Casos de família

Start from the beginning
                                    

- Tinha? Então ela...?

- Sim, morreu ano passado. – havia pesar na voz e expressão de Ricardo – Foi... câncer de mama.

- Sinto muito – alisou o braço dele – Você... gostava dela?

- Eu a adorava. Ela foi quase uma segunda mãe para mim, além da Glória. Costumava me visitar toda semana.

- E... como ficou Roberto?

- Arrasado. Foi uma das poucas vezes que eu o vi sem aquele ar insolente no rosto. Por pior que seja meu primo, tenho que admitir o quanto ele amava a mãe dele... – assentiu como se falasse para si mesmo – Voltando ao meu pai, ele continuou se esforçando pra chegar longe, mas nunca perdia de vista os cuidados com minha tia, a ponto de controlar sua vida amorosa. Ele não a deixava namorar.

- Nossa!

- Pois é. Mas segundo ele, estava querendo protege-la de acabar com um bêbado como o pai deles... ou coisa pior. E quando começou a acumular sua fortuna e a ser conhecido, ele considerou que minha tia podia ficar mais vulnerável e ser presa fácil de algum vigarista se todos soubessem do seu parentesco. – Ricardo balançou a cabeça – Nunca vou entender esse homem. Ele não permitiu que minha tia terminasse os estudos para poder tê-la sob seu controle, mas ao mesmo tempo, resolveu que para protegê-la teria que afastá-la. Claro, ele a teria longe, mas ao mesmo tempo controlada. Alugou um apartamento muito bonito num outro bairro e contratou uma governanta e um guarda-costas para cuidar dela, vigiar seus passos e relatarem tudo para ele.

- Que loucura! Como sua tia aguentou tal situação?

- Minha tia lhe tinha respeito... e gratidão por sempre lhe proteger do pai deles. E até certo temor, talvez. Eu o notei quando a visitava e conversávamos sobre meu pai. Mas ele perdeu um pouco a mão... depois que se casou – a expressão de Ricardo se anuviou – Ele tinha outra mulher para controlar... e acho que pensou que se tinha conseguido afastar os homens da vida de minha tia àquela altura... com ela já com mais de trinta anos... e com os velhos empregados que a vigiavam tendo demonstrado lealdade por tantos anos, deve ter achado que podia sossegar... e se concentrar na senhora Maria Carmen Fontes Guerra. Mas meu pai nunca entendeu o coração das mulheres, mesmo cercado por inúmeras – Ricardo soltou um riso curto e amargo – Talvez teria evitado que a esposa o deixasse...

- Ricardo...

Letícia ia interrompê-lo, pois via a amargura e a dor em seu rosto, mas ele levantou a mão e balançou-a.

- E não teria perdido minha tia de vista. - continuou – Não que ele deixou de lhe ver, mas a frequência que era de três vezes por semana caiu para duas vezes por mês.

- Entendo. E sua tia se sentiu sozinha e abandonada?

- Especialmente por ele não lhe ter convidado para o casamento. Ele alegou que foi para os repórteres não a descobrirem.

- Meu Deus! Que cana... – Letícia se interrompeu – Desculpe, Ricardo.

- Não. Meu pai era mesmo um canalha – Ricardo completou com um sorriso – O pior dos canalhas. Tudo e todos que ele tocava, conseguia estragar, inclusive o afeto que tinha por minha tia. – suspirou – O bom que ela nunca deixou de ser uma pessoa admirável apesar de tudo que lhe aconteceu.

- E foi por essa época que ela... conheceu o pai do Roberto?

- Foi. Um maldito vigarista que se informava de tudo. Flávio Souza Carvalho era seu nome... ou o que ele alegava. De alguma forma, por mais precauções que meu pai tenha tomado, não conseguiu evitar vazar alguma informação sobre ter uma irmã, mesmo que nos bastidores... e para o conhecimento de poucas pessoas.

Perigosas LembrançasWhere stories live. Discover now