0. prólogo

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prólogo

0. lute para que não percebam


     Era o dia de uma luta importante e eu estava preso à uma promessa que envolvia camisa social e um corte de barba. De todos os dias, a inauguração do Café e Livraria da Aimée foi escolhido logo no que eu mais precisava me concentrar. 

     — Como eu estou? — Aimée me perguntou. Parecia que gostava de me colocar na posição de amiga, o que eu sabia que era bem difícil de imaginar sendo que eu era um homem de 1,97 com 110kg de músculo. Algo que eu estava ainda trabalhando para aumentar.

     — Maravilhosa, como sempre. — Respondi a verdade, mas sem nenhum entusiasmo. O tecido da minha camisa estava apertando os meus braços e me apertando. Eu não conseguia me movimentar direito e o sofá de Aimée só piorava a situação.

     A camisa tinha sido um presente extravagante de Aquiles. Segundo ele todas as intelectuais e amantes de café na inauguração iriam babar ao me ver com a camisa azul, já que ela realçava os meus olhos. Um bando bobagem se eu pudesse opinar, eu conseguia atenção só de caminhar no lugar. 

     — Tu nem me olhou, Zeus. Faz um esforço pelo menos...

      Esfregando meu rosto, apoiei meus cotovelos nos meus joelhos e fiquei ali. — Tuas roupas se resumem à preto, branco e cinza, Aimée. É fácil notar quanto tu tá usando um vestido azul. — Ao final da minha frase ela riu baixinho e, em um suspiro, veio sentar do meu lado. 

     — Grandão, vai dar tudo certo na tua luta. — Senti ela colocando a mão nas minhas costas. Iria mentir se antes não pensei em ficar com Aimée, mas percebi que ela seria muito melhor como amiga do que como amante. Eu gostava mais dela como amiga, afinal, ela combinava muito mais com Apolo, e eu não sei se aguentaria. 

     Apolo fazia parecer que a vida à dois era boa, mas a cada história eu quase morria de medo. Era muito tempo e investimento. Eu tinha que ter meu tempo para treinar e meu investimento era limitado na minha casa e nos meus irmão, os quais eu precisava cuidar. O que eu tinha com as garotas que saía era algo sem compromisso... mesmo que elas não soubessem uma das outras ou soubessem que não tinha nada com nenhuma.

     — Vai dar tudo certo se eu chegar cedo e me aquecer. Que horas começa essa inauguração? Já são duas da tarde. 

     — Começa em 30 minutos. Apolo já vai chegar do trabalho e daí nós vamos lá pra baixo. Iara já deve estar lá, também.

     Na menção da amiga de pele caramelada, me irritei. Ela vivia me olhando estranho e não tinha nenhuma expressão para eu saber se gostava ou não da minha presença. Eu era o único que podia fazer isso no grupo, era meu trabalho ser o misterioso. Tendo dois já era demais. 

     Aimée deu outra risada e voltou a se arrumar.

      Eu fiquei sentado e na minha cabeça a última luta passava como uma gravação. O momento em que eu dei o último golpe no meu oponente, a saliva saindo da sua boca em um movimento perfeito antes de ele girar e cair de cara no chão do ringue, o corpo mole. O silêncio que sempre ocorria depois, eu cuspindo o meu protetor bucal no chão e aquela adrenalina percorrendo minhas veias. Meus dedos se juntaram, pedindo um alívio, pedindo para eu ir e lutar cada vez mais, as marcas das minhas juntas pediam memórias de dor e sangue, cansaço e vitória.

     Estar nessa vida desde cedo ajudava a querer mais. O prazer de saber que aquele bando de velhos desocupados e cheios de dinheiro iam me ver e me pagar para que eu fizesse outro lutador desmaiar cresceu todas as vezes que eu subia no ringue. Até eu chegar no momento em que eu estava. Querendo lutar profissionalmente mas não conseguindo sem expor a minha família e assim fazendo com que eles fossem tirados de mim, fazendo com que eles ficassem sozinhos.

Boa tarde, Zeus ✓Onde as histórias ganham vida. Descobre agora