XIX - Intuição e Cautela

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Marcus levantou na penumbra. Se vestiu e sentou na cama admirando seu amado que ainda dormia profundamente.

A outra cama estava vazia e sobre o leito entre elas, Tristan também dormia. Marcus não tivera muito tempo com o garoto que ainda parecia bastante desconfiado. A noite anterior ficou dividida entre o tempo de espera do jantar e até o momento em que ele e Escar tiveram certeza de que o menino dormia para se deitarem juntos.

Escar e Tristan conversaram por algumas horas na língua livre. Pareciam recordar algumas coisas de suas vidas e Marcus somente os observou, como fazia agora. Sentiu um aperto em seu coração no conflituoso desejo de despertar ou não aos dois para uma despedida. Até que esticou a mão e tocou suavemente o rosto de Escar e relutante deixou o quarto.

Giusepe e sua esposa lhe entregaram algumas provisões para a viagem. Um belo garrano foi preparado para ele, segundo o homem maduro: o mais veloz de toda a região. Além do filho mais velho de Giusepe, outros três rapazes em suas montarias estavam a postos ao longe no limite onde findava o vilarejo.

Fora decidido que eles acompanhariam Marcus até a floresta dos pinheiros onde corpos e cabeças ainda eram pendurados como oferendas, embora, poucos grupamentos ainda mantivessem o costume macabro além dos mupantes. Não havia muito com o que se preocupar.

A real preocupação estava para o outro lado da muralha. Alguns archotes ainda tremulavam ao vento enquanto o céu começava a receber suas primeiras tonalidades indicando que logo o sol iria aparecer. Marcus recebeu um forte abraço da emotiva Olda, esposa de Giusepe, que o fez lembrar de Megara. Sentiu saudades da mãe.

As filhas do casal, juntamente com outras moças cochichavam e sorriam para ele. Outros aldeões também acompanhavam a despedida. Giusepe o abraçou dizendo.

- Nobre Àquila. Eu é quem deveria acompanhá-lo, mas receio não possuir mais tamanha vitalidade para isso. - separou-se dele e olhando para as garotas à porta voltou a fitá-lo dizendo. - Pense no que lhe propus. E se não se agradar mais de Roma, há sempre um lugar para você aqui.

- Eu agradeço por tudo, nobre Giusepe de Nápoles. Espero vê-lo novamente ainda neste mundo.

Marcus montou o belo animal e seguiu com os outros jovens. Em pensamento pedia para que Escar e Tristan ficassem ali em segurança e guarnecidos somente em seu passado.

***

Após deixarem a enorme floresta o grupo chegou a um local por onde Marcus já havia passado e lembrava muito bem.

Tudo permanecia exatamente do mesmo modo de quando esteve ali meses atrás, dos objetos às plantas. A relva baixa e nenhum vestígio de animais ou de pessoas podia ser notado. Nada além do que já compunha a paisagem quase que eternamente havia ali.

Marcus desceu do cavalo e caminhou até alcançar os primeiros objetos lapidados espalhados pelo solo em meio a relva. Ainda estava cedo e havia muitos quilômetros a percorrer, mas algo lhe dizia para ir até ali.

Ao olhar para trás notou que os quatro rapazes permaneciam em suas montarias mantendo certa distância dos destroços. Os próprios animais pareciam desconfortáveis em estarem ali. Estefan, o filho mais velho de Giusepe, um rapaz de cabelos claros e longos também deixou sua montaria e foi até ele dizendo meio receoso.

- Noubre Àquela, melhorr partirr. Terra sagrada. - O rapaz não lembrava em nada um romano e tinha um pouco de dificuldade com o latim. - Aqui serr terra dos morrtos.

Marcus olhou ao redor buscando algo que o lembrasse dos campos destinados aos mortos por onde havia passado em suas incursões. Viu diversos tipos, mas nenhum se comparava a este.

A Águia (EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora