Eleven

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Daniel

O que falar dessa noite que passamos juntos? Eu sinceramente não sei.
Quando senti suas mãos leves e delicadas passeando pelo meu corpo, algo em mim acordou. Algo nada puro e meigo. Algo devasso e quente. E quando eu a ouvi dizer que gostaria que eu cumprisse minhas obrigações conjugais, foi o fim. Ela incendiou tudo. Na verdade, incendiamos juntos. E foi indescritível. Maravilhoso.

Depois de acordar com o berro da peste, vi que nem tudo pode permanecer em paz e bom como estava. Kayla é um furacão, impossível de controlar. Ela seguiu para o seu quarto e eu fui tomar meu banho. Já estava de noite quando despertamos. Passamos muito tempo "brincando" e acabamos cansando.

Quando apareço na sala de jantar, Kayla e seus pais já estavam comendo. Escutei de Melissa que eu estava com uma expressão cansada no rosto. Sentei à mesa e me servi ignorando totalmente o que ouvi. Aragon avisou que amanhã iremos ter que recepcionar seus convidados logo cedo e eu assenti olhando pra Kayla. Jamais fiquei tão rodeado de vampiros como estou nessa nova fase da minha vida. É estranho.

_Kayla, estou te esperando no jardim. Apareça lá._Melissa sai da mesa e vai embora.

Comemos em silêncio e logo Kayla segue a sua mãe. Aragon coloca os cotovelos na mesa e entrelaça seus dedos. Já vi tudo.

_Daniel, ouvimos o quanto você e a Kayla estão se dando bem._Nesse momento eu queria que o chão se abrisse._Não acha melhor vocês dormirem no mesmo quarto? Estamos pra receber visitas e odiaríamos que boatos mentirosos rodassem a sociedade.

_Aragon, eu e Kayla mesmo casados ainda somos amigos. Eu não queria correr com as coisas, se é que me entende. Mas poderíamos manter as aparências para seus convidados.

_Convença Kayla, por favor. Ela é muito difícil de conversar sobre aparências.

Assinto e subo pro meu quarto. O cheiro dela ainda está muito vivo no colchão e isso é um pouco desesperador. Será que além de ser super dependente do seu sangue, serei do seu corpo também? Saio do quarto para que Muriel arrume tudo. Vou até a sala de piano onde já encontrei Kayla tocando uma vez. Ela toca muito bem.

_Daniel.

Vejo que ela já está sentada e com os dedos trabalhando no instrumento. Seu corpo está bem apoiado e no seu rosto sai expressões de dor e tristeza. A canção tocada trás à tona sentimentos escuros, vazios. Depois que ela conclui a música, levanta e ameaça sair da sala.

_Por que você toca e fica tão triste?_Pergunto curioso.

_Nunca quis aprender a tocar piano, mas aprendi por minha mãe. Hoje eu me vejo escrava dele. Não consigo parar mais de tocar canções tristes._Ela suspira._É difícil entender, eu sei. Mas só eu sei quantas e quantas vezes fiquei treinando. Foi difícil.

Caminho até ela e a abraço. Não uma abraço fraco, sem vida. Um abraço com sentimento, com compaixão. Ela parece muito abalada com isso tudo. Acho que a perseguição da Melissa com a filha foi algo que afetou muito o psicológico de Kayla.

_Teremos que dormir no mesmo quarto enquanto os convidados estiverem aqui. Tudo bem pra você?

_Pensei que você mudaria pra lá depois de ontem._Ela me olha e então percebo que não falamos disso ainda._Você não vai?

_Quero ser sincero com você, Kayla. Sempre._Coloco seus cabelos atrás da orelha._Ainda temos dentro de nós aquela parte de ódio pelo outro. Estamos descobrindo agora que não é só esse sentimento que existe. Você acha que correr com tudo só porque casamos é o certo? Ou pela noite de ontem?

_Você tem razão. Mas a gente pode repetir?_Sua inocência misturada com a rebeldia me atrai demais.

_Vamos com calma, ok?_Ela faz o maior bico depois que eu digo isso._Teremos muito tempo pra isso. Você acha a eternidade pouca coisa?_Ela nega com a cabeça._Então saiba sempre esperar. É uma virtude, pestinha.

Beijo sua testa e ela sorri. Acho que ela está começando a gostar dos meus apelidos nada comuns. Ela me ajudou a mudar algumas roupas minhas para o seu guarda-roupa. Não era preciso mexer em muita coisa. Depois ficamos na varanda do seu quarto observando a noite.

_Sabe, Daniel, eu jamais pensei em casar. Meu espírito, se é que eu tenho, é totalmente aventureiro. Eu gosto da sensação de liberdade._Seus olhos brilham pra lua._Sempre invejei a liberdade que vocês tem. Minha vida foi aprender novos idiomas, tocar piano e saber de coisas que mulheres devem saber. Quando eu conseguia escapar, eu ia até aquela cachoeira de ontem e pulava dela inúmeras vezes só pra conseguir sentir algo novo. Tudo pra mim sempre foi monótono e sem graça.

_Que difícil.

_Sim, e agora eu consigo ver que não preciso mais da cachoeira pra sentir algo novo._Ela me olha com muita intensidade._Eu só preciso te dar uma surra e depois cuidar dos seus ferimentos. O que vem depois disso nós é que decidimos.

Assinto e ela também. Ela é só uma garota procurando pelo novo e eu conseguir ser sua distração momentânea. Ela não quer ser casada, assumir compromissos, etc. Ela quer ir atrás do inexplicável, do inexplorável, do novo. Ela quer conhecer, desbravar, sentir. Fico feliz por no momento estar sendo um algo novo pra ela. Pelo que ouvi, sua vida foi muito regrada. Ela merece.

(*)

O filho da lua e a filha da escuridãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora