I - No Fim do Mundo

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No ano de 120 d.C. a Nona Legião do exército romano marchou para o invicto território do norte da Bretanha.

Eles nunca mais foram vistos.
Todos os cinco mil soldados desapareceram com o seu precioso estandarte. Humilhado por essa grande perda o imperador Adriano ordenou a construção de uma muralha para isolar o norte da Bretanha para sempre. A muralha de Adriano marcou o fim do mundo conhecido. Vinte anos depois os romanos ocuparam o sul da Bretanha.

Bretanha, séc. I d.C.《

Marcus Flavius Àquila se apresentou para o Oficial na ativa, o superintendente Plutorius Drozeiro Salinatum, dentro da pequena fortaleza de madeira - típica das regiões fronteiriças, como aquela em que estavam -, recebendo a notícia de que o comandante antecessor partira antes de sua chegada.

O motivo era o mesmo pelo qual os poucos guardas que ali restavam também ansiavam em retornarem se não a Roma, ao menos para cidades ou províncias mais próximas dos territórios mais seguros. Aquele era um dos últimos postos fortificados antes da Grande Muralha e do chamado Fim do Mundo.

As invasões bárbaras eram muito constantes. Saques, estupros e matança eram comuns nas pequenas aldeias que se formavam próximas dos fortes, tidos como referência de proteção. As colheitas, quando não roubadas, eram incendiadas. Os poucos invasores bárbaros, nas raras vezes que capturados, tornavam-se escravos, quando não sentenciados a morte.

O eficiente Plutorius passou todas as incumbências a que o centurião da Quarta Coorte Gaulesa da Segunda Legião, Marcus, o novo comandante e Defensor do Forte, teria à frente. Entre suas delegações estavam as de ordem militar e as administrativas; inclusive as registraturas, já que não havia escriba no local devido a diminuta importância do forte.

Era estranho que Marcus, com apenas vinte e sete anos, recebesse essas informações e as instruções necessárias sobre o local de um homem muito mais velho que ele, porém de nível hierárquico inferior. Contudo, além do elevado grau hierárquico que possuía, Marcus descendia de uma família rica e importante no Império; o que tornava aquela situação muito mais habitual do que parecia.

Porém, a posição que Marcus ocupava não se devia ao direito de nascença. Ele a conquistou por seus próprios méritos, pois se dependesse somente do legado de família ele teria apenas desonra. Seu pai foi o general da Nona Legião, Maximus Flavius Àquila, que trouxe desgraça ao império ao perder o estandarte e todos os soldados que o seguiram na ambiciosa tentativa de conquistar as longínquas e desconhecidas terras do extremo norte.

Ao ser apresentado aos soldados e demais oficiais que aguardavam impacientes pelas excessivas formalidades, Marcus notou como vários lhe olhavam com um total desdém e a desaprovação estampada nos rostos sérios. Ele não os culpava. Além de sua mais que evidente juventude, pesava sobre seus ombros o fato de ser um patrício, pertencente à nobreza romana, que vivia no luxo e ostentação enquanto a maior parte do povo passava fome.

Sem um grande feito sendo enunciado sobre seu nome, Marcus despertava a desconfiança de todos os seus subordinados que certamente também estavam curiosos pela sua repentina chegada a um lugar tão inóspito e distante de Roma. Seria este seu grande teste ou havia ele caído em desgraça na opinião do imperador? De qualquer modo, ninguém ali se atreveria a questionar seus motivos. E Marcus se sentia confortável com este pequeno privilégio.

Cada vez que uma Legião conquistava novos territórios ou defendia bravamente o que já fora anexado em batalhas, esses feitos eram proclamados por todos os cantos do império com grande honraria. Isso ajudava a manter o sentimento de orgulho dos cidadãos romanos e apaziguar os possíveis descontentes diante das demonstrações do poderio e da força militar.

A Águia (EM REVISÃO)Where stories live. Discover now