Capítulo 21.

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Pela primeira vez eu fiquei sem palavras, nenhum pensamento lógico, nenhuma frase qualquer para eu falar me vinha na cabeça. Apenas o eco daquela maldita palavra queimando em meu subconsciente.
Câncer... Christina... Christina tem câncer.
Eu provavelmente deveria estar escutando errado, só poderia ser isso. Era impossível Christina ter câncer, são as pessoas boazinhas que tem câncer, os vilões não ficam doentes. Quando morrem sua morte é bombástica, tipo, um ataque terrorista ou um capotamento de carro, sei lá, tantas as opções!
Fechei meus olhos com força, aquilo não poderia estar acontecendo. Eu estava pirando, só poderia ser.
-Você não vai dizer nada à respeito? -Matheus acariciou minha bochecha com o polegar.
-Sobre o que? -falei desentendida.
-Christina.
-O que tem ela? -perguntei.
-Ela tem câncer, Gabriela. -ele falou sério.
-Que piada sem graça, Matheus! -revirei os olhos.
-Não é piada.
-Ah, para Matheus! Você acha que eu vou cair nessa historinha para boi dormir?! -falei olhando em seu rosto e sorrindo.
Sua expressão era séria e ele levantou as sobrancelhas.
-O que? -sussurrei para mim mesma chocada.
Então era verdade? Christina estava com câncer, é isso?
-À quanto tempo ela descobriu?
-Uma semana antes de eu e você nos conhecermos. -ele falou encarando o horizonte.
-À quanto tempo vocês...-não me atrevia à dizer que eles eram namorados em voz alta.
-Um ano.
Trezentos e sessenta e cinco dias é muito tempo. Eu não tinha o direito de me intrometer.
-Você à ama? -perguntei encarando o reflexo de seus olhos na água, minha voz não passava de sussurros afetados.
Percebi que ele fechou os olhos por um segundo, não queria responder àquela pergunta, e se não queria responder era porque à amava mesmo. Não pude evitar uma pontada de ciúmes, o que eu sei, era ridículo. Me senti horrível, todo aquele tempo eu estava disputando um garoto com uma menina que estava morrendo.
-Na verdade não.
-Hum? -falei voltando para o momento ali.
-Quando conheci Christina, eu era muito novinho, estava fascinado com a ideia de amor e pensei que a amasse, aí nós começamos à namorar, mas não demorou muito para eu ver que as coisas não eram bem assim. Beijá-la é como beijar minha irmã. Eu já estava acomodado, mas uma certa mexicana fascinou-se com o meu caderno, e aí eu percebi que ela era linda. -ele acariciou meus cabelos e eu sorri dessa parte. -Quando você chegou, me mostrou uma nova perspectiva de sentimento e não duvide, eu teria terminado tudo com ela no dia em que te conheci se não houvesse esse maldito câncer.
-E eu? -perguntei.
-Você o que?
-O que sente quando me beija?
-Isso é pessoal. -ele sorriu.
-Tudo o que estamos falando aqui é pessoal. -disse tentando sorrir também.
-Talvez um dia eu te conte. -ele me abraçou.
Depois de tantas revelações, o seu abraço era o que me confortava. Ali eu percebi que sempre foi o meu lugar, nos braços dele. Me aninhei mais perto do meu príncipe e deitei minha cabeça em seu peito. Fechei meus olhos e fui conduzida ao mundo dos sonhos por sua voz rouca e linda que cantava para mim. Sentia seu calor protetor me aquecendo e cuidando de mim.
Naquele momento nós esquecemos todos os problemas que nos cercavam e deixamos eles para depois, no nosso mundo particular só podíamos habitar eu, ele, e as infinitas estrelas do céu noturno.
-Matheus? -chamei.
Eu precisava de apenas mais uma resposta antes de adormecer, só mais uma.
-O que vai acontecer com a gente agora?
Ele me respondeu com o silencio e eu tive a certeza de que em sua mente sustentava a mesma duvida que na minha.
-Você me ama? -perguntou.
Inclinei meu rosto para olhar em seus olhos tristes. Pousei minha mão direita em seu rosto, sorri.
-Isso responde à sua pergunta?
Ele apenas beijou minha testa e voltou à deitar minha cabeça em seu peito.
-Enquanto lembrarmos do que realmente sentimos, tudo estará bem. -sussurrou em meu ouvido.
Fechei meus olhos, inalei seu perfume e sorri.

***

-Meu anjo... -a voz de Matheus penetrou em meus sonhos, me trazendo de volta para a realidade, mas não a realidade das pessoas normais, a nossa realidade.
Ainda de olhos fechados eu sorri.
-Gabi...-ele chamou novamente.
-Humm. Gostei mais da primeira vez. -sussurrei sorrindo.
-Primeira vez? -ele disse confuso.
-É, aquela em que você me chamou de meu anjo. -abri apenas um olho e olhei para ele sorrindo divertida e ele encarou o céu. Pepercebi que estava contendo aquele riso bobo que eu tanto amava. -Olhe para mim.
Ele baixou seus olhos em minha direção.
-Porque? -perguntou sorrindo.
-Nada. Só queria ver o seu sorriso. -falei.
-Só por isso? -perguntou.
-Também para você apreciar melhor a minha beleza. -ri. -Brincadeira, queria ver seus belos olhos castanhos.
-Se você diz.
-Porque você me acordou? -perguntei.
-Daqui à exatos dez minutos começam os fogos.
-Fogos? -perguntei.
-De artifício. Último dia do ano, lembra? -ele sorriu.
-Puts, já tinha esquecido. -falei.
-Medusa só tem minhocas na cabeça mesmo! -ele brincou.
-Medusa só tem Parcy Jackson na cabeça. -falei sorrindo.
-Wishi, estou com ciúmes desse tal senhor Jackson, vou meter porrada nele! -disse Matheus.
-Seu bobo, você é o meu Parcy! -beijei seu queixo.
-E você é a minha Anabelle. -ele riu. -Opa, quer dizer, a minha Anabeth.
-Seu idiota, você fez de propósito! -falei.
-Mesmo que você fosse o próprio Chucky, meus sentimentos por você seriam os mesmos. -ele disse.
-Ok. Isso é uma mentira, aposto que se eu me vestisse de boneco assassino e viesse puxar seus pés à meia-noite você sairia correndo. -falei fazendo beicinho.
-Quer saber a minha reação se você fizesse isso?
-Quero.
-Eu trancaria a porta do quarto, e cara, arrancaria a porcaria da fantasia e...
-É melhor você não prosseguir no seu relato. -falei corando.
-Ok. "Gabi vestida de Chucky à meia-noite em meu quarto" adicionado à minha lista de fantasias sexuais.
-Você tem uma lista de fantasias sexuais? -falei boquiaberta.
-Todas elas com você. -ele riu safadamente e eu enterrei meu rosto em sua camiseta para esconder o meu rubor.
-Para! -falei com vergonha.
-Eu tinha que ter filmado a sua cara! -ele riu. -Era só brincadeira, Gabi!
Ele segurou meu rosto na palma das mãos.
-Você fica tão fofa quando está rosinha desse jeito! -ele riu.
-Você é mau. -disse fazendo beicinho.
-Sou mesmo. -ele mordeu meu beicinho e quando abri a boca para reclamar ele me beijou.
-Aproveitador. -sussurrei contra seus lábios.
-Eu sei que você ama ser aproveitada por mim.
-Convencido.
-Marrenta.
-Trouxa.
-Meu anjo.
-Meu príncipe. -falei e nós dois rimos.
Nosso riso foi cortado por uma série de estouros seguidos de clarões no céu. Os fogos.
-Rápido, faz um desejo! -falei.
-Gabi eu não sei se...
-Larga de ser trouxa e deseja logo! -falei fechando meus olhos.
"Desejo que o fim seja apenas o começo e que no desfecho de tudo isso eu esteja com Matheus." -pensei.
-E aí, o que desejou? -ele perguntou.
-Não posso contar, ou não vai se realizar. -falei.
-Bom, eu desejei que... -não o deixei concluir e tapei sua boca com a mão.
-Você não pode contar! -falei. -À menos é claro que você tenha desejado que caísse um piano em minha cabeça. Nesse caso, por favor me conte.
Ele riu.
-Hey, posso abrir o meu presente agora? -pedi.
-Não. -falou.
-Porque?
-Na hora certa você vai saber. -disse. -Abra apenas em um momento em que você se sinta extremamente triste. Tipo assim, no fundo do poço mesmo!
-Nossa, você já está profetizando tristeza na minha vida! Valeu, em! -falei fazendo careta.
-É sério, Gabi. -ele falou.
-Ok. Eu prometo. -falei.
-De mindinho? -ele estendeu o dedinho para mim e eu entrelacei o meu no seu.
-De mindinho. -confirmei.
-Só vai valer a promessa se você selar. -ele sorriu maliciosamente.
-O que você...-ele me interrompeu me agarrando e beijando-me.
-Feliz ano novo. -falou sem fôlego e eu fiquei simplesmente sem palavras.
Eu não sabia o que iria acontecer dali pra fente, as coisas estavam confusas. Mas o que eu sabia era que um novo ano começava, um tempo para novas escolhas, para corrigir erros, e cometer erros. Nós continuaríamos nos vendo, com certeza. Até quando? Eu não fazia ideia. Tudo o que sabia era que seria masoquismo de nossa parte afastar-nos. Matheus era parte de mim e eu dele.

Cadê Suas Asas, Anjo?Where stories live. Discover now