The other side

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*Bianca's pov*

Hora de apresentar meu lado da história. Sou Bianca Mitchell, formada a dois anos em Psiquiatria, curada a 8  anos de uma síndrome de transtorno bipolar afetivo tipo II, e limpa a 8 anos de medicamentos fortes, que me submeteram à um baita vício.

É isso que comemoro hoje, 27 de junho de 2018, meu aniversário, e também o dia em que celebro 8 anos de restauração. 

Devem estar se perguntando se bipolaridade tem mesmo cura. Olha, são anos de tratamento, o médico nunca disse diretamente "Você está curada", o que ouvi foi um "Você está muito melhor. Poderá ter uma vida normal", e essas foram as palavras que me motivaram a chegar onde cheguei. 

Com apenas 19 anos, iniciei a faculdade de psiquiatria. Porque? Bem...

Desde meus 7 anos de idade, eu era a verdadeira capeta em forma de criança, eu já fiz tantas garotinhas e garotinhos chorarem. Fiz meus pais chorarem, e olha que eles nem desconfiavam da minha sexualidade, calma...eu chego lá. 

Minha mãe foi chamada uma vez na escola, por minha causa, a diretora alegou que eu tinha me exaltado com uma atividade em grupo com uns coleguinhas, eu cortei o cabelo de uma garota e fiz ela mastigar. Talvez isso realmente não seja coisa de uma criança normal de 7/8 anos.

Desde essa reclamação, minha mãe me curava (ou tentava) a base de surras. Teve um tempo em que ficou frequente, parecia até que ela tinha um alarme avisando a hora certa de me surrar com a maldita havaiana, ou com uma folha de... como é o nome? Ah, espada de São Jorge! Dói só de relembrar. 

Continuando... Não foi a última reclamação. E minhas crises só pioraram, tanto na escola, quanto na rua, ou até em casa. 

Os anos passaram, e eu tinha feito 12 anos. Fui mandada pra um reformatório estupidamente fedido e grotesco, sem dúvidas foi a pior experiência na minha vida... 

Eles não entendiam o porque de eu ser assim, pra eles eram birras, pra eles eu era só uma menina mimada. Lembro-me como se fosse ontem, quando minha mãe, depois de 6 meses, veio me buscar com lágrimas nos olhos na porta do reformatório. Eu estava acompanhada com uma mulher imensa de gorda, ela fedia costela de porco, tinha os cabelos loiros amarrados em um rabo de cavalo, cobertos por um boné, e suas bochechas eram sempre coradas. Ela me fazia andar depressa com seu dedo cravado nas minhas costas. Mamãe me olhou de cima a baixo, e devia ter pensado "o que fizeram com minha garotinha?", quer saber? Fizeram muitas coisas, cortaram meu cabelo, fizeram com que eu limpasse vômito, eu bebi, e usei drogas que garotas mais velhas conseguiam clandestinamente, me fizeram até uma tatuagem, era um simbolo de delta na nuca, significando que a porra da minha vida tinha mudado, e iria viver em constantes mudanças. Além disso, perdi muitos quilos, eu estava magra, alta e... bom, mais revoltada do que antes.

Ela me fitou, abraçou-me, balançou sua cabeça negativamente e me levou pra casa. Naquela noite, eu não fui recebida como gostaria, meus pais brigaram por horas, era muita gritaria, por minha causa é claro. No dia seguinte estava lá, minhas malas prontas e eu só pude pensar: "Pra onde eu vou agora?". Eu fui internada, isolada de tudo e todos. Por anos, me tratei, mas o sentimento de ser incompreendida, de ser rejeitada pela própria família não saia da minha mente, eu chorava todos os dias, sofria com a abstinência das drogas e tudo mais.

17 anos, o médico disse que eu estava melhor e eu sai de lá realmente melhor! Eu estava com outra mente, eu queria que nunca ninguém passasse o que eu passei nesses últimos anos. Fui morar com uma tia minha, e só quando eu consegui entrar numa boa faculdade, minha mãe veio atrás... dizendo o quanto estava orgulhosa. Eu a perdoei, juro. Mas não me perdoou por ter feito ela passar poucas e boas por mim. 

Vários ocorridos ocorreram desde então, tive muito sucesso na faculdade, mas a vida dá dessas de dar umas rasteiras, e eu acabei engravidando do Maxwell, num ato burro, e errado. Foi estupro, mas ninguém acreditou. Foi quando me assumi ser lésbica, e minha mãe enfiou um cara na minha vida, pra me forçar a "virar mulher". Ela nunca me aceitou.

Até a poucos meses eu não olhava para o Max, e acabei cometendo o mesmo erro que minha mãe... Eu o coloquei numa clinica com pessoas extremamente problemáticas, não o aceitei. Eu sai da faculdade querendo fazer o bem pra todos, ajuda-los...mas não fiz isso com meu próprio filho, não do jeito que ele merecia. 

Max não tem um pai presente, e eu sinceramente não quero o pai dele presente. Ele é tudo que eu não fui, mesmo com seu pequeno problema de saúde. É um garoto simpático, cuidadoso, carinhoso e a sorte dele (e minha) foi ter conhecido Jullie Martins. E é ai que mais uma vez minha vida voltou a sair dos trilhos.

Peguei o caso de Jullie, numa tarde de 2017, quando uma mãe desesperada pede para a recepção passar sua ligação para mim. Eu consegui abrir meu consultório muito pouco depois que finalizei meu curso, mas é claro que eu não tinha muita experiência... Não para tratar de Jullie. 

Quando atendi o telefone, foi essa súplica que ouvi:

 " - Doutora, te peço pelo amor de Deus que deixe minha filha te ver. Eu não sei mais o que fazer com ela."

E quem imaginaria que essa ligação viraria minha vida de cabeça pro alto? Era pra ser só mais uma paciente, e no começo foi. Minto. Nunca foi. Jullie chegou um dia no meu consultório, e eu achei que ela iria me esganar, mas não... apesar de ser brava na maioria do tempo, criamos um laço muito legal para a situação, ela parecia ficar mais calma quando conversávamos. O tratamento dela sempre foi muito puxado, não podíamos deixa-la sair do controle. 

Hoje, ela está com 18 anos, está muito melhor... mas ainda não está "curada". Minha meta com ela, era a de vê-la sair da clínica e começar sua vida tão bem quanto eu. 

Era só isso, eu juro. Porém, minha mente mudou. Ela mudou. 

Jullie conheceu meu filho. Jullie conheceu parte da minha vida. Jullie começou a ser bem mais que uma paciente pra mim, no momento em que me peguei trancada no meu quarto pensando nela. E eu já não queria deixa-la partir. E eu já não queria me ver sem ela. 

Martins sempre foi drasticamente incrível comigo e com meu filho, mesmo quando não mereci. E eu queria mesmo levar ela pra longe daqui, mas Robert, meu atual namorado e reitor do lugar em que trabalho, estragou meus planos. Eu sei do quão canalha ele é. E do quanto eu também estou sendo em deixar meus verdadeiros objetivos e prioridades por um cara escroto.

Eu me apaixonei por uma paciente, transei com ela, e insisto em viver numa mentira. E o que virá daqui pra frente... Será surpresa, tanto pra mim, quanto pra quem acompanha essa história de maluco.

PsicoLove.Where stories live. Discover now