10. lute para ser importante

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n o t a  d a  a u t o r a: 

Como no gif, só pergunto: estão preparados?


10. lute para ser importante

     De punhos cerrados, fui até a nossa cozinha. Estava tentando não ir, por alguns minutos eu tava só escutando o som dele falando sozinho. Costume dele ler em voz alta e responder o que ele achava que as notícias mereciam. 

      E sabendo que ele estava fedendo de álcool da noite anterior, lendo um jornal que eu nem sabia como que ele conseguia dinheiro pra comprar, preferia não peitar ele sobre o que eu encontrei no chão da casa e vi Martina e Vinícius limpando. 

     Ele era pai, mas parecia esquecer com cada copo que ele bebia. 

     Me sentando na cadeira de madeira envernizada e de um vermelho escuro, olhei pra ele. Admitia que normalmente não me sentaria do jeito que estava, mas com ele era aquela velha e idiota ideia de quem é o mais macho. Então eu copiava o jeito que ele sentava: pernas abertas, uma mão em cima da mesa, outra no saco. Era nojento só de pensar que Vinícius seria assim se eu não conseguisse fazer de tudo para ele não ser, mais idiota que eu fazia aquilo porque já tinha entendido o jeito que funcionava com ele.

    Eu esperei ele fingir interesse, deixando o jornal de lado, esperando um pouco mais pra pensar direito se queria aquela discussão. Seus olhos vermelhos vieram pra mim e aquela raiva sempre presente... eu já tinha percebido o como era parecido comigo. Não era meu pai, mas tinha crescido com ele e tinha nojo de ter um pedaço dele, como aquela raiva toda dentro de mim. 

     — Qual o discurso de hoje? Dinheiro? Ou o pobre filhinho não conseguiu nenhuma comida pra come? — Ele perguntou, debochado, a voz afinando e imitando a de uma criança. No caso, como eu era quando criança.

     Era tanta idiotice ele perguntar sobre dinheiro quando era eu que colocava a minha vida em risco pra pagar tudo naquela casa, uma casa que eu não podia nem melhorar porque só faria com que ele roubasse o meu dinheiro de novo. Era idiotice ele falar de comida quando ele saia e entrava ali e tudo estava cheio o suficiente para todos nós.

      — Que tal sobre o vômito que tu fez teus filhos limparem? — Respondi. Eu podia engrossar a voz, ser duas vezes o tamanho dele, e até mesmo ganhar nas discussões, mas dentro de mim sempre estaria perdendo. Ele era o único que fazia eu sentir o que era perder. Mas não deixei esse pensamento me mobilizar. 

      — É bom que eles saibam como limpar uma casa. — Falou, levantando de novo o jornal. A camisa que ele usava estava manchada com terra e alguma outra sujeira, e as pernas cabeludas não estavam cobertas por nada além de uma bermuda furada que era a última coisa que ele havia ganhado da minha mãe. 

     — Tu não tem noção do que tu tá falando, né? — Perguntei. Estava mais irritado ainda com a situação toda. 

     Como que ele conseguia? 

     Agir como se aquele dois não fosse seus filhos? Agir como tudo menos um pai? Eu tava pouco me f.udendo para qualquer desculpa que ele tivesse. O desaparecimento da minha mãe? A tristeza de ficar sozinho? Não importava. Ele não podia achar que era normal tratar os gêmeos da maneira que ele tratava. 

     Eles não eram empregados dele, eles eram espertos demais e agiam muito além da idade deles para terem só mais uma coisa pra atrapalhar. 

     — Acho que quem não tem nada a ver com isso é tu, guri. O que foi agora? Virou macho? — Largando jornal, meu padrasto se levantou, as mãos em punho se colocaram na mesa e a sombra que ele fazia ficou sobre mim. 

Boa tarde, Zeus ✓Onde as histórias ganham vida. Descobre agora