podia ser só superstição, mas os desabamentos eram constantes e toda vez que chovia, alagava. Se você tentasse subir o morro de carro, o motor morria (foi assim que nosso Opala morreu). Se alguém tentasse ir a pé, escorregava no meio do caminho. Em contrapartida a esse azar todo, as casinhas eram lindas como num vilarejo europeu.

          Vilarejo europeu em pedaços, já que nossa casa era um criadouro de ratazanas. O que mais eu poderia pedir?

          — Alguém precisa de um suco de maracujá — disse o chefe, enquanto subíamos a Estrada da Discórdia (assim nomeada por mim). Sobre nós, caía uma chuva danada com trovões nervosos que retumbavam ao longe. — Qual é o problema, Ártemis?

          — Nada. Eu só gostaria que a gente morasse num lugar melhor. Já não está na hora de nos revelarmos ao público e conseguir a fama que merecemos?

          — Não se preocupe. Tudo vai mudar, assim que nós pegarmos nosso próximo integrante...

          Ele subiu o resto do morro cantarolando. Socorro, por que eu fui concordar com aquilo? Meu Cavaleiro era otimista e ingênuo ao extremo!

          — E como você pretende encontrar essa tal Arma, chefe?

          — Não sei. Vou perguntar para a Suellen.

          O Sr. Natto estava falando da criadora do Gene da Síntese, a Deusa da Sorte: Suellen.

          Não, esse não era o nome real dela, mas o chefe tinha problemas com apelidos. Ele só acertou comigo, porque realmente me achou formidável como uma deusa grega. Bem, quem podia culpá-lo, não é mesmo?

          Já a sábia de quem eu falei antes, a toda poderosa Suellen, era responsável por nos ajudar quando tínhamos alguma dúvida em relação ao nosso organismo. Dizia ela, além de ter criado a magia presente no gene, que tinha o poder de dar sorte e força a quem quisesse, mas não podia mais fazer isso por conta de uma rixa com sua irmã. E quem poderia entender os Deuses, não é?

          Encharcados, chegávamos à nossa doce mansão, que nos recebeu com divina graça: a porta rangeu e caiu quando Natto tocou a maçaneta. Juntos, fizemos o exercício de reerguê-la, entramos e nos enxugamos com uma toalha no mancebo.

          Tudo estava escuro, mas havia um ponto da sala bem iluminado. Era a sessão do cômodo conhecida como "Templo", que não tinha nada, além de traças e um enorme armário com portas repletas de hieróglifos entalhados.

          A luz iluminava a sala pelas frestas, de onde também vazava um vapor quente.

          — Está nos esperando? — perguntou o chefe.

          — Sim — respondeu uma voz reverberante. — Estou bem aqui.

          Ela precisava mesmo fazer todo esse show todas as vezes que tínhamos que conversar?

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