A sala era apertada, o que parecia deixar o clima ainda mais pesado. Encontrei uma mulher morena, de aparentemente meia idade sentada de um lado, enquanto que Claire se mantinha em silêncio do outro lado da mesa. Meu coração apertou ao ver sua postura curvada e a cabeça baixa, sem contar que daquela maneira era muito mais difícil de verificar se ela havia se machucado ou algo do tipo.

— Morgan? — chamei, sentindo um bolo se formar na minha garganta só com as hipóteses sobre o que poderia ter acontecido.

Seu olhar se ergueu instantaneamente. Sua camiseta do Snoopy estava manchada com o que parecia ser tinta roxa, e havia um pequeno hematoma avermelhado em sua bochecha. Meu coração falhou algumas batidas.

O que aconteceu?!

Me adiantei na direção dela, tratando logo de tomar o lugar ao seu lado enquanto segurava seu rosto entre as mãos, o que resultou numa careta dela. Toquei o hematoma devagar e seus olhos se apertaram, fazendo com que meu sangue fervesse.

— Ao que parece, Morgan se envolveu numa briga com uma colega de classe. — a voz da diretora ecoou na sala minúscula, e tratei logo de encará-la.

— Como assim uma briga? — olhei para Claire. — O que houve?

— Não foi nada. — resmungou ela, desviando o olhar para a parede.

— Esse comportamento é muito incomum para Morgan, ela sempre se mostrou sempre tão doce... — mantive meu olhar sobre Claire enquanto a diretora falava, tentando entender que diabos havia acontecido ali. — A professora disse que é muito difícil desconcentrá-la numa aula de artes, então realmente espero que a senhorita consiga entender o que aconteceu, porque nós já tentamos de tudo mas ela se recusa a explicar.

Franzi o cenho para Claire. A conhecia o suficiente para saber que nada daquilo era de seu feitio, e me parecia bem estranho vê-la numa situação daquelas. Não conseguia imaginar o que algum colega poderia ter feito para irritá-la a ponto de partir para a agressão.

— Bom, pode ter certeza de que iremos conversar sobre isso. — garanti a diretora e então me pus de pé.

— Deixarei passar sem nenhuma consequência desta vez, mas espero que isso não torne a acontecer.

Agradeci e guiei Claire até a saída. As perguntas rondavam minha cabeça, mas ao vê-la tão assustada, me contentei com o silêncio por alguns minutos. Seguimos caladas até o carro, onde ela logo se ajeitou no banco traseiro sem dizer uma palavra. Tomei meu lugar no banco do motorista e repassei mentalmente todas informações que tinha de Claire. Ela não era agressiva. Talvez um pouco hostil — eu que o diga —, mas não agressiva. Parei o carro no sinal vermelho após alguns minutos e apoiei a cabeça no encosto do banco, tentando decifrar as peças do meu quebra cabeças mental. Que diabos tinha acontecido?

— Quer saber? — suspirei, pegando o caminho contrário a nossa casa. — Vamos dar uma volta.

Claire não protestou, mas eu não esperava que ela o fizesse. Em poucos minutos, estacionei o carro diante da Art Gallery Of Ontario. Não tinha certeza de que raios estava fazendo, mas mantive a ideia de que aquele dia não poderia ficar mais estranho bem fixa na minha cabeça.

— Você não vem? — indaguei assim que me vi à alguns metros de distância e ela ainda dentro do carro.

Ela pareceu desconfiar por alguns instantes, mas optou por me seguir. Caminhamos para a fila nada atrativa na entrada e mantivemos o silêncio durante o tempo que passamos do lado de fora, mas, apesar disso, eu podia ver a desconfiança de Claire se esvair a medida que ela observava o lugar. O brilho do museu refletia nos olhos já brilhantes, e ela parecia totalmente absorta na própria admiração que tive que avisá-la quando chegou a nossa vez de entrar.

Além das pinturas, haviam esculturas imensas ocupando a galeria. Claire não se deixou intimidar nem por um momento por conta de sua aparência desleixada, mesmo que as pessoas passassem e olhassem com desaprovação para o hematoma e a blusa manchada. Ela parecia estar no lugar ao qual realmente pertencia, e me orgulhava saber que ninguém parecia poder tirar isso dela. Entretanto, quando ela finalmente parou diante de uma das obras de Magritte, decidi que era hora de confrontá-la.

— Não quer me contar o que houve na escola?

Claire engoliu em seco antes de responder.

— Ela estava me zoando. — seus ombrinhos se encolheram, e tive que me conter para não ampará-la.

— O que ela disse? — mantive meu olhar fixo na tela, como se não quisesse que aquilo parecesse uma bronca.

— Que eu não tenho mãe. — ela parecia cada vez mais distante. — Que você e Shawn sentem pena de mim, e é por isso que estou aqui. E também, que um dia vocês irão enjoar e acabarei sem ninguém.

Era como se eu levasse um soco a cada palavra que ela pronunciava. Precisei de alguns minutos para absorver o que havia se passado, e mais alguns minutos para conter minha vontade de retornar a escola e eu mesma estapear a menina. Lembrei-me do parque, de quando pude segurá-la nos meus braços, e senti certo desespero por ela não estar dormindo naquele momento. Queria poder ampará-la, abraçá-la bem forte e dizer que a mãe dela estava ali e que a amava mais do que qualquer coisa. Entretanto, a única coisa que realmente pude fazer foi segurar seu ombro e dizer:

— Você tem mãe, Morgan, sabe disso. E ela te ama mais que tudo, tenho certeza.

Broken Strings | Shawn Mendes ✓Where stories live. Discover now