1. Karma Meum

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Acordei com o despertador soando pelo cômodo quase vazio e levantei-me. Férias. Uma palavra pequena que nos remete à uma época boa do ano. No meu caso, a única coisa boa era o fato de ir à biblioteca e ver Beth, a bibliotecária simpática e amiga antiga da família. Por outro lado, a parte ruim era o ato de acordar cedo em uma manhã fria, cinza e um tanto deprimente. Minha mãe estava viajando, o que restava-me estar na companhia de minha irmã mais velha: Lucy.

No começo, tentei pôr-me no lugar de Lucy: cuidar de uma pirralha de 17 anos e ficar trancada dentro de casa, sendo que poderia estar curtindo a vida por aí com os amigos. Mas na verdade, era diferente. Lucy adorou a idéia de virar minha babá na ausência de minha mãe. Segundo minha mãe, a viagem seria ótima para que Lucy e eu pudéssemos nos reaproximar, como grandes irmãs que sempre fomos ou que éramos para ter sido.

Lucy e eu estávamos sempre brigando. Nunca vi nela a imagem de uma irmã mais velha, mas talvez nós poderíamos mudar isso. Para falar a verdade, eu estava acostumada com a distância que nós mesmas colocamos e não via motivos para mudarmos em algo.

Após alguns minutos de um mantra que parecia não haver fim de "eu realmente não quero levantar", finalmente levantei-me. Precisava ver Beth e devolver os livros que emprestei algumas semanas atrás, da biblioteca. Caso contrário, poderia ficar sem alugar os livros e leva-los para casa. Provavelmente Beth ajudaria-me nessa, como em tantas outras vezes. Porém, é sempre bom evitar problemas.

Vesti-me de qualquer jeito, pois realmente não estava importando-me com minha própria aparência. Afinal, é de manhã.

Assim que vesti meu moletom antigo, o qual parecia ter sido pertencido a um mendigo, desci as escadas correndo. Não queria ter que esbarrar em Lucy pela casa. Coloquei a mochila em minhas costas e saí dali o mais rápido possível.
***
Estava com saudades dos meus amigos. Provavelmente, eles devem estar agora em alguma cidade no litoral, acordando tarde e tirando inúmeras fotos do local. Divertindo-se. Minhas férias também estão animadas. Estão mesmo. Mas mesmo assim, presumo que nada mudará o resto dos dias.

O sol começava a surgir por entre as colinas e no fundo, desejava que o clima esquentasse um pouco, já que há dias em que as nuvens não somem.
Minhas mãos estavam trêmulas e tentava aquecê-las. Um ato em vão, já que nem mesmo o tecido do meu moletom esquentava-me. Com esses dias frios, imagino que a neve não irá demorar para cair o que provavelmente, irá impedir-me sair de manhã para visitar Beth e os inúmeros livros da biblioteca já antiga.

Avistei o prédio e apressei os passos. Subi os poucos degraus e empurrei a porta de vidro um tanto pesada. Senti o ar irreconhecível do local invadindo meus pulmões: o cheiro de livros tanto velhos, quanto novos. Estavam por todo o local, atraindo-me.

Aproximei-me do balcão alto e Beth já estava lá, lendo uma agenda com seus óculos de lentes enormes e armação escura. Sorriu e sorri também.

- Bom dia, Beth! - exclamei.

- Bom dia, Amy!

- Trouxe os livros para devolver. - abri a mochila e tirei os três livros de lá, entregando em seguida.

- Lucy está bem?

- Sim, está. - para falar a verdade, eu nem sabia se estava tudo bem mesmo, já que passei o fim de semana inteiro trancada em meu quarto, evitando vê-la e ouvir suas perguntas banais, como: está tudo bem com você?

- Então ótimo! - exclamou - pegue isto antes que me esqueça.

Beth entregou-me um pequeno papel. No mesmo estava escrito alguns números. Após alguns segundos tentando decifrar os supostos códigos, percebi que eram apenas os números indicativos de alguma das inúmeras prateleiras e claro, o número do livro que estava registrado no sistema da biblioteca.

Olhei para Beth confusa, a mesma deu uma piscadela com o olho direito e sem dizer mais nada, direcionei-me à escada, pronta para subir os degraus e finalmente achar o livro.
***
O livro chama-se "Karma meum". Um título em latim, imagino. Achei interessante e preferi que seria melhor lê-lo em casa.

Enquanto descia os degraus lentamente, um a um, vi que na contracapa do livro estava escrito algo. O livro era um tanto antigo, juntamente com as letras que um dia foram escritas ali. Após alguns minutos, pude entender: "Este livro pertence a Andrew".
Andrew. Um nome bonito.

Meu CarmaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora