17. cite o que dói mais

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17. cite o que dói mais

     Eu levantei e peguei meu laptop, voltando pra cama logo depois. Abrindo o arquivo compartilhado fiquei encarando a última cena que tinha escrito sobre o romance de Érica e Valentin, onde a protagonista não parava de falar com o seu amante, alguém que examinava ela com olhos interessados. 

     Eles tinham fugido dos campos do castelo, caminhavam entre as florestas e estavam tranquilos. Ela não parava de conversar e deixava as palavras saírem soltas até ela não perceber mais qual fora o primeiro assunto. Enquanto isso, ele simplesmente encarava todos os seus tiques durante a fala e as palavras que ela mais gostava de usar para mostrar como ela estava animada com o futuro incerto dos dois.

     Conversava sobre sua família, suas amigas falsas demais e até mesmo como não gostava dos vestidos que ela usava, o quanto estava aliviada por eles terem deixado aquela outra vida, tão distante agora.

     Valentin pensava sobre como a vida dele tinha iniciado tão diferente do seu único amor da vida. Ele era um guerreiro, ela uma princesa. Ele alguém que só conhecia a dor de apanhar e sofrer em prisões quando comandantes julgavam-no merecedor de tortura. Pensava, ele, sobre como a vida sob as mãos de Érica era o maior carinho que ele tinha ganho em todos os seus anos. 

     Entre suas diferenças, ele encontrava jeitos novos de amá-la e vice-versa.

     Encarei aquela cena, e fiquei relendo todos os seus detalhes, minhas mãos longe do teclado. O que eu colocaria mais ali que continuasse a história quando não sabia o que fazer com a minha vida?

     Examinando de novo e de novo as palavras que tinha colocado no arquivo, abri um novo e comecei a colocar frases que eu gostaria que Zeus falasse para mim, para que eu olhasse ele com a admiração nos olhos, do mesmo jeito que meus personagens faziam. 

     Mas, então, parei de novo de escrever, pois a ideia de Zeus contando para mim tantas coisas, falando sem parar sobre qualquer coisa, não me agradava. Eu queria ele de volta, e desta vez sem ser atirado na calçada do meu prédio, mas podendo caminhar melhor e com consciência até o meu apartamento, mas não queria ele me contando o que tinha feito.

     Era sua última luta, apenas alguns dias depois de ele ter apanhado pelo que eu sabia ser os capangas de Alli. 

      Naquele dia, que parecia tão raso para o que poderia estar acontecendo, eu vi nos seus olhos que ele tinha tomado uma decisão que eu não poderia mudar e com certeza não iria gostar. O modo como ele me olhou assim que disse que precisava conversar comigo foi o suficiente para eu começar a chorar. 

     Queria que aquele choro ficasse dentro de mim, e que eu conseguisse escutar qualquer coisa que ele me contasse sem mostrar o quanto estava doendo dentro do meu peito. Com a ideia da sua partida, com a ideia da sua dor. 

     Até ali, enquanto esperava alguma notícia de Aimée e a possibilidade de ele vir parar na minha casa de novo, não sabia como me portar ou o que fazer. Eu não tinha me incluído na sua lista, não tinha certeza que era importante para suas escolhas, mas esperava ter o mínimo de um adeus, qualquer jeito fosse. 

     Deixando minha cama, me levantei e alisei a calça jeans e a camiseta branca que eu vestia, indo para a janela e encarando a calçada. Eu esperava, pensando que tinha o mínimo de coisas que gostaria de falar para ele antes de ele me excluir completamente da sua vida, coisas que talvez facilitassem sua escolha. 

     Pegando o celular, não tinha recebida nada de Aimée, então voltei para a janela, não impedindo os meus pensamentos de flutuarem para o que eu tinha que falar pra ele. Como precisava que ele entendesse que eu seria aquela louca na cama, e a mulher inteligente e forte fora dela, que eu seria eu para ele. 

Boa tarde, Zeus ✓Onde as histórias ganham vida. Descobre agora