do you hear me?

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Acordei, estava tudo escuro, o que me fazia enxergar era apenas o vão da porta, com a luz amarela do corredor. Tudo em silêncio, só podia ouvir o aparelho ligado ao meu dedo, dedurando os batimentos calmos e ritmados do meu coração. Ousei a levantar meu braço direito, mas estava dormente, fitei-o percebendo o ligamento a soros e medicamentos. Parecia que eu estava reservando minha alma ali. O que tinha acontecido? Pigarreiei. E do canto da sala, sentada numa poltrona velha creio que desconfortável, imaginei o quanto sua escoliose doía e por quanto tempo ficara ali, mamãe despertou:

- Mamãe?

Quase sussurrei, minha cabeça doía. Mamãe se levantou, fechando seu casaquinho 3/4, colocou uma mecha de seu cabelo atras de sua orelha, e já em meu lado, passou a mão delicadamente por minha testa, com expressão piedosa, estranhei. Aspen me olhava dessa maneira somente quando a coisa estava realmente feia. Suspirei e ela se manifestou com voz embargada, como se já houvesse chorado litros:

- O que foi que houve?

Tentava recordar-me de algo, ou tentar entender do que é que se tratava sua pergunta, para ter resposta da minha que era...

-P-Porque estou aqui?

Pude ver seu desconsolo ao concretizar suas suspeitas de que eu não recordaria de absolutamente nada. Ela puxou uma cadeira ruim, barulhenta arrastando pelo solo me fazendo esboçar uma careta. Entrelacei minhas mãos em cima de meu baixo-ventre aguardando a mulher desenrolar. E assim o fez puxando seu ar profundamente e soltando logo depois pelas narinas:

- Você surtou, surtou novamente. Não se recorda de nada? Você simplesmente destruiu a sala da Doutora Bianca, se machucou inteirinha, Jullie.

Marejou teus olhos novamente. Sentia vergonha de mim mesma, ela estava indecifravel, deduzi desgosto, tristeza ou... talvez arrependimento de ter colocado uma criatura como eu, nesse mundo.

- Eu.. Eu fiz mesmo isso?

Ela assentiu, colocando a palma da mão em frente sua boca, segurando seus prantos.

- Me perdoa...

- Está tudo bem - sorriu fraco - Mas terá de ficar aqui por um tempo.

Me assustei, espera... onde eu estava? Num hospital, suponho. Mas no que enfermeiras e clinicos gerais me ajudariam? Será que fraturei algo... verifiquei. Nada. Será que perfurei algum orgão? Olhei pra ela, sem entender.

- No hospital? Para que?

- Não filha...  - buscou maneiras de falar e logo se abriu - Estamos numa clinica psiquiatra, ficarão tratando de ti por algum tempo.

Despedacei-me. Estou louca. Acham que estou louca... Engoli algo que parara em minha garganta. Tentei conter o choro:

- Ficarei sozinha?

Ela gesticulou positivamente, mas logo me acalmou:

- Virei te ver todas as tardes. Mas creio que ficará bem com ela...

Tirou de sua bolsa "mágica" (apelidava-a assim, por sempre conter algo la dentro que me faria sorrir), uma de minhas bonecas, Anne, a mais delicada, cabelinhos escuros, sardinhas charmosas nas bochechas gordas, vestidinho rodado, xadrez, azul marinho, boina escura, duas tranças, repartindo de maneira exata o meio de seu cabelo, e uma franja tão fofa e... bom, esbocei um sorriso fraco, e peguei a boneca, com dificuldade para mexer o braço, coloquei-a em meu rosto a molhando com minhas lagrimas incessaveis.

- Quanto tempo?

Perguntei interropendo o momento, ela desviou o olhar de minha mão nas costas da bonequinha e me olhou:

- Algumas semanas. Seja boazinha, eles cuidarão bem de você.

Sorri falso, meus olhos pesavam... os fechei sentindo um beijo afetivo em minha bochecha dolorida, e adormeci, com lagrimas secando em meu rosto.

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Abri meus olhos repentinamente, quando senti uma agulha saindo de meu braço, gemi:

- Aii !

Elevei meu olhar das mãos que me tocavam sem delicadeza alguma, a uma das auxiliares do manicomio, expressando minha dor e desconforto.   Se redimiu:

- Oh, me desculpe... já estava na hora de acordar. Como se sente?

Voz doce, sorriso meigo. Mais uma sonsa, controlei meu rolar de olhos e resmunguei:

-To legal.

Olhei ao redor. Outro ambiente de defunto, tudo branco....sem decoração alguma, o que é que tinha de errado com as outras cores ou um quadro, sei la...?
Me sentei, já livre de todos os fios e canos que me possuiam minutos atras, observei mais uma mulher no canto do quarto, tinha estatura baixa, loira, olhos escuros, magrinha... anotando qualquer coisa em uma prancheta. Cada dedo que me movia, ela anotava, me contive e olhei pra cama, os lençóis amassados e Anne, onde estava?

- Viu, uma... uma boneca, por aqui?

Perguntei soltando um suspiro, meio desesperado.

- Está na gaveta. - apontou para uma cômoda marfim, sem graça - Suas coisas estão organizadas aqui.

Sorri forçada e me levantei, recebendo um toque em meu braço me repreendendo, olhei torto, interrogando-a com o olhar, ela entendendo, balbuceou:

-Com cuidado, está fraca, sem alimentação.

Assenti ironicamente, tirando sua mão emborrachada pelas luvas dali, caminhei até uma porta, deduzindo ser o banheiro, e percebi a loirinha me seguir. Parei. Bufei:

- Vão ficar me vigiando, a todo tempo? Vão querer me ver urinar também?

Abri meus braços, expressando sarcasmo com um sorriso mais sórdido ainda estampado nos lábios. Vi a mão da morena tocar a prancheta da outra que travara teus passos ali, assentiu pra que eu fosse concluir o ato no banheiro, e assim o fiz, exautada, bati a porta e me sentei no vaso com a tampa fechada, segurando o choro. Seria ali que eu me curaria... ou apodreceria ainda pior? Apertei meus olhos contra minhas mãos, exprimindo um grito alto, sem me preocupar com quem ouvira ou não. Me encostei na parede, coloquei os pés na tampa, abracei meus joelhos e pus-me a chorar.

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