Capítulo 06.

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A viajem foi tranquila, embora constrangedora em alguns momentos já que os olhos dele buscavam os meus incessantemente me fazendo arrepiar e corar. Durante a manhã, visitamos alguns lugares que serviam uma comida deliciosa, porém não muito saudável. O resto da visita foi tranquila. Nós fomos ver os crocodilos. Quer dizer, nós é um termo muito forte, considerando que eu nem me aproximei. Preferi ficar o mais longe possível daqueles bichos mortalmente horrendos.
Despois de jantar eu fui dormir, estava com sono.

" Eu estava no carro de meu pai. Estava sentada no banco de trás, meu pai dirigia e minha mãe estava ao seu lado. Os dois riam de uma piada qualquer.
Me aproximei deles para rir também, cutuquei minha mãe, mas ela parecia não perceber que eu estava ali. No início achei engraçado, mas depois, quando me virei para meu pai, ele também não me via.
Eu queria fazer parte daquilo, mas eles não me viam. De repente, por alguma razão, os dois começaram à discutir, eu pedia para que eles parassem, eu gritava mas minha voz não saía. Eu sabia como aquilo terminaria, mas não queria que acontecesse.
Papai parou o carro em uma encosta e obrigou mamãe à descer, ela saiu e eu fui atrás dela. Tentei pegar sua mão e fazê-la voltar. Mas não consegui.
Quando ouvi um cantar de pneus e olhei para trás, vi o carro do meu pai sumindo na curva da estrada de terra, deixando apenas a poeira solta por onde passou.
Olhei para onde minha mãe estava, queria lhe perguntar por que eles brigaram, mas ela tinha sumido. Tudo tinha sumido...
SOZINHA... SOZINHA.. -Essa maldita palavra ressoava em minha cabeça.
Eu estava em um lugar deserto, estava escuro. Estava frio. Abracei meus joelhos e comecei à chorar. Eu não queria ficar ali. Queria ir para casa. Com a minha família."

Gritei o mais alto que meus fracos pulmões humanos suportaram.
Foi aí que percebi que estava no meu quarto novamente. Quer dizer, no quarto do hotel. Mas até isso é melhor do que aquele lugar tenebroso. Graças que foi só um sonho!
Senti meu rosto oleoso contra o travesseiro e o sol que aquecia seriamente minha pele. Fui até o banheiro e lavei minha face, contemplando meus olhos tristes e foscos, meu rosto pálido e sem cor tive vontade de chorar.
Por que isso estava acontecendo comigo? Por que eu não podia ter uma vida perfeita como todas as adolescentes comuns? Apesar dos pesares eu ainda era humana, ainda tinha alma, ainda tinha sentimentos que um dia foram gravemente feridos e que lutavam incessantemente por sobrevivência. Meu coração ainda doía, muito. Seria tão mais fácil se tivesse alguém que pudesse me ajudar, alguém para dar-me a mão quando caísse. Mas o mundo nunca foi justo. Eu estava sozinha. Essa era a minha vida. Esse era o meu destino.
Desci para tomar café. Eu estava afetada pelo sonho ruim. Não que eu nunca tivesse pesadelos, por que acredite, eu tive muitos desde que minha mãe se foi, as coisas só pioraram. Dia por dia. Quando meu pai também foi embora, meu único descanso era quando estava com Matheus, ele era o único que me ajudava esquecer um pouco as coisas, pelo menos por um tempo. Mas quando estávamos longe, meu passado me perseguia cruelmente.
-Gabi, você não vai comer nada? -perguntou Daianna ao meu lado.
Fiquei em silêncio e me concentrei na minha xícara de café. Não queria que acidentalmente meus olhos se cruzassem com os de alguém.
Como eu sabia que ele estava ali se nem se quer o vi?
Simples. Eu senti a sua energia assim que entrei no restaurante.
Ele surtia esse efeito em mim. A brisa morna, o arrepio, a queda na temperatura ambiente, a eletricidade. Múltiplas sensações.
Será a minha impressão, ou quando eu e ele nos aproximávamos, coisas bizarras aconteciam?
-Hey!! Gabi! -Allina me cutucava.
-O que? -falei ao sair de meu transe momentâneo e percebendo tarde demais que ficara todo o tempo encarando o meu café.
-Credo Gabi! A cafeína não está sendo sua amiga hoje, né? Tipo, você está horrível! E fora o fato de que não fala coisa com coisa. -disse ela.
-O que exatamente eu falei? -perguntei temendo ter revelado meus débeis pensamentos.
-Ah, sei lá. Um treco lá sobre energia, reação e múltiplas sensações. -ela falou franzindo a testa -Sobre o quê estava pensando?
-Bobagens! Apenas bobagens! -falei contendo meu alívio por não revelar o pior.
-Eu dizia que estão muito boas as torradas e os bacons! -ela falou de boca cheia.
-É o que imagino. -falei encarando a enorme bacia de bacons na mesa.
Meu estomago se contraiu com a ideia de comer. Um pesadelo pode fazer milagres, hein.
Passei a manhã toda no quarto. Botei meus fones no máximo de volume, na esperança de que eles silenciassem os meus pensamentos. Não queria me lembrar de nada. Queria esquecer de tudo.
Quando chegou perto do meio dia eu desci para almoçar. Continuava sem ter muita fome. Mas precisava comer, ou as pessoas achariam estranho.
Não que eu me importasse com isso. Por que eu realmente não me importava. Mas é que não queria ninguém me espiculando.
Os alunos chegavam molhados e cheios de areia. Provavelmente estavam na praia.
Servi um pequeno bife grelhado e um pouquinho de arroz no prato e me sentei em uma cadeira na lateral da mesa.
Uma brisa morna encanou e soprou meus cabelos no rosto. Virei-me rápido e vi a imagem mais viciante do mundo.
Ele estava entrando, seu cabelo molhado caía em seu rosto. Ele maneou a cabeça para afasta-los e seus olhos encontraram os meus. Desviei rápido. Mas era impossível parar de olhar para Matheus.

Cadê Suas Asas, Anjo?Where stories live. Discover now