Capítulo 01

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Era uma vez...


Em um reino assolado pela guerra, uma linda camponesa se apaixonou por um rei assombrado por um passado que ele não conhecia. Era uma vida impossível, mas ela o amava, e ele a amava também. Houveram mentiras, dor, perda, traição, mas por fim a guerra foi ganha e a paz se reinstalou. Ele fez dela sua rainha, e ela teve lindos bebês. Eles se amavam, havia paz. Então eles foram felizes para sempre.

Engraçado, contos de fada sempre terminam com essa conotação, porém "felizes para sempre" não significa que não há mais nada a ser dito sobre o "para sempre".

Seis anos se passaram desde que você esteve aqui pela ultima vez. Muita coisa mudou. O castelo, após a ultima batalha da guerra, precisou ser reconstruído em grande parte. Muito fora destruído e lembranças precisavam sumir. A fronteira foi derrubada. Famílias, antes separadas pela guerra, puderam voltar a viver em paz. A rainha mandou que derrubassem um bom pedaço de território de onde era a 'Floresta da divisa', onde agora era a Estrada do Rei. Não havia mais divisa; apenas um único reino, enorme e forte, prosperando em sua plenitude. Ninguém nunca mais seria afastado de quem amava a força.

No castelo, sobre novas acomodações, a principal novidade foi a construção de um salão do trono. Um lugar amplo, com teto alto, apenas com pilastras e no final três degraus de pedra, que davam pro trono de Alfonso. Após a morte de Dulce e durante a guerra o rei nunca recebeu nenhum servo, era tudo resolvido a ferro e fogo, mas aquilo era passado. A rainha fazia questão de que todos fossem ouvidos e obtivessem justiça. O reino obedecia as ordens dos dois, e ele insistira em um trono pra ela, que se recusou. A vontade de um representava unidade dos dois, logo só um trono existia.

Um trono agora vazio, na ausência de Alfonso. Anahí caminhou delicadamente pelo salão, a cauda do vestido se arrastando pelo chão. As safiras na coroa que ele desenhara pra ela lhe ressaltavam os olhos. Os cabelos estavam soltos em ondas suaves, que pareciam acariciar as costas dela, até a coluna. Anahí era um tipo diferente de rainha. Começara seu reinado grávida, de onde criara uma nova modalidade de vestidos. Sem os espartilhos cruéis, mas com um apoio de busto que cobria apenas os seios. Abaixo dos seios se fechava um broche, onde o vestido se abria, esvoaçante. Haviam 5 camadas de tecido na saia, que se espalhava pelo chão, as mangas cumpridas de uma seda suave, com um decote discreto. Alfonso sempre adorara destruir-lhe as roupas, se lembrou, tocando o pulso da manga do vestido. Olhou o trono, saudosa da imagem dele sentada ali. Ela subiu os degraus, tocando a madeira do braço do trono levemente, como se ainda pudesse sentir o calor dele ali.

- Alteza. – Se anunciou e ela virou o rosto. Havia uma criada com um carrinho de bebê, acompanhada por um soldado.

Anahí: Oh. Aproxime-se, Beth. – Consentiu – Ele acordou?

Beth: Não desde a ultima troca de fraudas. – Anahí assentiu, vendo a criada se aproximar. O soldado a ajudou a erguer o carrinho pelos degraus e o olhar de Anahí se suavizou ao ver o filho dormindo, a boquinha entreaberta.

Nathaniel era o quarto filho da linhagem de Alfonso, terceiro por Anahí. Tinha menos de um ano e era a alegria do pai. Agora dormia, de barriga cheia e trocado, alheio a qualquer situação.

Anahí: Meus filhos? – Perguntou, ajeitando o cobertor de Nate.

Beth: Suri afirmou que ia andar pela propriedade. Os pequenos estão fazendo as lições que o mestre deixou. – Anahí assentiu.

Anahí: Você pode ir. – A criada se curvou, saindo em seguida - O que temos hoje? – Perguntou, afastando o olhar do filho e encarando o soldado.

Cartas. Cartas e infindáveis cartas. Noticias de outros reinos, alertas de tempestades, solicitações... E uma carta de Madison. Anahí se sentou no trono, orientando o mensageiro sobre cada resposta a ser dada. Por fim o dispensou, abrindo um pergaminho vindo de Madison. Não conseguiu evitar o riso.

"...Eu soube que Katherine está grávida outra vez. Não pude confirmar ainda. Honestamente, eles se reproduzem como coelhos! Estou entediada. Me mande noticias das crianças. Em especial, dê a menina um beijo. Diga-lhe que assim que possível..."

- MAMÃE!

Crianças tem uma visão subjetiva das coisas. Elas vêem o mundo do seu próprio modo, de forma que não importava que aquela grande sala fosse o salão do trono, ou que a mulher sentada no trono fosse a rainha. Ali era apenas uma das salas do castelo, e aquela era apenas sua mãe.

Rosalie: Eu não quero brincar disso. – Decidiu, emburrada.

Chord: Porque não? – Ele começando a se irritar com a irmã, era visível em seu rosto enquanto baixava a espada de madeira.

Rosalie: Porque eu sou menina, e meninas não brincam de espada. – Disse, obvia.

Chord: "Meninas não brincam de espada". Suri brinca de espada, você é que é boba! – Retrucou.

Anahí: Chord. – O menino sempre se continha na presença de Anahí. Ele a encarou e se deparou com ela lhe erguendo a sobrancelha, o que o fez retroceder.

Chord: Eu preciso treinar! – Contestou, exasperado. Era fofo ver o menino daquele jeito - Serei um grande guerreiro, lutarei guerras e meu nome ficará na história! – Disse, acertando o nada com sua espada de madeira.

Enquanto Rosalie era delicada, e gostava de coisas simples e bonitas, como bonecas e flores, Chord herdara o gênio do pai. Gostava de ação e aventuras, coisas que a irmã não estava muito disposta a dar. Anahí sorriu de canto, olhando o filho rodopiando o ar. 


O que sabia ele sobre guerra, seguro e sadio como sempre fora? Como poderia saber, se ainda era um bebê de berço quando a guerra invadiu o castelo e enfim aquele horror acabou? Dependendo de Anahí, jamais saberia.


Chord: Eu não gosto de brincar com você mesmo. – Continuou o garoto. Rosalie fechou a cara, jogando a espada de madeira no chão.

Anahí: Shhh, vocês vão acordar seu irmão. – Repreendeu - Venha, Rose. – Chamou, oferecendo a mão, e a menina foi até ela, emburrada. – Não ligue pro seu irmão, sim? – A menina assentiu, ainda de bico – Vamos, escolha uma história. Ainda tenho tempo, te contarei qualquer uma. – O representante do Clero viria logo ao encontro dela, trazendo as demandas do povo, mas seus filhos sempre seriam prioridade.

Chord: Histórias! – Caçoou, antes que Rosalie pudesse escolher – Sinto falta do papai. – A expressão de Anahí se desfez, o rosto empalidecendo – Onde ele foi, mamãe?

Rosalie: Também quero o papai. – Decidiu a menina, coçando o olhinho. Anahí olhou a filha, procurando que dizer. Ver aquela expressão no rosto dos filhos era muito mais pesado que a coroa sobre sua cabeça. Antes que ela pudesse dizer algo um guarda entrou, se curvando.

- Alteza. – Anahí aquiesceu – O sacerdote aguarda sua autorização para entrar.

Anahí: Mamãe precisa resolver problemas agora, mas conversaremos sobre isso depois, sim? – Rosalie assentiu, tristonha, e desceu do colo da mãe. Anahí se levantou, avançando alguns passos com os filhos, a cauda do vestido azul marinho se arrastando atrás dela – Leve meus filhos em segurança de volta para o quarto de brinquedos, e em seguida ordene que o sacerdote entre. – Ordenou, em um tom de voz totalmente diferente, e o guarda assentiu, se curvando novamente e saindo com as crianças. Ela dobrou a carta de Madison com cuidado, pondo-a no carrinho do bebê.

Uma vez só Anahí suspirou, olhando o vazio. Por melhor que ele a tivesse ensinado, era muito pesado cuidar de um reino sozinha. Ela se virou, olhando o trono, e não importa o tempo passado era como se ela ainda pudesse vê-lo ali, sentado no lugar que era dele e sorrindo ao vê-la entrar na sala.

E, Deus, como ela sentia sua falta.

Mais Além do 'Felizes Para Sempre' - Uma história de Just One More About LoveOnde as histórias ganham vida. Descobre agora