Pequeno Campeão

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Hoje é sexta-feira.
Dia de visitar minha mãe...
Chegando na porta do hospital, com a mochila nas costas, eu suspiro pesadamente e entro antes que meus pés deem meia volta.

As recepcionistas me dão oi, e assim eu entro no elevador, indo para o corredor onde fica o quarto de minha mãe.

Respiro de novo e entro.

Vejo minha mãe deitada na maca, ligada por tubos a uma máquina que a faz respirar.
- Como está tudo por aqui? - Pergunto para a enfermeira.
- Ela está estável, nada de novo. - Ela fala.
- Entendo. - Falo e ela deixa o quarto.
Sento do lado da cama dela, e fico a olhando por um tempo.
Gostaria dela aqui.
- Oi mãe. - Falo esperando que ela me ouça. - Estou aqui de novo, me desculpe por não poder vir te ver mais vezes, ando correndo muito ultimamente. - Falo pegando em sua mão- Desculpe por não trazer meu irmão, mas ele é muito novo para viver isso.

Eu também.
Mas tenho que viver isso.

- Fico triste em saber que estou esquecendo com o tempo o som da sua voz, o seu cheiro, sua risada. - Suspiro. - Mas não tenho oque fazer para mudar isso.

Queria poder.

- Sinto sua falta todos os dias, meus dias são tão corridos e solitários, me sinto sozinho o tempo todo. - Falo me levantando. - E tenho medo de falar que me sinto sozinho aqui, mesmo junto de você. - Tiro o desenho que fiz da mochila e deixo na janela perto dela e dos outros desenhos anteriores.
Saio do quarto.

Entro no elevador e vou embora, no silêncio.
Chego em casa deixando a mochila no chão e me sentando nos sofá, encarando o vazio e os objetos sem cor.
- Já tá aqui? - O pequeno menino me pergunta.
- Sim. - Falo sem levantar a cabeça.
- Não vai trabalhar? - Ele pergunta indo até mim, parando na minha frente.
- Estou cansado. - Falo passando a mão nos cabelos, exasperado.

O menino cutuca minha perna.

- O que foi? - Pergunto ainda com as mãos no rosto.
- Olha pra mim. - Ele fala e eu levanto minha cabeça.
Ele fazia varias caretas para mim.
Ele me faz dar risada, e o mesmo ri junto.
- Já sei. - O menino saí correndo para a cozinha.
- Cuidado. - Falo acompanhando ele com os olhos.

Ouço ele abrir o armário, a geladeira, e depois de alguns minutos ele volta com um copo nas mãos.
- Toma. - Ele estende o copo.
- O que é isso? - Pergunto.
- Remédio. - Ele diz. - Pra dar sono.

Era um copo de leite.

- É? - Pergunto, tomando o copo das mãos do menino.
Ele coloca as almofadas no chão.
- Toma. - Ele diz, eu apenas bebo. - Pronto, agora deita aqui. - Ele coloca uma almofada e bate nela.
- Para? - Pergunto me deitando.
- É um remédio. - Ele diz.
- Deitar ? - Pergunto e ele vai até mim, sobe no sofá e se deita comigo, me abraçando.
- É. - Ele fala.
- Onde aprendeu isso? - Pergunto olhando para o rostinho dele escondido na minha blusa.
- Com você. - Ele esconde seu rosto na minha blusa e me aperta. - Tá feliz agora? - Ele pergunta com a voz abafada.
- Claro. - Falo fazendo carinho em seu cabelo, e começo a chorar.
- Por que tá chorando irmãozão? - Ele pergunta olhando para mim.
- Machuquei meu braço campeão, só isso. - Falo sorrindo.
- Vai sarar com meu remédio? - Ele pergunta.
- Vai sim meu amor. - Falo e ele sorri.

Eu poderia ter desistido.
Eu poderia ter fugido.
Eu poderia ter abandonado tudo.
Sou apenas um adolescente, e não era para ser meu papel a criação de uma criança, nem sustentar uma casa.
Já pensei em desistir.
Até a morte parecia solução.
Mas sabe....
Isso tudo é difícil, viver é difícil.
Mas vale a pena.
Esses pequenos momentos me mostram que estou no caminho certo.
Pelo menos dou tudo de mim para ele.
Não posso deixá-lo aqui.
Não importa se esse vai ser meu destino por um tempo.
Eu amo ele.
E ele me ama.
E isso é o suficiente para continuar.
É o suficiente para mim.
É suficiente para nós.

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