03. a fragilidade das alianças

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O relógio do campus bateu 18h15 quando Érico chegou nos arredores da cafeteria chique que ficava ao lado da biblioteca. Nervoso, Érico passou o muffin que segurava para a mão esquerda, abrindo as portas envidraçadas do lugar com o coração aos pulos.

Para um final de expediente, a cafeteria metida, como Isabel havia pontuado, estava vazia. Se não fosse por três mesas ocupadas, tudo estaria em silêncio. Érico observou o ambiente hipster, que tinha tudo para aparecer em revistas de decoração, à procura de Isabel. Não demorou a encontrá-la.

Na última mesa do canto, Isabel tinha diante de si dois livros abertos, uma xícara de café pequena com a marca da cafeteria e algumas folhas soltas espalhadas, que consultava vez ou outra. Com a atenção que vagava entre os livros e as folhas, Isabel fazia anotações num caderno de espirais brancas. Érico se aproximou devagar, mas como uma corça assustada, ela fechou o caderno e os livros antes que ele chegasse mais perto. Ficaram os dois em silêncio, ela sentada, ele em pé ao lado da mesa.

Sem graça, Érico pigarreou e ajeitou a alça da mochila no ombro.

— Oi. Me desculpa o atraso.

Ela não respondeu, tomando ciência das palavras dele com um olhar gelado. Enquanto Isabel guardava as folhas, os livros e o caderno, Érico sentou-se diante dela, no assento que tentava — e conseguia — imitar um sofazinho de couro chique. No silêncio das máquinas de café que ronronavam, ele deixou o muffin em cima da mesa, empurrando-o na direção de Isabel.

Ela baixou os olhos para as gotinhas de chocolate e para a massa fofinha de baunilha, encarando Érico logo em seguida.

— É um muffin — disse ele, daquele jeito atabalhoado que sempre florescia quando Isabel o encarava. — Fiz no Laboratório. Fiz pra ti, na verdade.

— No Laboratório?

— É. Os alunos de Gastronomia podem ser voluntários à tarde, sob o comando de um professor, e aprender algumas técnicas de cozinha — disse ele. — A área de confeitaria tava meio parada hoje, aí decidi... fazer esse muffin pra ti.

Ela ficou em silêncio durante alguns segundos. Por fim, perguntou:

— Por quê?

— Pra me desculpar por hoje. Fui um idiota mais cedo.

Isabel não respondeu. E não tocou no muffin.

— Ok — disse ela, após muito tempo. — Te decidiu?

— Sim, eu... — Érico suspirou, dando de ombros. — Eu preciso do dinheiro e não tenho como conseguir de outra maneira.

Ela o encarou, ainda sem encostar no muffin que Érico levara boa parte do dia para assar e deixar perfeito, como todos os muffins de perdão deveriam ser. Nervoso, ele pigarreou, tamborilando os dedos na mesa bem encerada.

— Então...

— Eu não vou te dizer.

— Do que tu...?

— Tu quer saber por que eu preciso do dinheiro. E tá louco pra me contar os teus motivos pra querer o dinheiro.

Ele riu de nervoso.

— É claro que não. Quem foi que te disse essa bobagem?

— O teu corpo — respondeu ela. — Tu não parou de bater os dedos na mesa desde que chegou, o que indica nervosismo e ansiedade. Isso sem mencionar os ombros inclinados pra frente e o olhar que alterna entre mim, o cupcake e a rua. Tu quer saber por que eu preciso do dinheiro, mas não quer perguntar. Tu também quer me dizer por que precisa, mas prefere esperar pela minha pergunta. E ainda por cima tentou me comprar com um bolinho. Foi uma jogada bem... básica.

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